Castanholas, mangueiras, ipês e bananeiras são exemplos de espécies vegetais comuns nas ruas e praças dos municípios paraibanos. Elas já estão integradas à paisagem local e dão mais cor e sombreamento ao ambiente. O que muita gente não sabe é que estas e outras plantas não são nativas do estado, vieram de diferentes países ou regiões do Brasil. Enquanto uns exemplares exóticos são bem recebidos pela fauna e flora local, outras podem ameaçar espécies nativas, atrapalhando, inclusive, a reprodução.
O mestre em Botânica e doutorando em Ciências Florestais, Ramôn da Silva Santos, explicou que essas plantas exóticas ou invasoras - como são chamadas as não nativas, são transferidas de seus habitats naturais para lugares longínquos pela ação humana e também pela ação da natureza. Essa mudança geográfica pode ser motivada por fatores como transações comerciais, exploração científica, ornamentação ou de maneira acidental.
Animais, como aves, que costumam se alimentar de espécies frutíferas, podem espalhar sementes em lugares afastados de onde as encontraram. Nesse processo, ainda deve-se levar em consideração a ação do vento, que carrega sementes para áreas distantes do lugar de origem. “Uma vez introduzidas em novos ambientes, essas plantas podem exibir uma variedade de comportamentos de colonização, como competir por recursos nutricionais com plantas nativas”, afirmou Ramôn.
O engenheiro agrônomo e diretor de Controle Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente de João Pessoa (Semam), Anderson Fontes, afirmou que as plantas exóticas comuns no estado são as chamadas árvores viárias, que são aquelas plantadas nos canteiros centrais, praças, jardins de escolas e passeios públicos. Ele contou que umas das plantas exóticas frequentemente vistas nos municípios paraibanos é o neen indiano, natural da Índia.
“Ele tem crescimento rápido, mas as raízes costumam danificar imóveis e calçadas que estejam por perto. Também não é muito apropriado para a fauna local, considerado abortivo para as abelhas. Apesar de não ser muito boa nesse sentido, é a árvore mais plantada nos municípios paraibanos”, explicou Anderson, que também é diretor da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, Regional Nordeste (SBAU-NE).
Há espécies exóticas que podem apresentar comportamento invasor, como a leucena e a castanhola, retardando o desenvolvimento da flora nativa, interferindo negativamente até no desenvolvimento das florestas.
Esse não é o caso das mangueiras, árvores não nativas encontradas, facilmente, em cidades paraibanas, como João Pessoa. Na capital, são comumente vistas nas vias públicas, como as avenidas João Machado e a Maximiano Figueiredo. Segundo Anderson, elas são nativas do Sul e Sudeste asiático, mas se adaptaram bem ao clima brasileiro. O único cuidado que se deve ter é com relação aos frutos, pois na época de colheita podem cair repentinamente, podendo trazer danos ao cidadão ou aos bens patrimoniais.
Anderson Fontes frisou que o lado positivo de se plantar espécies nativas nas cidades, é o fato de se estar mais familiarizado com a sua fisiologia, morfologia, e entender com maior clareza os possíveis aparecimentos de doenças e os respectivos tratamentos. Além disso, é uma forma de preservar o bioma local.
Fatores econômicos também influenciaram a chegada de plantas exóticas no Brasil, disseminando mudas em estados como a Paraíba. Com a carência de alimentos no período de seca do Sertão, algumas plantas foram introduzidas no estado para matar a fome das criações. Um exemplo é a algaroba. A espécie chegou à Paraíba na década de 1960 e foi plantada, inicialmente, na zona rural, assumindo a função de suplemento alimentar para os animais. Depois, foi levada para espaços públicos, inclusive urbanos. Anderson citou que um dos problemas que ela apresenta é a facilidade de tombamento.
Produtos que se tornaram símbolo da economia nacional, como a cana-de-açúcar, também vieram de lugares distantes. O botânico Ramôn Santos afirmou que a planta é originária da Ásia, e foi inserida no país pelos colonizadores portugueses para a produção de açúcar. Já o café, originário da África, chegou em terras brasileiras no século 18, com a finalidade de diversificar a produção agrícola e atender à crescente demanda mundial.
“Naturalistas, botânicos e exploradores também tiveram um papel importante na introdução de plantas exóticas. Plantas eram coletadas em expedições científicas e trazidas para estudos e coleções botânicas. Espécies não nativas foram trazidas com o intuito de estudar sua adaptabilidade a diferentes climas e solos”, ressaltou Ramôn.
