por André Resende*
Olhos arregalados, testa franzida e a apreensão de quem sabe que vai tomar uma vacina. Enzo Lacerda, 10 anos, mesmo na condição de pessoa com autismo, não fugiu da missão de se tornar uma “supercriança” imunizada contra o coronavírus. Ele foi uma das que receberam a vacina contra a Covid-19 na Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência (Funad), em João Pessoa, na manhã de ontem.
“Eu estava ansioso para tomar a vacina porque eu vou para a escola, daí queria ir já vacinado”, comentou. A mãe de Enzo, Soraia Lacerda Lins, de 39 anos, relatou que a vacina contra a Covid é uma segurança a mais para os pais, porque durante a pandemia, na maior parte do tempo, as crianças ficaram em casa. Com o imunizante, os pais e responsáveis podem tentar retomar o “novo normal”, com as crianças vivendo em espaços públicos, mas sem descuidar dos protocolos.
“Para as crianças que não convivem com o autismo já era bem complicado ficarem trancadas em casa, para uma criança com autismo é ainda mais difícil. Mas hoje a gente dá um grande passo para que Enzo volte a ter uma vida menos angustiante, inclusive, retorne às aulas na escola”, acrescentou.
Apesar da ansiedade pela vacina, Enzo Lacerda não chorou, aceitou tranquilamente a picadinha da agulha e segurou orgulhoso o diploma de “Supercriança”, certificado distribuído pela Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa para o público infantil que recebe as primeiras doses nesse momento da campanha.
Se “criar coragem” sozinho para ir tomar a vacina é mais difícil, com o irmão mais velho do lado fica mais fácil. Miguel e Robson da Silva, de oito e nove anos, respectivamente, foram juntos até a Funad receber o imunizante na manhã de ontem. Levados pela avó, Maria de Lourdes da Silva, tutora dos dois, eles tentaram correr da vacina, mas terminaram aceitando a ideia de receber a dose.
“Eu tive medo da vacina, estava com medo da agulha”, comentou Miguel Gabriel, mais novo que o irmão, mas com mais coragem. Sentado no colo da avó antes de receber a vacina, ainda tentou adiar o momento indicando um braço, depois o outro. Com a picada da agulha, fingiu ter desmaiado, mas em seguida abriu um sorriso e já saiu correndo pelo pátio da Funad.
Robson José, irmão de Miguel, no entanto, não fez muito estardalhaço e, após a dose, comentou que, por ter aceitado se vacinar, iria passar a ter regalias na casa onde mora com sua avó. “Agora eu vou passar o dia todo e a noite brincando no meu tablet, porque minha avó falou que se eu tomasse a vacina, poderia passar o resto do dia brincando”, festejou o menino.
A avó, Maria de Lourdes, explicou que o desafio de fazer com que os netos aceitassem a ideia de tomar a vacina só não foi maior do que o de criar os meninos e uma irmã, de 13 anos, na sua casa. Para ela, ainda mais por ser idosa, ter os netos pequenos vacinados significa tranquilidade, muito embora ela tenha sido imunizada já com as três doses contra a Covid-19.
“A gente fica com medo, ainda mais com a volta do surto. Mesmo eu tendo tomado todas as doses, fico com receio de que algum dos meninos possa pegar e passar para outras pessoas, até para mim mesmo. Agora, com os dois vacinados, além de saber que eles correm menos risco, a gente sabe que a imunidade fica melhor em caso de ter contato com o vírus”, acrescentou a avó dos novos vacinados.
Vacina hoje
A Prefeitura de João Pessoa começa a vacinar as crianças de sete anos sem comorbidades ou deficiência contra Covid-19 a partir de hoje. Para receber a primeira dose da vacina, é necessário apresentar documento oficial com foto das crianças, Cartão SUS ou CPF, e comprovante de residência em João Pessoa. Para este público, não é necessário agendamento.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 28 de janeiro de 2022