Dani Fechine - Especial para A União
Uma longa vida carregada nas costas e na memória. Ensinamentos, conquistas, comemorações. Levam consigo a sabedoria e a vivência de alguém que viu a idade aumentar, o cabelo esbranquiçar e o desrespeito avançar. De acordo com o Disque 100, em 2014 a Paraíba registrou 788 denúncias de direitos violados, cerca de 65 por mês. Com o intuito de diminuir esses números e contribuir para uma vida melhor e mais estável na terceira idade, programas e ações na Paraíba têm proporcionado resultados, beneficiando a população idosa. É o caso dos condomínios Cidade Madura, uma ação na área da assistência social para a pessoa idosa.
O Cidade Madura é o primeiro condomínio horizontal projetado para pessoa idosa do Brasil. O local tem 40 unidades com acessibilidade, posto de saúde, redário, área de lazer e todas as atividades necessárias para a terceira idade. Foram entregues à população condomínios do Cidade Madura em João Pessoa, Campina Grande e outro está em fase de preenchimento de vagas em Cajazeiras.
No início deste ano, o governador Ricardo Coutinho autorizou a construção de mais um Cidade Madura em Guarabira. Outros dois também serão construídos nos municípios de Patos e Sousa. Para conseguir uma vaga em um dos condomínios, o idoso precisa procurar a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Sedh), na gerência de proteção social especial, e preencher a lista de espera.
Além do Cidade Madura, o Governo da Paraíba, por meio da Sedh, apresenta o Programa “Acolher – Não é só pela idade. É por mais dignidade” para melhorar a qualidade de vida dos idosos que vivem em Instituições de Longa Permanência para Idosos (Ilpis). No Estado existem 37 Ilpis, com mais de 1,5 mil pessoas institucionalizadas que foram beneficiadas na 1ª edição do Acolher. A segunda edição foi lançada pelo governador Ricardo Coutinho e o processo está em andamento. Como exemplo tem a piscina térmica coberta do Lar da Providência, um sonho antigo realizado com a ajuda do Projeto Acolher.
O Governo também oferece atividades para idosos, como palestras, oficinas, aulas de educação física, entre outras, por meio dos Centros Sociais Urbanos (CSUs). Existem 16 Centros que foram recuperados pela atual gestão. No local são oferecidos cursos profissionalizantes, escolinhas de futebol e atividades esportivas para crianças e adolescentes, grupos de idosos, entre outras.
O Conselho Estadual do Idoso também trabalha diretamente com essa pauta. Neste momento, todas as ações estão centradas na IV Conferência Estadual da Pessoa Idosa, que acontecerá nos dias 2 e 3 de março. Além desse foco, estão o acompanhamento e monitoramento das Instituições de Longa Permanência para Pessoa Idosa em todo o Estado junto ao Ministério Publico e outros Conselhos, bem como a capacitação aos Conselhos Municipais.
"Respeitar para ser respeitado"
Chegar à terceira idade traz uma lição necessária para todas essas pessoas: o importante é nunca esquecer. Nunca se esquecer de ser feliz. As palavras de alguém que já chegou na terceira idade são capazes, claramente, de despertar sorrisos e carinho, ainda que por pessoas desconhecidas. É, talvez, uma forma de gratidão por alguém que já viveu muito da vida e usa seu tempo agora para conversar. É o caso de Djair da Penha, de 67 anos. Frequenta o Ponto de Cem Réis religiosamente todas as tardes, local em que fez amigos e fez também o tempo andar mais devagar, no entanto, mais leve.
Sente-se feliz sendo idoso, porque quando seu Djair era mais novo aproveitou da vida tudo que conseguiu tirar dela e fez tudo que gostava de fazer. “Como um idoso também tenho tudo”, mas reclama da assistência médica e da falta de medicamentos. Orgulha-se do coração solidário e humilde. Talvez tenha sido isso que deu tanta saúde a Djair da Penha. Já ajudou muitas pessoas e o sonho é que essa ajuda se espalhe cada vez mais. “Queria ser rico”, desabafa.
Emocionado, seu Djair conta que resolveu cuidar da própria saúde. Lacrimejando os olhos, diz que parou de beber aos 49 anos. Era alcoólatra e só se renovou quando a porta do Alcoólatras Anônimos (AA) abriu para a sua vida. “Já tinha perdido minha família, já tinha perdido tudo. Hoje eu sei viver. Faz 18 anos que parei. Tenho 18 anos de vida. Tudo mudou. Agora sou respeitado”, volta a sorrir.
