A Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB) realizou, ontem, uma audiência pública para debater a sexualização precoce de crianças e adolescentes nas redes sociais. A atividade foi proposta pela Comissão de Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados e reuniu a secretária nacional dos Direitos da Criança, Maria do Pilar; a representante de big techs como Meta, Google, Discord, Amazon, Kwai e Hotmart, Roberta Jacarandá; além de autoridades estaduais e federais.
A secretária nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Maria do Pilar, foi uma das participantes. Ela salientou que a audiência pública representa um passo importante na conscientização e na busca por soluções para esse problema crescente. “A gente conhece pouco [sobre esse assunto], e tem embutida uma série de violações: o trabalho infantil, a exploração sexual, o incentivo ao consumo desenfreado. Então, é muito bom ter um espaço e começar aqui, na Paraíba, para que a gente possa cada vez mais jogar luz sobre esse assunto”, celebrou.
O deputado federal Ruy Carneiro (Podemos), que preside a comissão federal e propôs a audiência, enfatizou que a discussão tomou uma importante proporção a partir do vídeo produzido pelo influenciador digital Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, o qual chamou a atenção do país para um assunto sensível e grave. “Até nós mesmos, que somos da comissão desse tema, não tínhamos conhecimento da gravidade dos fatos que aconteciam nessa questão da ‘adultização’ — de crianças sendo utilizadas por adultos [com conteúdo] monetizado pelas empresas de redes sociais”, afirmou.
A sessão realizada na ALPB foi o início de uma série de encontros promovidos pela comissão da Câmara Federal para discutir o tema e fornecer subsídio para desenvolver uma regulamentação mais elaborada quanto à proteção de crianças e adolescentes.
Em agosto deste ano, por exemplo, foi aprovado o Projeto de Lei (PL) no 2628, que criou regras para a proteção da criança e do adolescente no ambiente digital, que ficou conhecido como o ECA Digital, fazendo referência ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Na avaliação do parlamentar federal, o texto aprovado é “um texto inicial, feito de maneira breve”, sendo preciso ainda desenvolver uma legislação mais elaborada.
A deputada federal Rogéria Santos (Republicanos-BA) anunciou a criação do Grupo de Trabalho sobre Proteção de Crianças e Adolescentes em Ambiente Digital da Câmara para a próxima semana, que será coordenado por ela. Ela ressaltou, ainda, que a audiência busca promover a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes. Para ela, “o grande problema das violências é a normalização”, a qual coloca os jovens em situação vulnerável e tornou-se um dos principais desafios para combater a exploração de crianças e adolescentes.
“Não é normal a criança estar com uma roupinha indecente em um vídeo na internet. Não é normal a criança fazer um vídeo, uma produção e ser monetizada, recebendo um salário superior ao do seu pai. Não é normal que essas crianças saiam das escolas e comecem a trabalhar, destruindo suas vidas”, criticou.
A conselheira tutelar do bairro pessoense de Mangabeira, Verônica Oliveira, enfatizou a importância da discussão sobre a “adultização” e reforçou a necessidade de se evitar a criminalização das famílias na responsabilidade dessa exposição. Para a conselheira, “essa violação não é uma violação nova, já acontece há muitos anos e a gente precisa tomar muito cuidado para não criminalizar a família porque, se nós tivéssemos escolas públicas em tempo integral e todos os direitos da criança efetivados, como diz no ECA, certamente, a gente não estaria fazendo essa audiência pública”, ponderou.
Programação
O seminário foi composto por três mesas de discussão, com os seguintes temas: sistema jurídico de proteção de crianças e adolescentes e a realidade das redes sociais; impactos à saúde de crianças e adolescentes vítimas e construção de redes de apoio; e tecnologia, políticas de plataforma e inovação na proteção digital. O procurador do Ministério Público do Trabalho, André Canuto, assim como a representante das big techs e head de Relações Institucionais do Conselho Digital, Roberta Jacarandá, participaram do evento remotamente.
Autoridades locais
A promotora Ana Maria França Cavalcante, do Ministério Público da Paraíba (MPPB), defendeu a participação ativa da sociedade na busca por soluções eficazes para proteger as crianças e adolescentes no ambiente virtual. A promotora entende que “a exploração de crianças e adolescentes no ambiente virtual se tornou um caso alarmante” e espera que o debate contribua para a criação de estratégias mais efetivas de combate a esses crimes.
“Esse caso que nós estamos apurando atualmente, [do influenciador digital Hytalo Santos] não é o primeiro, porque isso é uma crescente em todo o Brasil, em todo o mundo. Hoje, a gente vai voltar o olhar para ver nossas responsabilidades e o que pode também ser melhorado quando se trata de disciplina legal de alguns dos equipamentos que são usados por crianças e adolescentes, para evitar que essas crianças, essas pessoas em formação, sejam expostas”, declarou.
O deputado estadual Chió (Rede) enfatizou a importância de garantir que as crianças possam viver plenamente sua infância, alertando para as graves consequências da perda desse período crucial da vida. O parlamentar agradeceu a Ruy Carneiro por levar o debate à Assembleia, “por estar trazendo esse tema para aprofundar e debater a necessidade de que nossas crianças sejam realmente crianças”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 12 de setembro de 2025.