Criado há 21 anos por servidores da Justiça Federal na Paraíba, o bloco pré-carnavalesco Boi Vermelho foi fundado em 2003 em meio a correligionários do PC do B, mas desse histórico partidário o bloco herdou apenas a sua cor e o desejo de celebrar o festejo mais popular e democrático do país. “A gente não faz distinção a nada. As pessoas de todas as idades, de toda cor, religião, partidos políticos, o que for, vem para o Boi Vermelho e é bem recebido”, garante Marcos Santos, presidente fundador do bloco. Com concentração marcada para as 19h do próximo dia 3, sábado que antecede o carnaval, o bloco segue pelas ruas de Jaguaribe reunindo centenas de foliões.
“Hoje eu só quero alegria/ Quero paz e fantasia/ Quero amor e quero amar./ Deixo os problemas na gaveta/ Tiro tudo da cabeça/ Deixo a vida me levar. / Vermelho boi chegou”. Esse é o lema do grupo e parte do hino que se ouve desde a Rua Alberto de Brito com a Rua Monsenhor Almeida, em um dos bairros mais tradicionais de João Pessoa. A animação é conduzida há pelo menos 15 anos pela orquestra de frevo Paraíba de Ritmos, do Maestro Luís. No cortejo carnavalesco, todo mundo segue no chão, sem cordão de isolamento ou taxa de adesão. Depois de arrastar mais de 1,5 mil pessoas em anos anteriores, segundo os organizadores, a pandemia fez esse número reduzir a menos da metade, mas sem que isso descaracterizasse a qualidade de o Boi Vermelho ser um típico bloco de bairro.
No cortejo carnavalesco, todo mundo segue no chão, sem cordão de isolamento ou taxa de adesão
“O carnaval não é feito só na Epitácio Pessoa. O nosso Folia de Rua, fundamental, nasceu e se criou nos bairros. Temos mais de cem blocos que saem nos bairros, por criação e vontade da própria população. Não estamos na Via Folia, mas estamos fazendo o nosso carnaval. É nos bairros que as coisas acontecem”, defende o presidente do Boi Vermelho, que está filiado ao Folia de Rua desde 2010. Marcos Santos ainda aguarda confirmação da atração principal do desfile desse ano, que será indicado pelo Folia de Rua, mas em edições anteriores já contou com a participação de nomes conhecidos nas festas de Momo, a exemplo de Lis Albuquerque, Dandara Alves, Myra Maia e Batucada Eu Acho É Pouco, de Olinda.
Se a atração cultural da noite ainda é uma incógnita, o mascote do Boi Vermelho, manipulado de dentro por uma dezena de foliões, já confirmou presença no trajeto que segue pelas principais ruas de Jaguaribe, como a Av. Floriano Peixoto, Av. Conceição, Av. Cap. José Pessoa, entre outras. Um endereço diferente de onde ele nasceu, no Bairro Pedro Gondim, quando era solicitado inclusive para aderir às manifestações grevistas. Era de lá onde o atual secretário-geral do PC do B reunia os servidores pertencentes à Associação da Justiça Federal. Essa vinculação política foi se perdendo com o tempo e hoje é fazendo festa que eles desempenham sua função social.
Tendo em vista posicionamentos conservadores crescentes, botar o bloco na rua já é uma atitude política. “A minha posição é totalmente contrária às ideias de criminalizar a atividade cultural. Essa atividade é uma forma da sociedade demonstrar ou fazer a nossa cultura, a cultura do povo. O Carnaval é a cultura viva da população. O carnaval é do povo, e é uma das festas mais bonitas que acontecem no calendário cultural brasileiro”, avalia Santos. Com essa ideia, o Boi vem ganhando as cores de outros carnavais pelo estado e tem migrado também para ser festejado em cidades como Patos, no Sertão, e em Lucena e Jacumã, no Litoral.
Sempre junto com o Boi vão os estandartes produzidos pelo artista plástico Tito Lobo, responsável também por reinventar o símbolo do bloco todos os anos. Já o hino foi composto por Cacá Faria, Bernardo Neto e Marcos Santos, e tem interpretação do cantor Jadir Camargo. São esses elementos que se juntam às atividades de salvaguarda do bloco que vai para o seu vigésimo primeiro desfile. O futuro do Boi Vermelho também é projetado a partir da criação do bloco infantil Boizinho Vermelho, que se concentra no mesmo local do boi adulto, só que mais cedo, às 16h, com distribuição de pipoca, algodão doce e pula-pula para as crianças brincarem o carnaval.
Como política sempre esteve, de uma forma ou de outra, presente no Carnaval, Marcos Santos faz um apelo final, que soa em uníssono com os pleitos de todos os blocos de pequeno e médio porte de João Pessoa. “Os bairros recebem o apoio da Prefeitura, mas muito minguado. À medida que os anos passam, os recursos públicos diminuem. O número de pessoas vem diminuindo por falta dos poucos recursos investidos nos bairros. No Via Folia tudo é possível. Eles recebem patrocínio de cervejaria e ainda têm investimento do Estado e da Prefeitura. Essa é uma crítica que a gente faz pedindo apoio ao carnaval. Mas esperamos que esse ano a gente retome com toda força”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 23 de janeiro de 2024.