Marcelo Brandão - Da Agência Brasil
O ano era 1996 e o local, o estádio da Universidade de Sanford, no estado da Geórgia, nos Estados Unidos. Na tarde de uma quarta-feira, Brasil e Nigéria disputavam uma das semifinais do futebol nos Jogos Olímpicos de Atlanta. A seleção brasileira, com jovens nomes que mais tarde se tornariam campeões mundiais em 2002, era o favorito.
O time de Ronaldo, Roberto Carlos e Rivaldo fazia uma partida segura. O resultado de 3 a 1 no primeiro tempo era mantido com certa tranquilidade no segundo. A disputa pelo ouro parecia mais próxima. Até que, de repente, tudo começou a ruir.
“Tivemos o 3 a 1 na Nigéria; poderíamos ter feito cinco, seis gols. Não fizemos e, no segundo tempo, eles vieram para o tudo ou nada, conseguiram o empate”, lembra Zé Elias, meio-campo titular da seleção naquele jogo. “Perdemos uma grande oportunidade de matar o jogo no primeiro tempo”, completou.
Depois do empate, aos 44 minutos do segundo tempo, veio a prorrogação. À época, existia a regra do gol de ouro – um gol na prorrogação desempatava e encerrava a partida. Foi o que aconteceu, logo aos três minutos do tempo extra, com um gol do nigeriano Kanu.
Em 1996, a medalha de ouro escapou pelos dedos, como já havia ocorrido nos jogos de 1976, 1984 e 1988. Outras oportunidades – também perdidas – viriam no jogos de 2000, 2008 e 2012.
Para o jornalista esportivo Sergio Du Bocage, o resultado dos jogos de Atlanta mostra falta de planejamento. Segundo ele, não há investimento suficiente na formação de um time olímpico. “A CBF [Confederação Brasileira de Futebol] não dá a devida atenção e, na hora da decisão, essa diferença pesa.”
De acordo com Bocage, que é apresentador do programa Mundo da Bola, da TV Brasil, e tem 34 anos de cobertura de futebol, essa falta de planejamento transparece ainda na escolha do treinador. “A CBF cometeu um erro ao usar o mesmo treinador da seleção principal também na seleção olímpica, sem dar uma atenção maior a esse time pré-olímpico durante os jogos.”
A estratégia, inclusive, deve ser utilizada novamente em 2016. Para Bocage, o técnico da seleção principal não terá tempo de conhecer o time que treinará em agosto, no Rio de Janeiro. A seleção fez dois amistosos em março, os últimos antes da convocação. Na derrota diante da Nigéria e a vitória em cima da África do Sul tiveram o técnico interino Rogério Micali na beirada do campo.
Pressão
Como se o simples fato de jogar pela primeira medalha de ouro do futebol brasileiro não fosse o suficiente, a atual seleção olímpica disputará uma competição em casa apenas dois anos após a trágica semifinal da Copa do Mundo entre Brasil e Alemanha, que ficou conhecida simplesmente como o 7 a 1.
Prováveis nomes na convocação final para os jogos, jovens como Gabriel, 19; Felipe Anderson, 22; e Rodrigo Caio, 22; entrarão em campo com a responsabilidade de ganhar o ouro inédito e apagar a má impressão da Copa do Mundo, quando a torcida esperava uma vitória em casa, mas viu o Brasil sendo goleado pelos alemães.
“Por ter acontecido o que aconteceu em 2014, aquela expectativa toda, o favoritismo do Brasil e, para muitos, a obrigação de ganhar em casa, acho que isso é sim uma responsabilidade a mais. E depois do que aconteceu na Copa é preciso ter uma atenção redobrada”, pondera Sávio.
Zé Elias também acredita que o peso nos ombros da jovem seleção aumentou. “Acho que essa seleção não vai ter tanto crédito quanto as outras seleções tiveram. Essa vai ter que mostrar que tem condições de conquistar [a medalha de ouro]. Depois do 7x1, o brasileiro ficou um pouco descrente do futebol, principalmente da seleção.”
Torcida
Para Bocage, a pressão existe, mas a torcida das partidas olímpicas não é a mesma de uma Copa do Mundo. “A torcida que vai assistir aos jogos de futebol na Olimpíada não será um torcedor de arquibancada. [Mas] é claro que nessa hora vão lembrar: 'perdemos a Copa do Mundo e vamos perder a Olimpíada também?'. Mas é uma coisa que passa.”
Na opinião do jornalista esportivo Cláudio Nogueira, que cobriu as últimas três olimpíadas, a torcida presente nos Jogos Olímpicos pode favorecer o clima na seleção. “Eu acho que o brasileiro não tem tanta euforia pela competição olímpica de futebol e isso pode ser algo favorável. Se você não badala tanto, isso não prejudica a cabeça dos atletas como pode ter prejudicado na Copa do Mundo”.
Bocage acrescenta que a seleção brasileira perdeu uma grande oportunidade na final dos jogos de 2012, em Londres, quando perdeu na final para o México, por 2 a 1. “Esses garotos que vão disputar a Olimpíada no Rio estão pagando a derrota da última Olimpíada, numa final que era para ter sido brasileira.”
Nos jogos de Atlanta, a atmosfera era mais favorável. A seleção jogava após uma conquista recente de Copa do Mundo – de 1994, nos Estados Unidos – e a pressão pelo ouro, segundo Zé Elias e Sávio, não chegava aos jogadores. “Sabíamos que ali era uma pressão, como era jogar na seleção brasileira e sabíamos de uma expectativa muito grande naquele ano. Agora, não havia uma cobrança específica”, conta Sávio. “Estávamos bem focados na competição e não no peso de conseguir a medalha”, acrescentou Zé Elias. Na opinião dele, a preparação foi adequada e a derrota foi circunstancial.
Derrota em Atlanta
Os atletas presentes em Atlanta não esquecem a tristeza e o abatimento do grupo após a derrota para os africanos. “É claro que depois do jogo foi uma frustração, uma tristeza muito grande, porque aquele objetivo que tínhamos traçado não tinha sido conquistado”, lembra Sávio.
Mesmo antes da disputa de terceiro lugar, contra Portugal, o ambiente ainda era de derrota, como conta Zé Elias. “O clima estava o pior possível. Lembro que antes do jogo de Portugal, o Ricardo Teixeira [presidente da CBF na época] foi ao hotel, na preleção do Zagallo, e falou o seguinte: 'Eu tenho apenas uma coisa pra falar. A medalha de bronze é obrigação de vocês, estamos entendidos?'”.
E a medalha de bronze foi conquistada, após vitória por 5 a 0 contra Portugal. Mesmo pouco celebrada pelo Brasil, a medalha é motivo de orgulho para Sávio. “Eu tenho a medalha de bronze guardada em casa com muito carinho. Não é fácil jogar uma Olimpíada e ser medalhista. Para mim, é uma satisfação muito grande.”