A região do Cariri paraibano passou, nas últimas duas décadas, por uma grande transformação: de território isolado, em decorrência de sua localização e seu clima, a área ganhou reconhecimento pela riqueza cultural e pelo turismo de base comunitária. Um dos grandes reflexos desse movimento é o desenvolvimento do município de Monteiro, hoje reconhecido como Cidade Mundial do Artesanato, com a chancela do Conselho Mundial de Artesanato.
Com o apoio do Governo da Paraíba, da Prefeitura Municipal e do Pacto Novo Cariri, programa liderado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às micro e pequenas empresas no estado (Sebrae--PB), os artesãos e artesãs da localidade puderam, ao longo dos anos, aprimorar seus talentos e negócios ligados à renda renascença, tipologia usada na confecção de peças de vestuário e decoração.
O Centro de Referência da Renda Renascença (Crença) é fruto desses investimentos em Monteiro, beneficiando todo o circuito regional vinculado ao artesanato. O empreendimento, inaugurado em 2021, dedica-se à preservação e à divulgação dessa tradição típica do Cariri, reúne mais de três mil rendeiras da região, funcionando como uma vitrine para a comercialização de seus produtos, além de espaço para capacitações e cursos.
Natural do município de Camalaú, a rendeira Quitéria Mariano, mais conhecida como Nita, lembrou como era vender seus itens de renda renascença antes das ações promovidas pelo Governo Estadual e pelo Sebrae-PB. “Há cerca de 70 anos, as peças eram feitas para cama, mesa e banho e eram vendidas em Pernambuco. A confecção e a comercialização eram em condições precárias. As rendeiras montavam as peças à noite, porque eram, antes de tudo, donas de casa e agricultoras,”, relatou Nita, frisando que, na época, o artesanato era um complemento à renda de muitas famílias.
Com os investimentos governamentais e o Pacto Novo Cariri, iniciativa que completa 25 anos em 2025, “tudo começou a melhorar”, segundo Nita. “As transformações aconteceram: a valorização [da renda renascença] e tantas outras coisas que envolvem a cooperação entre governo, instituições e empresas”, acrescentou.
Roteiros promovem crescimento integrado
Além do artesanato, o setor de viagens do Cariri também evoluiu. Entre os produtos desenvolvidos na região pela parceria entre o Governo da Paraíba, prefeituras municipais e o Sebrae-PB, a Rota Cariri Cultural foi um marco. O projeto nasceu em 2015, integrando 10 cidades em roteiros turísticos rurais, ecológicos e culturais. Monteiro, Sumé, Congo, Caraúbas, Camalaú, São Sebastião do Umbuzeiro, Prata, São João do Tigre, Coxixola e Taperoá abriram suas portas para visitantes interessados em vivenciar a essência da região, em atividades com a natureza e a cultura popular locais. Para a gestora de Turismo e Economia Criativa do Sebrae--PB, Regina Amorim, o Cariri tornou-se referência pela capacidade de integrar empreendedores locais em um modelo global de manutenção da cultura e da natureza. “O turismo cultural no Cariri é fruto da criatividade e da força do seu povo. A Rota Cariri Cultural mostrou que é possível gerar renda e oportunidades, preservando a identidade local. É uma experiência que inspira outras regiões do Brasil”, destacou.
“A ideia não foi criar apenas uma sequência de pontos turísticos, mas uma experiência de imersão, conectando o viajante à essência da região e sensibilizando empreendedores e gestores para ‘garimpar’ o que havia de melhor em um povo cheio de arte”, observou a gerente da agência regional do Sebrae-PB em Monteiro, Madalena Arruda.
Josivane Caiano, empreendedora de Monteiro, celebrou o triunfo da iniciativa. “Eu faço parte da Rota Cariri Cultural desde 2015. Para mim, ela não é apenas divulgação, mas valorização dos saberes da nossa região. É um trabalho que faz os moradores da Zona Rural se verem de forma diferente e despertarem para aquilo que é nosso. Quem eu era antes e quem sou agora, depois dessas descobertas, é muito diferente. Eu tenho orgulho de fazer parte disso”, pontuou.
Arte e natureza
Assim como a renda renascença, o impulso a autores e manifestações da música, da dança e da poesia popular do Cariri virou um dos pilares do desenvolvimento na área, promovendo as obras de mestres como Zabé da Loca, pifeira internacionalmente reconhecida; João de Amélia, do coco de roda; e o poeta Espedito de Mocinha, que lançou seu primeiro livro em 2022, por meio da Rota Cariri Cultural.
A vegetação da Caatinga também ampliou as possibilidades de atração de fluxo de visitantes ao Cariri, com a implementação de trilhas ecológicas na Serra da Engabelada, em Congo; na Serra da Matarina, na Prata; e na Laje das Moças, em Monteiro, além da valorização do patrimônio arqueológico regional, incluindo as pinturas rupestres preservadas em Sumé.
Esse olhar coletivo resultou em novos roteiros na região, como o Caminho das Águas e o Paraíba do Norte, que reforçam o turismo de base comunitária e a defesa do meio ambiente. Outros produtos bem-sucedidos que surgiram para consolidar o setor turístico local são o Festival Zabé da Loca e o Som nas Pedras, em Monteiro; a Rota das Águas e o Carnaval Molhado, em Congo e Camalaú; e os pedais ecológicos, que reúnem centenas de ciclistas.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 25 de setembro de 2025.