Uma mulher morreu no município de Cabedelo, na Região Metropolitana de João Pessoa, por uso das chamadas canetas emagrecedoras. Jéssica Manoele da Costa, de 31 anos, usava o medicamento sem acompanhamento médico, segundo informações da família, e, após uma aplicação do produto, passou mal e desmaiou, falecendo na última segunda-feira (3). O caso veio a público somente ontem.
De acordo com o Núcleo de Medicina e Odontologia Legal de João Pessoa (Numol-JP), após a avaliação do corpo de Jéssica, foi constatada queda de glicemia, o que provocou o desmaio, e a ocorrência posterior de uma broncoaspiração, causando sufocamento e levando a vítima ao óbito. O episódio reacende o debate sobre o risco do uso desses medicamentos sem a devida prescrição e orientação profissional.
O médico legista e chefe do Numol-JP, Flávio Fabres, ressaltou que a causa da morte foi confirmada por meio de perícia. “O corpo foi inicialmente encaminhado para o Serviço de Verificação de Óbito [SVO], que viu que havia uma ação externa no caso, e veio para a gente no Instituto Médico Legal [IML]. Quando o Samu chegou, ela estava com uma glicemia de 10, quando o normal é entre 60 e 99, então tentaram reanimar, mas não foi possível”, relatou. Flávio também explicou que a broncoaspiração acontece quando o alimento invade a via respiratória, causando o fechamento da traqueia. Com isso, o paciente não consegue respirar, sufocando-se.
O perito enfatizou o cuidado necessário na administração de fármacos, sejam eles quais forem. “Toda medicação tem riscos e benefícios. Nas canetas, um dos riscos é a hipoglicemia [queda anormal dos níveis de açúcar no sangue, causando sintomas como fraqueza, tremores e tontura], que não é tão frequente, mas pode acontecer”, destacou.
Médico alerta para cuidado com procedência
Usadas para o tratamento de obesidade, diabetes tipo 2 e, mais recentemente, apneia do sono, as canetas emagrecedoras só podem ser adquiridas via prescrição médica, e é preciso passar por acompanhamento especializado durante o tratamento. Segundo o médico Emanuel Santana, que atua nas áreas de emagrecimento, longevidade e melhora da performance física, a indicação desse tipo de fármaco deve ser feita após avaliação particular, caso a caso. “A gente tem que entender qual paciente é elegível para usar esse medicamento, já que ele aumenta a secreção da insulina, e isso diminui a concentração de açúcar no corpo. Então é importante saber se o paciente já não tem uma glicemia mais baixa, se usa outros medicamentos associados que aumentem esse risco, se há fatores que predispõem uma hipoglicemia”, salientou.
Outro ponto que chama atenção diz respeito à segurança dos medicamentos usados. “Não sabemos a procedência do medicamento que Jéssica estava utilizando. Além do fato de ela não ter tido acompanhamento médico, não podemos garantir a eficácia desse medicamento, se [o produto] realmente continha a substância adequada ou se foi adulterado”, alertou Emanuel. Muitas pessoas adquirem, por meio da internet, medicações que são comumente contrabandeadas, sem procedência conhecida e sem acondicionamento adequado.
“Esses medicamentos perdem a estabilidade e a eficácia. Além disso, não sabemos ainda a dosagem que Jéssica utilizou. As canetas devem ser aplicadas em uma progressão de doses, de forma orientada, e muitas pessoas que as usam sem prescrição já iniciam o tratamento com a dose máxima da substância, o que aumenta muito a secreção da insulina e eleva os riscos”, acrescentou o médico, que ressalta ser necessário, antes do início da aplicação, que o paciente faça exames laboratoriais, além de seguir sempre as recomendações do profissional que indicou o fármaco.
Emanuel também explicou que a venda desses medicamentos é feita, conforme indicação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apenas com receituário controlado, o que significa que eles estão sujeitos a um regime especial de liberação. Nesses casos, há retenção de receita e limitação de quantidade para comercialização, de acordo com o que for prescrito pelo profissional responsável.
O especialista ainda pontuou que o uso dessas substâncias pode causar efeitos colaterais. “Os mais comuns são efeitos gastrointestinais, como enjoo, náuseas, vômito, dor abdominal, constipação ou diarreia. Pode haver também um pouco de dores de cabeça ou no corpo”, comentou. Já a hipoglicemia, que foi o caso de Jéssica, é uma reação menos comum, mas que pode ser agravada pela aplicação indiscriminada das canetas.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 7 de novembro de 2025.