Morte é um tema que provoca repulsa, mas também desperta o interesse de muitos. Há quem não goste de ver filmes com cadáveres, vísceras e afins, mas há os que não só conseguem observar como trabalham diretamente com necropsia realizando, por exemplo, identificação e constatação de causa mortis, como os peritos do Núcleo de Medicina e Odontologia Legal (Numol) da Paraíba. O trabalho da equipe está num dos estandes da 9ª Feira e Exposição de Tecnologia (Expotec) 2023, realizada até hoje, no Centro de Convenções de João Pessoa, pela Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid) e Governo do Estado, com apoio do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br/NIC.br).
A gerente do Numol de João Pessoa, Cristiane Helena Barbosa Freire, explica que existem diversos tipos de necropsia. Um deles é o exame necroscópico no corpo hígido, ou seja, corpos de vítimas diárias de homicídios, suicídios, acidentes de trânsito, acidentes variados que dão entrada no Instituto. Para esses, não há equipamentos especiais. O necrotomista abre o cadáver e o perito analisa a situação in loco.
Para os exames antropológicos, isto é, os corpos que dão entrada esqueletizados ou em processo de esqueletização, o trabalho é completamente diferente e exige muito mais tempo. A análise de uma ossada dura em torno de, pelo menos, 90 dias, enquanto a de um corpo pode ser feita em uma hora, dependendo da causa do óbito.
O exame antropológico é minucioso. Nele, o perito vai higienizar todos os ossos e analisar cada detalhe, baseando-se em estimativas de idade, sexo, raça e altura. “Não conseguimos fechar a identidade de um exame antropológico só fazendo a análise dele. Essa identificação pode ser através da arcada dentária ou DNA”, diz. Nesse caso, a papiloscopia, que é a análise das impressões digitais, não é mais possível, apesar de ser um exame primário de identificação. Esse exame é utilizado nos corpos hígidos que dão entrada no Instituto.
No estande são apresentados os trabalhos de antropologia por ser possível expor materiais como crânio e fêmur, por exemplo, embora não seja a perícia mais prevalente. As mais realizadas são as antropológicas nos vivos, envolvendo pessoas que são agredidas e buscam reparação através de uma ação criminal, realizando o exame de corpo de delito; e os exames cadavéricos que também são a rotina do Numol.
Além desses, o Núcleo realiza exames de estimativa de idade, de determinação de embriaguez alcoólica, sexológicos e os antropológicos. A média mensal de necropsias varia em torno de 150 a 170 exames cadavéricos. Em relação aos antropológicos, considerando que há meses em que não aparece nenhum e em outros chegam até cinco, a média é de um ou dois por mês, no máximo.
Quem passa pelo estande pode observar vídeos de casos que foram trabalhados pela antropologia e têm chamado a atenção das pessoas. “Em todos os eventos que participamos, normalmente a Medicina Legal e o exame das drogas são os que mais chamam a atenção. As pessoas têm curiosidade, perguntam se são ossos humanos, ficam impressionadas, inclusive quando explicamos como é o nosso trabalho. É um momento valioso em que podemos mostrar tudo que realizamos e, muitas vezes, as pessoas não sabem”, enfatiza a gerente.
Ela ressalta a importância do trabalho do IPC. “Identificar a vítima leva conforto para a família que, muitas vezes, está sofrendo, há anos, à procura de um familiar. Mesmo que a gente consiga encontrar essa pessoa já falecida, ainda assim é um ciclo que se fecha encerrando aquela busca por um filho, um irmão, um pai”, observa.
Um dos casos concluídos recentemente é de um baiano que estava desaparecido há mais de quatro meses. A ossada foi encontrada em Cabedelo e levada para o IPC. A perita se debruçou sobre o caso e tomou como base fotos do homem que estavam na mídia. “Pegamos a imagem do sorriso dele, identificamos que tinha uma linha de sorriso diferente, uma borda incisal mais característica. Usamos a identificação através dessa linha. Numa parceria com a UFPB, usamos um scanner intraoral, levamos o crânio até lá, escaneamos e, numa comparação bidimensional, conseguimos estabelecer a identidade através do exame apenas da linha do sorriso. Foi um caso diferente, que ocorreu há pouco mais de um ano. A perita, inclusive, foi condecorada por esse trabalho”, relata.
O IPC funciona no bairro do Cristo, mas possui cinco núcleos no estado, João Pessoa, Campina Grande, Guarabira, Patos e Cajazeiras. Cada um funciona com quase todos os laboratórios, mas só João Pessoa tem o de DNA que recebe as demandas de toda a Paraíba.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 11 de agosto de 2023.