A produção do audiovisual de Campina Grande, mesmo de forma tímida, sempre teve um trabalho exitoso, que deixou, ao longo do tempo, impressões e um legado iniciado ainda nos anos de 1920, com o cineasta Walfredo Rodriguez, e que teve continuidade décadas depois, destacando-se a atividade do fotógrafo e também cineasta Machado Bittencourt.
Os dois foram os responsáveis pelas primeiras produções na cidade, reverberando para que outras personalidades enveredassem por essa trilha e fizessem de Campina um local em que se podia pensar e fazer audiovisual.
Essa ideia ficou ainda mais firme com a criação dos cursos de Comunicação Social, pela então Fundação da Universidade Regional do Nordeste (Furne), hoje Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), em 1973, e o de Arte e Mídia, pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), em 1998.
Mas foi a partir de 2005 que esse meio de comunicar teve um divisor de águas. De uma ideia de estudantes da UEPB, surgiu o Festival Audiovisual Internacional de Campina Grande (Comunicurtas), propulsor da produção na cidade, dando à Rainha da Borborema projeção para o país. Os recursos eram limitados, apenas uma ideia na cabeça, câmera na mão e a vontade de colocar na tela um roteiro do cotidiano, recortes da história, personagens que fizeram e fazem parte da cidade.
As primeiras produções da Rainha da Borborema
As primeiras sementes, para toda a eclosão dessa efervescência dos dias atuais, foram lançadas ainda na década de 20, quando pela primeira vez uma câmera cinematográfica circulou pelas ruas da antiga Vila Nova da Rainha.
Isso ocorreu pelas mãos do fotógrafo e cineasta Walfredo, que esteve na cidade registrando cenas para o clássico documentário “Sob o Céu Nordestino”. Essas imagens podem ser vistas na plataforma do YouTube.
Depois desse momento pioneiro, a produção audiovisual em Campina Grande teve continuidade pelas mãos de Bittencourt, um piauiense que veio morar na cidade, no começo da década de 1960, e realizou seu primeiro filme, na bitola de 16m/m, “A feira”, um “docudrama” feito em parceria com outro fotógrafo. Na cidade, ele criou ainda a Cinética Filmes, uma produtora de filmes publicitários e institucionais, dando continuidade à produção audiovisual tendo como suporte institucional a então Furne.
“Foi na universidade que ele realizou seu primeiro longa-metragem (16mm), o Maria Coragem, com a participação dos alunos. Depois vieram O caso Carlota, longa-metragem em cores, e Entre a estrela e as catacumbas, media-metragem também em cores que ficou inacabado”, destacou, o diretor do Centro de Ciências Sociais (CCSA) e professor da UEPB Rômulo Azevedo. “Uma curiosidade: o filme foi rodado com uma lente cinemascope feita em Campina Grande”, pontuou.
O professor recordou ainda que, em relação a Machado, o que contribuiu para fortalecer a atividade cinematográfica foi a existência da TV Borborema, emissora pioneira no estado que começou suas atividades em 1963, exibindo comerciais produzidos pela Cinética.
Aliás, Rômulo Azevedo e seu irmão, o também professor aposentado da UFCG Romero Azevedo, fazem parte da história do audiovisual da cidade, com contribuições que extrapolam as salas. “Eu e meu irmão atuamos no cinema desde 1967, seja através da participação em cineclubes formadores de plateias, como também através da crítica cinematográfica em jornais locais e na realização de filmes de curta-metragem. Em 2007, meu curta ‘Malassombrando’, baseado em um conto de Bráulio Tavares, ganhou os prêmios de melhor filme, melhor direção e melhor ator, no festival Comunicurtas”, lembrou.
Comunicurtas é incentivo à criatividade
A criação do Comunicurtas passou a ser uma vigorosa vitrine para os admiradores da sétima arte e motivo para o engajamento de novos pensadores e produtores. Ele surgiu com o propósito de difundir e exibir filmes e vídeos de curta e longa-metragem locais, regionais, nacionais e internacionais, das áreas de cinema, jornalismo e publicidade.
Conforme o coordenador geral do Comunicurtas e coordenador de Comunicação da UEPB, Hipólito Lucena, desde o início, o festival buscou reinventar o cenário audiovisual da região, proporcionando um espaço para a exibição, discussão e aprendizado no campo audiovisual.