Outra razão para a chegada dessas espécies invasoras foi o “modismo”, ou seja, o desejo de seguir a tendência paisagística de outros países ou regiões do Brasil. O paraibano visitava paisagistas de fora do estado e desejava seguir a tendência paisagística adotada por ele. Então, importava uma muda, dando sequência ao plantio das árvores exóticas nas cidades paraibanas.
Espécies têm gerado contribuições na economia, paisagismo e culinária
Apesar das ressalvas sobre a adoção de plantas exóticas, vale lembrar que elas também contribuíram para a economia e diversidade paisagística brasileira. O mestre em Botânica, Ramôn da Silva Santos, frisou que muitas delas são usadas na construção civil, têm fins medicinais, são usadas na área de cosméticos e até em projetos paisagísticos.
O eucalipto, nativo da Oceania, é um produto cobiçado na construção civil, devido à qualidade da madeira. Segundo Ramôn, a planta ainda é matéria-prima para produção de papel, óleo essencial e outros produtos aromáticos. “No entanto, o cultivo extensivo de eucaliptos, em algumas regiões, pode gerar preocupações ambientais, como a alteração do ecossistema local e a competição com espécies nativas. Portanto, é fundamental equilibrar os benefícios econômicos com a preservação ambiental”, destacou o especialista.
Já o coentro (Coriandrumsativum), tão comum nas feiras livres, supermercados e agricultura paraibana, é nativa do Mediterrâneo. De cheiro intenso, é considerado um importante condimento e está presente em vários pratos da culinária brasileira, contribuindo para a cultura e economia de diversas cidades.
Flora diversa foi impulsionada pela presença da família real
A história das importações de espécies vegetais exóticas no Brasil remonta à época das Grandes Navegações, quando exploradores, colonizadores e comerciantes transportavam ervas e mudas de plantas em suas viagens pelo mundo.
O botânico Ramôn Santos contou que as espécies eram frequentemente coletadas em diferentes regiões e trazidas como amostras botânicas ou para uso em cultivos agrícolas. Na vinda dos portugueses ao Brasil, diversas plantas originárias de Portugal e de outras partes da Europa foram introduzidas no país. Muitas delas foram trazidas como presentes, brindes diplomáticos ou para embelezar jardins e compor paisagens.
“Dom João 6o trouxe diversas plantas para o Brasil, quando a corte portuguesa se transferiu para o Rio de Janeiro, em 1808. Essas plantas eram destinadas ao enriquecimento de jardins reais e embelezamento de áreas urbanas”, mencionou Ramôn.
Para o bem ou para o mal, essas plantas não nativas já fazem parte da paisagem de vários estados brasileiros. “Em resumo, a chegada de plantas exóticas em uma região ocorreu ao longo de séculos, impulsionada por uma variedade de motivos, incluindo, explorações marítimas, comércio, interesses científicos, embelezamento urbano e necessidades econômicas. Essas introduções contribuíram para a diversificação da flora brasileira, mas também tiveram impactos positivos e negativos sobre os ecossistemas locais e a biodiversidade”, completou Santos.
Legado
A presença da família real no Brasil influenciou na diversificação da flora brasileira. O imperador Dom Pedro II contribuiu decisivamente para a criação de um dos mais importantes celeiros da flora do país - o Jardim Botânico, no Rio de Janeiro. “O Jardim Botânico é um dos instrumentos de referência mais importantes do mundo para o estudo da Botânica”, enfocou o engenheiro agrônomo, Anderson Fontes. Ele afirmou que lá estão tanto espécies brasileiras, quanto exóticas, a exemplo da palmeira real e da imperial, sendo esta última originária da América Central e comumente encontrada no Parque Zoobotânico Arruda Câmara (Bica) e o Parque Sólon de Lucena (Lagoa).
Ipê Amarelo
Uma das plantas não nativas que já virou atrativo contemplativo no estado pela beleza da cor de suas flores foi o ipê, sobretudo, o amarelo (Handroanthuschrysotrichus). Segundo o mestre em Botânica, Ramôn da Silva Santos, o ipê-amarelo é originário dos países da América do Sul, e no Brasil se concentra na região Sul e Sudeste. No entanto, a árvore já está presente em inúmeros estados brasileiros.
“Uma planta é considerada exótica quando ela sai de outros locais, não necessariamente de outro país, mas também de um bioma para outro. Na Paraíba, encontramos espécies da região amazônica, do Sul e Sudeste, que não germinariam naturalmente no nosso estado, mas porque foram trazidas para cá”, explicou.
Outro exemplo que ele citou foram as araucárias, comuns apenas nos pampas do Sul do Brasil, mas que são vistas em terras paraibanas, na região da Borborema, em áreas de grande altitude.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 02 de setembro de 2023.