A Fundação Espaço Cultural da Paraíba (Funesc) abre neste sábado (15), no Theatro Santa Roza, a Mostra Una —Solos em Processos Criativos. A ação é gratuita e vai até o domingo (16).
O evento tem início às 18h do sábado, com apresentação do artista Rafael Sabino, que apresenta o espetáculo “Dançando na Escuridão”. Em seguida, Jéssica Lana traz para o público seu espetáculo “Não tenho nada para mostrar hoje”, com classificação indicativa de 10 anos. Érick Breno entra em cena logo após, com “Soando Bem aos Ouvidos”. Fecha a primeira noite de mostra a dançarina Joyce Barbosa, com seu solo “Nome-Do-Pai”.
No domingo, quem abre a noite é Jack Keysy, com “Maria Fumaça”. Depois, a artista Elis Xavier apresenta “Ainda é Cedo”, seguida de Jaguar, com o solo “Corpo Sonoro”. A última apresentação do domingo é de Valéria Vicente, que performará o espetáculo “Na esteira”.
Ao fim das apresentações, durante os dois dias de programação, o público poderá participar de uma roda de conversa com a presença dos artistas, que foram selecionados através de edital. A classificação indicativa é de 16 anos.
Sinopses:
“Dançando na Escuridão” (Rafael Sabino) é um Solo de dança contemporânea que investiga artisticamente a experiência subjetiva da depressão. A proposta vai além de representar a tristeza; busca corporificar a complexidade do transtorno: o peso físico, a letargia, a ansiedade, a dissociação, os ciclos de apatia e dor aguda, e os raros lampejos de espera ou alívio. O título, uma referência ao filme de Lars von Trier, sugere a paradoxal ideia de encontrar um movimento, uma pulsão de vida, mesmo dentro do vazio mais profundo. O objetivo é criar um retrato íntimo, cru e não romantizado da doença, transformando a angústia em matéria-prima coreográfica para gerar identificação, reflexão e reduzir o estigma em torno da saúde mental.
“Não tenho Nada pra Mostrar Hoje” (Jéssica Lana) é uma (não) performance que tenta persistir na inexistência, na desconexão. Nessa busca pela materialidade da experimentação, como sair da imobilidade para dançar? Não sei, não tenho, não; Quem sabe, afundar cada vez mais e mais, até afogar na inércia e vazio. Esta é uma performance que não existe. Se você quiser assistir a alguma coisa, não precisa nem ver, mas, se estiver sem nada para fazer, então talvez aqui seja um bom lugar. Afinal não temos nada mesmo. Não é exagero, não há nada por aqui.
“Soando Bem aos Ouvidos” (Érick Breno) explora a relação entre a migração forçada e a realidade do artista que vive da cena. Inspirado nos conflitos no Oriente Médio e na situação das crianças em Gaza, o artista Erik Breno busca questionar a humanidade e a indiferença diante dos gritos de socorro. A obra é resultado de um processo de pesquisa que inclui experimentos migratórios, oficinas de dança e colaborações artísticas, visando criar uma experiência sensorial e reflexiva sobre a liberdade e a sobrevivência em contextos de opressão.
“Maria Fumaça” (Joyce Barbosa) é um trabalho coreográfico que investiga a linha do tempo territorial do bairro Estação Velha, em Campina Grande, a partir da ascensão econômica da cidade impulsionada pela exportação do algodão e de sua posterior decadência. A obra atravessa a memória das pessoas que habitaram as redondezas do expresso ferroviário, evidenciando o processo de abandono e o aumento da criminalidade em um bairro que, em outras épocas, foi espaço de encontros e de relevante importância para o crescimento da cidade. A narrativa é construída a partir de duas versões de “O Trenzinho do Caipira”, conectando memória, história e experiência. Elementos técnicos das danças urbanas, como breaking, house dance e waacking, são incorporados, estabelecendo um diálogo entre tradição sonora e a expressão corporal contemporânea.
“Ainda é Cedo” (Elis Xavier) é um solo que nasce de uma necessidade de elaborar artisticamente vivências atravessadas pela saúde mental. Nesse caminho, a automutilação aparece como memória forte do corpo da atriz, que se interessa por investigar como expressar a densidade dessas experiências quanto à abertura para o respiro e o afeto. As principais referências que orientam esse percurso são as experiências de memória corporal em estados-limite, como a falta de ar, o torpor, a repetição e o esvaziamento, além de práticas de improvisação e composição coreográfica.
“Corpo Sonoro” (Jaguar) investiga o movimento a partir da escuta das frequências sonoras que atravessam o corpo. Parte da compreensão de que toda vibração — som, silêncio ou respiração — reverbera como um campo sensível e em constante transformação. A pesquisa aprofunda-se na forma como essas frequências despertam ativações energéticas, instaurando estados corporais e sensoriais que mobilizam o gesto e geram presenças. O vocabulário coreográfico emerge de microvibrações, pausas e pulsação, privilegiando a escuta e a relação íntima entre corpo, som e paisagem interior. Visualmente, o solo adota simplicidade radical: espaço limpo, luz baixa e elementos naturais (pedras, folhas, água) que se tornam extensões do corpo. A sonoridade — gravações do Sertão, ruídos cotidianos, vozes e frequências graves e agudas — atua como força dramatúrgica, criando uma dança que não se impõe, mas ressoa.
Em “Na Esteira” (Valéria Vicente) o espaço largo entre os seios da artista afirma a descendência indígena silenciada e ocultada pela família ao longo do século 20. Mas o que fazer com essa compreensão, diante de tantas contradições de viver no Brasil do século 21? A esteira de pipiri é anteparo e portal para acessar a terra e conversar com ela. Neste sentido, Valéria propõe-se investigar como ativar uma ancestralidade e ser movida por ela. Articula uma abordagem nomeada “Frequências Somáticas” para acessar esse saber que acredita-se estar no corpo e por ele ser movida.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 13 de novembro de 2025.