“No início, o festival escolheu o formato de curta-metragem como seu principal foco estético e formativo. Essa escolha permitiu que os participantes explorassem a linguagem cinematográfica em um formato mais compacto e acessível, incentivando a criatividade e o desenvolvimento de habilidades técnicas”, disse.
Além de sua ênfase na exibição de curtas-metragens, o festival evoluiu e atualmente é composto por 11 mostras, abrangendo diversas categorias e temas do audiovisual. “Uma característica significativa é o seu compromisso com a formação de novos talentos. Ele atua como um laboratório prático para os alunos da UEPB, da UFCG, em especial do curso de Arte e Mídia, e da comunidade em geral, oferecendo a oportunidade de trabalhar na produção e organização do evento”.
O festival buscou reinventar o cenário audiovisual da região, proporcionando um espaço para a exibição, discussão e aprendizado
Entre os trabalhos premiados ao longo do Comunicurtas estão “Mamapara”, de Alberto Flores, do Peru; “Jesus Kid”, de Aly Muritiba; “Poder Falar, uma Autoficção”, “O Pastor e Guerrilheiro”, de José Eduardo Belmonte; “Sideral”, de Carlos Segundo; “Dama da Noite”, de Jéssica Rodrigues.
Um dos destaques da nova geração de produtores audiovisuais é o longa-metragem “Tudo que Deus criou” dirigido pelo cineasta André da Costa, rodado em Campina Grande com a participação de atores nacionais como Leticia Spiller, Guta Strazzer e Maria Gladys entre outros.
O Festival Comunicurtas, teve importante e destacado papel na construção do dossiê que basilou a candidatura de Campina Grande para a obtenção do título e do selo de Cidade Criativa em Artes Midiáticas da Unesco, seja por suas ações criativas, que vão das produções cinematográficas às projeções mapeadas em prédios e espaços públicos da cidade, além de ter ancorado a realização do I TRIO - Festival Internacional de Artes Midiáticas, realizado em 2021, de forma híbrida.
Cinema Instantâneo
Com a efervescência promovida pela produção em torno do Comunicurtas, a Rainha da Borborema testemunhou o surgimento do movimento “Cinema Instantâneo”, forjado nas rodas de negócio e conversas durante a edição de 2017 do festival, entre os cineastas e produtores Antônio Fargoni, Tiago Neves, Hipólito Lucena, Leandro Alves entre outros.
De lá eles saíram com a ideia de promover produções colaborativas. Um ano depois eles colocaram em prática vários planos guardados na cabeça por anos. Hoje o Movimento já conta com um portfólio de mais de 30 produções, entre curtas e longas metragens, produzidos em diversas cidades de vários estados do Brasil.
Cidade tem agenda cheia de festas e eventos
A história de Campina Grande está ligada à sua forte tendência de sediar eventos que a projetam à cena nacional. Aos quatro cantos do país, todos enxergam na cidade a realizadora do Maior São João do Mundo, que durante 30 dias promove a festa atraindo milhares de turistas.
Essa ideia surgiu no início dos anos 80, quando os festejos juninos ocorriam em um palhoção simples. A festa foi um sucesso e passou a atrair mais e mais pessoas. Foi, então, erguido o Parque do Povo. Agora, em 2023, o evento completou 40 anos de história. Nessa última edição, cerca de 2,5 milhões de pessoas passaram pela cidade.
Mas em Campina Grande não se dança só forró. Nela também são realizados outros eventos importantes e que contribuem para o fortalecimento de sua economia, a exemplo do Carnaval da Paz, com a promoção de vários encontros religiosos e filosóficos durante a festa do rei momo, como o Nova Consciência, Consciência Cristã, Encontro da Família Católica (Crescer), Movimento do Espírito Lilás da Paraíba (Miep), Verbo da Vida, E-Além, A Palavra Revelada e outros.
Além desses, a cidade realiza o Festival de Inverno, com 48 edições já promovidas, Festival Internacional de Música (Fimus), e Festival Internacional de Jazz (Fimus Jazz).
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 11 de outubro de 2023.