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carol Bevilacqua

Atleta é a nova revelação do jiu-jítsu

publicado: 12/09/2024 09h38, última modificação: 12/09/2024 09h38
Desafio da campeã é ter sucesso na disputa do Campeonato Sul-Americano que vai acontecer no fim do mês, no Rio de Janeiro
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Carol exibe a coleção de medalhas conquistadas que a levam a ser destaque na modalidade | Foto: Roberto Guedes

por Camilla Barbosa*

Paixão e desafio”, são essas as palavras que Carol Bevilacqua, atleta carioca radicada na Paraíba, usa para definir sua visão pessoal a respeito do jiu-jítsu, modalidade esportiva à qual se dedica diuturnamente. Nos últimos meses, essa preparação foi intensificada com vistas à participação no Campeonato Sul-Americano, evento esportivo programado para acontecer nos dias 28 e 29 deste mês, em Deodoro, no Rio de Janeiro.

“Se desafiar [no jiu-jítsu] porque não é fácil, é até malvisto, às vezes falam: ‘Nossa, como você tem coragem de lutar com homem?’, mas é defesa pessoal, acho que é muito importante isso. E se desafiar sempre, conquistar mais coisas, pensar ‘eu posso fazer aquilo, eu consigo superar isso’ e seguir em frente”, explicou Carol.

Eu sempre gosto de um desafio novo, de experimentar as coisas, então fui, comecei, fiz algumas aulas e acabei gostando   --   Carol Bevilacqua

A introdução à vida esportiva aconteceu ainda na infância, segundo a mãe, Thereza Bevilacqua, por indicação médica, visando atenuar os efeitos do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) sentidos pela filha. De lá para cá, ela conheceu e praticou natação, capoeira e handebol, até chegar, finalmente, ao jiu-jítsu, em 2021, no auge da pandemia de Covid-19 e por influência do irmão, que já conhecia a arte marcial.

“Sempre tive esse espírito competitivo, minha avó fala que eu herdei essa parte de atleta da família. Eu sempre gosto de um desafio novo, de experimentar as coisas, então fui, comecei, fiz algumas aulas e acabei gostando. Sempre que eu entrei num esporte, em todos que eu fiz na minha vida, eu entrava para competição. Gosto desse desafio, dessa adrenalina, e não foi diferente com o jiu-jítsu”, comentou a atleta.

A sociedade ainda é, muitas vezes, guiada pelo pensamento sexista e ultrapassado o qual defende que artes marciais, como o jiu-jítsu, são atividades mais apropriadas para homens, o que resulta em desprezo pela participação de mulheres nos tatames. Para Carol, chegar lá e trazer medalhas é também contribuir, na prática, para a representatividade feminina no esporte. 

“Quem não me conhece não dá nada; eu já, inclusive, estava fazendo preparação física, e aí olharam para mim e falaram assim: ‘Ah, cê tá treinando para ginástica?’, e eu falei que não, que estava treinando para o jiu-jítsu”, relembra ela. “O pessoal sempre fica muito chocado, porque não é comum ver uma menina do meu tamanho, do meu porte físico, praticar uma arte marcial que é majoritariamente masculina. Então, sempre tem um grande impacto, e eu acho que isso é muito importante, além de trazer essa autoconfiança, mas também a questão de poder fazer algo que os homens fazem, eu também tenho essa capacidade”, pontuou.

Recém-chegada à categoria adulta, ela relembra também os desafios que enfrentou na adaptação. “Quando eu era juvenil, era de uma categoria acima da que estou hoje, eu era pluma. Então, era bem tranquila, as meninas eram do meu tamanho. Mas, quando eu mudei para a adulta, a categoria aumenta 1 kg, e aí elas aumentaram de altura e ficou muito difícil para mim, isso estava me desmotivando, porque eu não estava vendo resultado nos campeonatos; quando eu decidi mudar de categoria, indo para um peso mais leve, a minha categoria de adulto deslanchou e começou a fluir e eu comecei a ganhar os campeonatos”.

Além da dedicação ao jiu-jítsu, Carol cursa Design Gráfico no IFPB de Cabedelo e aponta as melhorias que o esporte traz para sua vida para além dos tatames. “O esporte sempre trouxe essa disciplina para mim, minha mãe sempre me ensinou que, se eu tenho disciplina no esporte, eu vou ter no resto da vida. E o esporte me ajuda a ter foco, principalmente, porque tenho TDAH, o esporte traz essa parte da organização, da disciplina, e aí eu levo isso para outras áreas da vida”, explicou.