Cuidou de si, mas sente falta de quem cuide dele realmente. “Sinto falta da assistência médica para os idosos”. Djair conta que em agosto deu entrada para consultar-se com um urologista e em novembro o posto médico informou que não havia médico do SUS na Prefeitura de João Pessoa. “O Hospital Universitário me socorreu”, afirmou. Felizmente, nunca foi desacatado por ser idoso, a não ser nessas situações específicas. “No dia que eu for desrespeitado eu tomo providência, chamo a polícia e quem mais for necessário”, finalizou.
Ao lado de seu Djair, Damião Pereira faz companhia. Num jogo de adivinhação, Damião esconde a idade. Aparenta ser mais jovem e ter mais vida do que já conseguiu viver. Setenta e quatro anos na identidade e a juventude correndo pelas veias. Começou a trabalhar com sete anos. Os brinquedos eram a enxada, o foice e o machado. Com uma vida dura na infância e juventude, encontrou na velhice o oásis que precisava. “Hoje as coisas mudaram, tudo está melhor”, agradeceu, retribuindo a vida com uma olhada rápida para o céu. Para Damião, não há motivo para desrespeito. Os direitos devem ser respeitados, afinal, “somos todos irmãos”. “Gosto de respeitar para ser respeitado”, completou.
Já dona Josefa Ferreira tem 62 anos, mas oito de “tricotagem”. Sentada num banco de praça, vê o tempo passar com as mãos entrelaçadas em agulha e linha. Costura a vida com as próprias mãos. Viúva, perdeu o marido quando ele tinha 40 anos, mas não deixou de viver. O amou com todo o coração e até acha difícil encontrar alguém como ele. “Eu não procuro homem nenhum, mas se Jesus mandar, né... Será bem aceito. Amor é felicidade. A coisa melhor do mundo é amor, felicidade na vida”, emociona quem escuta. Quando pergunto a dona Zefinha – como prefere ser chamada – sobre o que já aprendeu com a vida, a senhora sorri e responde: aprendi a tricotar.
Direito de ser cidadão
Para contribuir com a preservação da vida e dos direitos das pessoas acima de 60 anos, foi criado, em 2003, o Estatuto do Idoso, ampliando os direitos desses cidadãos. Na saúde, transporte, lazer, habitação e em outras instâncias sociais, o idoso tem o direito e o dever de se inserir ativamente nesse meio.
Na saúde, por exemplo, o idoso deve ter atendimento preferencial no Sistema Único de Saúde (SUS), além de ter acesso a distribuição gratuita de remédio de uso cotidiano e ter sempre direito a acompanhamento quando internado. Algo que acontece constantemente e que os idosos precisam estar atentos para não serem lesados é que os planos de saúde não podem reajustar as mensalidades de acordo com o critério de idade.
No transporte coletivo também há exclusividade de direitos às pessoas idosas. Com o tempo que passa com pressa e sem perceber, os idosos vão perdendo as forças. Esse é um dos motivos que torna obrigatória a reserva de 10% dos assentos dos transportes públicos para os idosos. Acima dos 65 anos, eles também têm direito a gratuidade do transporte coletivo público e, no transporte interestadual, são reservadas duas vagas gratuitas em cada veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos.
E não é porque a velhice chegou que a vida pediu permissão para parar. Todo idoso – cidadão acima dos 60 anos – tem direito a 50% de desconto em atividades de cultura, esporte e lazer. Além disso, é obrigatória a reserva de 3% das unidades residenciais para os idosos nos programas habitacionais públicos ou subsidiados por recursos públicos.
Importante denunciar
Sobre qualquer violação de direitos dos idosos, o mais indicado é a denúncia. Embora as penas sejam consideradas de Pequeno Potencial Ofensivo, prestar a queixa é fundamental. De acordo com Sônia Maria de Paula, promotora de Justiça do Cidadão, as denúncias podem ser feitas no Conselho dos Direitos Humanos, no Disque 100, no Disque 123 – atendimento local –, na Ouvidoria do Ministério Público, na sede do Ministério Público, através dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e dos Conselhos Estadual e Municipal do Idoso.
Qualquer pessoa pode denunciar, inclusive, a acusação pode ser anônima. O primeiro passo da Promotoria do Cidadão é apurar a acusação e depois tomar as providências legais. Tipificado como crime, a resolução do problema fica a cargo da delegacia especializada. As penas são de no máximo dois anos. “O que mais me preocupa é que os criminosos saem praticamente impunes. Sempre denunciem, precisamos ajudar essas pessoas”, lamenta Sônia Maria.
O Conselho Estadual do Idoso também recebe denúncias da população. “Recebemos algumas denúncias locais e enviamos para Delegacia da Pessoa Idosa ou para o Conselho Municipal da Pessoa Idosa de João Pessoa”, informou Margarida Maria Silva, presidente do Conselho Estadual do Idoso.