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“Exército virtual” foi usado para influenciar eleições brasileiras de 2014

publicado: 11/12/2017 21h45, última modificação: 11/12/2017 21h45
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Entre os favorecidos com as mentiras estariam Renan Calheiros (PMDB), Aécio Neves (PSDB), Renan Filho (PMDB), Laura Carneiro (PMDB), Eunício Oliveira (PMDB) e Ricardo Ferraço (PSDB) - Foto: Jackmac34/Pixabay

tags: fakes , eleições 2014 , mentiras , aécio neves , renan calheiros , vital do rego filho


Por Ciberia/CanalTech/BBC

Poderia muito bem ser mais uma notícia sobre a manipulação da opinião pública e as fake news que auxiliaram na chegada de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, mas agora o assunto é Brasil. Em uma reportagem publicada na sexta-feira (8), a BBC revelou que um verdadeiro “exército virtual” de perfis falsos foi usado para manipular a opinião pública durante as eleições presidenciais de 2014.

O esquema já estaria em funcionamento desde 2012 e teria beneficiado pelo menos 13 políticos, entre candidatos ao Planalto, Senado e Câmara dos Deputados. Entre os citados na reportagem estão Renan Calheiros (PMDB), Aécio Neves (PSDB), Renan Filho (PMDB), Laura Carneiro (PMDB), Eunício Oliveira (PMDB) e Ricardo Ferraço (PSDB).

A atuação online era parecida, mas a utilização dos fakes variava de um candidato para o outro. Em todos os casos, fotos de pessoas reais, URLs verdadeiras e postagens cotidianas serviam para dar aparência de legitimidade aos perfis, evitando também a detecção por serviços automatizados das redes sociais. Em meio às publicações, entretanto, surgiam mensagens de apoio a candidatos, declarações de intenção de voto e até ataques a inimigos políticos.

O senador Aécio Neves, por exemplo, foi citado como o melhor preparado durante os debates presidenciais de 2014. Já Calheiros foi assunto de posts defensivos, principalmente em resposta aos protestos de 2013, com direito à utilização da hashtag #MexeuComRenanMexeuComigo. Toda a operação seria comandada por uma empresa chamada Facemedia, que contratou dezenas de pessoas para comandar os perfis falsos.

Os “ativadores”, como eram chamados, recebiam contas já montadas, com direito a fotos e descrição de cada uma das “personas”, como eram apelidados os fakes, que contavam até com chips de celular usados na autenticação. Todos eram monitorados pelo Skype e trabalhavam em regime de home office, recebendo valores que poderiam ir dos R$ 800,00 a R$ 2 mil.

No dia-a-dia, os funcionários realizavam postagens cotidianas, dando bom dia a seguidores, comentando algum filme ou reclamando da vida. As mensagens eram publicadas com o uso de sistemas de gerenciamento de redes sociais como o Hootsuite – algumas pessoas, de escalão mais baixo, eram responsáveis apenas pelas mensagens cotidianas, programando postagens para a semana inteira e realizando interações entre os perfis.

Já outros cuidavam da parte política do negócio, além de publicarem comentários em sites de notícias ou votar em enquetes – muitas vezes, fazendo isso de forma repetitiva durante oito horas por dia. Além disso, pessoas reais eram adicionadas de forma aleatória, também como maneira de dar aparência de legitimidade às contas. Quando uma era desmascarada por militantes políticos ou bloqueada pelos sistemas de segurança das redes sociais, outras surgiam em substituição.

A Facemedia contava com um banco de dados de milhares de perfis falsos prontos para serem utilizados. Depois das eleições, muitos acabaram abandonados, com uma análise mostrando que 20% das contas utilizadas durante as eleições foram deixadas de lado em 27 de outubro de 2014, justamente o dia seguinte à votação do segundo turno das eleições daquele ano.

A BBC analisou somente uma amostra de contas que pertenceriam à Facemedia, mas fontes ouvidas pela reportagem afirmam que o escopo da operação seria muito maior, envolvendo também outras empresas que realizavam o mesmo tipo de serviço. Entretanto, foi possível estabelecer ligações não apenas com políticos, mas também com partidos. A companhia teria recebido R$ 360 mil do Comitê Nacional do PSDB para “serviços de marketing e comunicação digital”.

Renan Filho (PMDB), candidato ao governo de Alagoas, e Vital do Rêgo Filho (PMDB), da Paraíba, também tiveram pagamentos localizados, bem como uma empresa ligada à campanha de Aécio Neves à presidência, com compensações de R$ 504 mil.

Outros políticos citados pela reportagem são Paulo Hartung (PMDB), governador do Espírito Santo; o ex-deputado estadual Felipe Peixoto (PSB-RJ); o ex-senador Gim Argello (DF); o ex-prefeito de Vila Velha Rodney Miranda (DEM) e o secretário de Habitação do Rio de Janeiro, Índio da Costa (PSD).

A deputada Laura Carneiro (PMDB) também aparece na lista e, inclusive, seria cliente até poucas semanas atrás, com supostos apoiadores de sua atuação política publicando elogios e comentários nas redes sociais. Em resposta, a maioria dos citados disse não ter utilizado os serviços. Outros admitem terem feito negócios com a Facemedia, mas com o caráter de monitoramento de mídias sociais e divulgação legítima das campanhas.

Aécio Neves, por exemplo, disse não reconhecer a empresa, enquanto Eunício Oliveira disse não ter autorizado o uso de perfis falsos. Já Renan Calheiros afirmou jamais ter contratado tais iniciativas e, inclusive, que nem mesmo era assíduo nas redes sociais durante as eleições.

Já a Facemedia, em resposta, disse não repassar as informações de contratos firmados com clientes, mas afirmou que seus serviços são transparentes, estando registrados junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A companhia admite que, entre suas atribuições, está a “criação e manutenção de sites e perfis”, mas não confirmou nem negou a criação de contas falsas para fins políticos ou não.