Uma área de cerca de 840 m2 de concreto deverá ser implantada, nos próximos meses, na costa litorânea da Paraíba, a uma profundidade de 10 m a 50 m da superfície do mar. E não se trata de um material qualquer — é resistente ao sulfato, para manter a integridade na água do mar; tem índice de acidez mais próximo ao neutro, além de oferecer uma superfície rugosa para assentamento dos organismos marítimos. Esses blocos de concreto são os recifes artificiais (RA), estruturas que visam contribuir com o reforço nos recifes costeiros naturais, fomentar a biodiversidade local e ofertar mais opções para práticas de pesca e mergulho.
O projeto de implantação dos recifes artificiais na costa paraibana é capitaneado pelo Programa Estratégico de Estruturas Artificiais Marinhas da Paraíba (Preamar), desenvolvido por meio de acordo entre o Governo do Estado, o Instituto Federal da Paraíba (IFPB) e o Ministério Público Federal na Paraíba (MPF-PB), com parceria de pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e de mais seis institutos públicos de pesquisa. A iniciativa está, neste momento, em processo de licenciamento pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), após obter o aval da Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema) e da Marinha do Brasil.
A expectativa é que haja a instalação de 14 mil blocos de concreto, de dimensões de 50 cm x 50 cm x 50 cm, distribuídos em 14 pontos da plataforma continental dos municípios de João Pessoa, Cabedelo, Conde e Lucena — uma área equivalente a 4,5 vezes o tamanho do estádio Maracanã, no Rio de Janeiro. “Os blocos do Preamar foram especialmente desenvolvidos para atender aos objetivos do programa, que são recuperar a biodiversidade, fomentar o turismo náutico e subaquático e incrementar a pesca artesanal e esportiva”, explica o coordenador do Preamar e professor do curso de Oceanografia e Meteorologia do IFPB, Claudio Dybas.
“São blocos muito resistentes. Eles têm uma rugosidade que favorece o assentamento larval e aberturas que vão favorecer o refúgio dos organismos. A gente tem um potencial de recuperar a biodiversidade, aliviar a pressão dos ambientes naturais em relação ao turismo, aumentar a produção pesqueira, criar novos pontos para pesca esportiva e criar pontos de mergulho contemplativo. É uma ação estratégica, que pensa no desenvolvimento socioeconômico de forma sustentável”, completa.
Além de aplicar blocos de concreto, especialmente desenhados de modo a criar e fortalecer o ecossistema desses ambientes marinhos, o plano do projeto inclui a criação de uma área temática de mergulho em um parque submerso de esculturas. As pessoas poderão visitar esse local e fazer um mergulho contemplativo, com estímulo às atividades de turismo náutico e subaquático, aliviando a pressão nos ambientes naturais.
Corais protegem praias e outros seres vivos
A inserção de recifes artificiais na plataforma oceânica reforça a importância que os próprios recifes naturais desempenham para o ambiente das costas, para a biodiversidade marinha e também para o desenvolvimento econômico. No caso da Paraíba, regiões como Areia Vermelha, Picãozinho e Caribessa são áreas recifais com grande potencial turístico.
Os recifes coralíneos nos litorais paraibano e nordestino, como explica Dybas, são de arenito, ou seja, produtos da sedimentação e solidificação de areia, e representam o que, há cerca de oito mil anos, foi a linha da costa. Os recifes também podem ser rochosos, isto é, projeções da plataforma continental, ou biogênicos, quando formados por esqueletos de organismos calcários. Essas “muretas” do mar servem de colônia para organismos que se grudam a elas, como corais e moluscos, e para aqueles que se movem sobre sua superfície, como estrelas, ouriços e pepinos-do-mar. Daí, a importância dos recifes na biodiversidade.
Outra função de grande relevância, exercida por essas estruturas, reside na relação com o ambiente da costa. Como os recifes estão próximos à superfície do mar e às ondas que chegam ao continente, eles são os locais nos quais a energia dessas ondas é dissipada. Com isso, evitam mais erosões nas praias, costas e falésias, como expõe o pesquisador do IFPB. “A onda tem um comprimento e uma amplitude. Quando esse comprimento e amplitude interagem com o recife, a onda perde energia e chega mais fraca à areia da praia. A existência desses bancos de recifes, que podem ter corais e um monte de organismos, é importante para manutenção da estabilidade da linha de costa, porque, quando a onda chega com menos energia, ela movimenta menos sedimentos. As praias que têm recifes à sua frente tendem a ser mais estáveis”, esclarece Dybas.
Mas, como todo o planeta, os recifes coralíneos podem sofrer as consequências das mudanças climáticas, afetando o ecossistema que os cerca. O aumento da temperatura do mar pode impactar a simbiose entre esses espaços e as algas que os habitam. Em contrapartida, a presença delas contribui para a vitalidade e a manutenção dos corais, pois elas estão na base da cadeia alimentar e mantêm o espaço vivo e saudável. Caso essas algas se desassociem dos corais pelo calor das águas, o recife corre o risco de passar pelo processo de branqueamento, uma vez que perde a cobertura desses seres e fica branco.
“O branqueamento dos recifes pode causar a mortalidade das colônias e diminuir o processo de fabricação de esqueletos calcários. O metabolismo dos corais também diminui. Essas barreiras podem ficar mais fracas, os próprios esqueletos podem se quebrar e não crescer. Isso teria impacto sobre a erosão costeira, perdendo-se gradativamente a função de dissipar a energia das ondas”, explica Claudio. Nesse cenário, o aumento do nível do mar amplia a possibilidade de que as ondas interajam menos com as barreiras de recife e cheguem com mais força à linha da costa, agravando processos erosivos.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 29 de junho de 2025.