Assim como os seres humanos, os animais precisam ir à luta em busca de alimentos para sobreviver. Porém, nesse caminho, eles podem encontrar obstáculos e, é claro, seus predadores. Assim, a tarefa de procurar o próprio sustento se torna um desafio que, muitas vezes, pode terminar com a captura e morte desses animais por seus “caçadores”, que também lutam pelo mesmo propósito, sobreviver.
Os animais têm estratégias próprias para caçar seus alimentos. Por isso, cada espécie tem um nicho específico. “Podemos observar até pela morfologia do animal, qual sua estratégia de busca por alimento, e cada predador tem suas armadilhas para atrair a presa, para capturar, assim como também para escapar do predador”, explica a bióloga Rita Mascarenhas.
A presa, por sua vez, também tem artimanhas para tentar fugir. Ela afirma que a pressão de um sobre o outro implica em adaptação para sobreviver e assim diminuir as chances do predador em fazer a captura. Mimetizar uma flor é a estratégia de alguns insetos para capturar suas presas ou liberar odores que simulam odor de acasalamento de outra espécie.
De uma forma geral, o universo dos animais no sentido de presa e predador é um constante alerta de cuidado com seu território. A bióloga destaca que olfato e audição são mais aguçados, têm maior rapidez em processos de fuga, habilidade de subir em árvores e de nadar rapidamente, buscam abrigos que dificultam a entrada do predador, têm hábitos em horários do dia diferentes do predador. “Enfim, é uma eterna luta pela sobrevivência, para se alimentar ou evitar ser o alimento”, comenta.
Animais têm estratégias próprias para caçar seus alimentos. Por isso, cada espécie tem um nicho específico
A bióloga Marília Maia explica que os animais têm muitas estratégias tanto para caça como para defesa. Ela elenca que existem várias formas como a caça em grupo; outros têm o comportamento de esperar a presa passar, se escondendo; alguns fazem camuflagem, que é parecer com o ambiente em que ele vive, se escondendo a ponto da presa não o perceber.
Existem animais que fazem mimetismo, que é imitar outro animal para que ele possa fingir que é outro animal e capturar sua presa, fingir que é outro animal com coloração diferente, a chamada coloração de alerta nas falsas corais.
“Ao longo de milhões de anos, os animais foram percebendo que ter uma cor muito forte era interessante, já que as corais, por exemplo, que são peçonhentas, são evitadas, e isso é uma vantagem. Os animais que não são peçonhentos, mas que têm uma cor muito forte, foram sendo selecionados ao longo do tempo e hoje sobrevivem exatamente por ter cores fortes, que assustam os seus predadores”.
Domesticação não elimina totalmente os instintos dos bichos, diz bióloga
Os gatos são felinos domesticados, mas têm várias estratégias de caça. “São animais domésticos e, portanto, adaptados a receber alimento dos tutores, mas como felinos, têm como estratégia agilidade, rapidez, visão noturna apurada e são silenciosos. Os principais predadores seriam outros felinos ou canídeos maiores”, ressalta Rita Mascarenhas.
Ela explica que muitos animais perdem parte de seu instinto de caça quando domesticados ou criados em cativeiro. Em relação aos felinos, os filhotes aprendem com a mãe, desde pequenos, estratégias de caça e de fuga dos predadores. Porém, sem essa convivência de forma livre na natureza, muitos que nascem em cativeiro vivem a vida toda presos, pois não desenvolveram essa habilidade.
A bióloga Marília Maia entende que os gatos não estão totalmente domesticados. “Tem vários comportamentos de animais que não curtem ficar muito próximos a humanos, diferente de cachorros. Então, ainda exige um certo tempo para dizer que são animais domesticados”.
Comparando com os animais silvestres, ela diz que as estratégias de caça são muito parecidas. Alguns são mais crepusculares, saem no final da tarde; outros caçam logo quando amanhece. Existem animais que conseguem, como presas, ter estratégias para sobreviver. Esses vão sobrevivendo ao longo do tempo. Existe uma adaptação entre presa e predador, da forma como eles sobrevivem, como se defendem, estratégias de caça que vão sendo, durante a evolução, selecionadas. “Os que estão se dando melhor no ambiente, vão sendo selecionados e são animais que vão ficando”, completa.
As caçadas e táticas ajudam a equilibrar o meio ambiente
A bióloga Rita Mascarenhas lembra que as chances de capturar a presa, normalmente, são menores que as chances de fuga. Assim, predadores não se alimentam todos os dias e poupam energia até nova chance de capturar alimento. “Podemos ficar tristes ao ver, por exemplo, uma onça capturando um cervo, mas é parte da lei da natureza, das estratégias de equilíbrio no número populacional de ambos, e foram milhões de anos de ação da evolução, para alcançar esse equilíbrio”, analisa.