A esportista de 18 anos conhece bem o estado que receberá a próxima competição onde marcará presença, já que foi onde nasceu e viveu até os 6 anos de idade. De lá para cá, a Paraíba — mais especificamente as cidades de Campina Grande, no resto da infância, e João Pessoa, atualmente — tem sido seu lar, como ela bem conceitua.

“Eu saí do Rio muito nova, com sete anos de idade, então, eu sempre brinco que eu sou mais paraibana do que carioca, mas eu acho essa mistura muito boa. A Paraíba me acolheu muito, eu tenho uma forte academia aqui, uma família, então, eu acho que a Paraíba, João Pessoa é um lar para mim. É a minha casa”, expressou a lutadora.

Quando perguntada sobre os planos para o futuro, a atleta se mostra como a própria personificação da expressão popular “pé no chão”. “Eu sempre vou com passos muito curtos, meu objetivo não é algo tão distante, tão grandioso. Quando eu completo aquele, aí eu arrumo outro pra poder me basear e trabalhar até lá. Atualmente, eu vislumbro o Campeonato Europeu que vai acontecer em Portugal, em janeiro, quero muito ir e eu venho me preparando, fazendo ponto nos campeonatos para poder chegar bem lá. Chegar com uma bagagem boa nas costas”, disse ela. 

Equipe multidisciplinar

Quando decidiu dar ainda mais um passo e se dedicar totalmente à carreira de atleta de alto rendimento em setembro do ano passado, Carol sabia que precisaria de uma equipe multidisciplinar à disposição, afinal, é fundamental que, diariamente, ela conte com todo o apoio profissional necessário. Um dos integrantes desse time que ajuda a lutadora a alcançar o maior nível de desempenho possível dentro dos tatames, é o preparador físico Netto Nóbrega, que a acompanha há pouco mais de um semestre.

“O trabalho de preparação física que a gente fez com Carol foi voltado para algo que ela realmente estava precisando, que era a manutenção de peso dela e ganho de força, que era uma pequena deficiência. E a gente conseguiu ter um êxito muito bom que foi justamente de alcançar essa forma física que ela está hoje; ela vem ganhando mais força durante as lutas e o resultado são as medalhas que está ganhando”, falou Netto.

“Eu costumo dizer a ela que, apesar de ser um esporte individual, nós somos uma grande equipe e ela é a representante. Então, acho importante demais tanto essa comunicação interdisciplinar de todas as áreas quanto também a interpessoal: questão profissional, familiar, lazer, para que tudo, de fato, esteja alinhado para uma melhor performance; porque a performance não vai ser só no treino, a gente sabe que é um desenvolvimento mental, físico e psicológico também. Então, a gente precisa que tudo esteja alinhado para um resultado final”, pontuou Sanderson Gomes, fisioterapeuta que auxilia a lutadora há quase três anos.

A lutadora de jiu-jítsu corrobora o pensamento dos dois. “É muito importante. Acho que se eu não tivesse esse apoio, eu não ia estar tão bem nas competições. Então, a preparação física me ajuda nos treinos, os treinos me ajudam para a competição e ainda tem o apoio do nutrólogo, que ajuda nessa questão de pesos, porque, às vezes, eu tenho que descer um pouco mais de peso, vou ter três competições seguidas no mês e preciso manter essa constância. Então, sempre esses ajustes melhoram meu desempenho, meu rendimento e, sem isso, acho que eu não seria nem metade do que sou hoje”, diz ela.

Incentivo familiar

Como já foi mencionado, Carol sempre contou com o apoio e o exemplo de pessoas apaixonadas pelo esporte dentro de casa. Uma delas é sua mãe, Thereza Bevilacqua, que faz questão de acompanhar a filha nas competições.

“Acho que esse apoio é fundamental, porque faz muita diferença ela saber que tem alguém ali na arquibancada, que tem alguém ali cuidando dela antes, durante e depois. E não é o cuidado de paparicar não, é aquele apoio mesmo de ela poder ir tranquila para lutar, porque o resto está organizado. Ela consegue ter a cabeça focada no que ela está fazendo no tatame, pois ela sabe que todo o processo antes e para frente tem alguém que está cuidando e nada como a mãe, não é? Então, foi sempre assim, sempre junto, sempre acompanhando os treinos, vendo a evolução dela”, declarou Thereza.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 12 de setembro de 2024.