Portanto, conforme ela observa, não se deve intervir. “Olhando com olhos de admiradores da diversidade da vida, é fantástico observar tantos esforços para sobrevivência e as consequências disso na biodiversidade, no equilíbrio ecológico. Um exemplo de quanto podemos atrapalhar: No turismo tem atrapalhado a caça dos guepardos. São animais muito rápidos e, para essa agilidade, despendem muita energia e as chances de pegar a presa é pequena. Assim, turistas em carros e ruídos de motor têm alertado as presas dos guepardos que fogem, e guepardos têm morrido por desnutrição e doenças devido à falta de alimentação adequada”, constata.
“A adaptação da cadeia alimentar é normal, mas algumas pessoas ficam tristes em ver que uma serpente pegou um cervídeo – cervo ou veado – e enrolou nele, está matando. Algumas querem ajudar porque sentem pena, mas, isso faz parte do ciclo natural desses animais e é necessário que as pessoas entendam que é preciso respeitar”, reforça a bióloga Marília Maia.
Ela ressalta que não adianta ajudar porque quando se tira o animal, ele pode já estar morto e também está tirando o alimento de seu predador. “Não é questão de ter pena ou intervir nisso. É preciso entender que os animais precisam se alimentar. Assim como o cervídeo já se alimentou em algum momento, a serpente vai se alimentar de outras coisas também, e é isso que causa um equilíbrio na natureza. O animal que está caçando um cervídeo hoje pode caçar um lagarto amanhã”.
Marília Maia observa que existe um equilíbrio quando o ser humano não interfere. Por isso, é preciso respeitar e, inclusive, pensar que os humanos também caçam. O frango e a carne no churrasco já chegam abatidos por alguém, e esses animais foram abatidos para nossa alimentação. “É importante que seja um abate que evite o estresse animal, que seja o mais correto possível. Existem técnicas de abate do animal para ele não sofrer. Então, é necessário entender que faz parte do ciclo de todos os animais, inclusive nós, seres humanos, nos alimentarmos. Do contrário, não teríamos energia necessária para sobreviver”, frisa.
Espécies usam disfarces para confundir e capturar presas
Uma das estratégias mais interessantes dos animais, segundo a bióloga Rita Mascarenhas, é poder mimetizar outros animais, como as borboletas que têm manchas nas asas semelhantes a olhos de corujas. “Com as asas abertas, deixa de parecer uma borboleta e se assemelha a uma ave de maior porte, confundindo assim o predador”, relata.
Além disso, conforme a bióloga Marília Maia, algumas aranhas se alimentam de insetos que voam. Aranhas que estão na parte arbustiva fazem teias grandes em locais onde os insetos vão passar. Eles caem na teia e elas se alimentam.
Algumas aranhas que têm oito pernas juntam duas e ficam parecendo maiores, assustam mais, dando a entender que é uma defesa maior se alguém tentar predá-las. Outras aranhas fazem sua teia como se fossem redes de pescar, há as que cospem as teias. “Desde os pequenos até os grandes, os animais têm inúmeras estratégias. As leoas caçam em bando. Elas se juntam. Hienas também caçam em bando. Elas perceberam que é mais vantajoso pegar uma presa grande, pegar uma zebra, animais maiores caçando em grupo do que perder tempo, caçando um animal pequeno”.
Alguns animais nem caçam, a exemplo de urubus e carcarás. Eles são oportunistas, esperam que alguém cace, vai lá e tira um pedaço da carcaça ou tenta roubar essa presa, e essas também são estratégias de sobrevivência e captura. “São muitas formas e vai depender como esse animal se habituou, como ele foi selecionado de acordo com o alimento que ele come. Alguns usam obstáculos para se esconder”, comenta Marília Maia.
Ela ressalta que, entre as serpentes, as jararacas jovens têm um engodo caudal, a pontinha da cauda que fica balançando de forma a enganar um lagarto que acha que ali é uma minhoca ou inseto passando. Quando ele vai e tenta pegar esse finalzinho da cauda que está mexendo, é capturado pela serpente. Marrecos, patos, cisnes, gansos, que são anatídeos, jogam alimentos na água para o peixe vir comer e eles aproveitam para pegar esses peixinhos. A garça, de acordo com a bióloga, fica à espreita, em silêncio e, de repente, só pesca com seu bico comprido. “São estratégias de caça muito interessantes”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 29 de outubro de 2023.