Do Congresso em Foco (Joelma Pereira)
Emitido às custas do contribuinte, pelo menos 97 passaportes diplomáticos foram confeccionados para parlamentares apenas em 2017. No entanto, desse total, apenas 27 eram para os congressistas. Pelo menos 51 foram emitidos para beneficiar filhos de deputados e senadores, 18 para cônjuges e companheiros dos parlamentares e um para segurança particular. Coincidência ou não, junho e novembro foram os meses em que mais passaportes diplomáticos foram emitidos – exatamente às véspera das férias escolares.
Atualmente, há 1.285 passaportes diplomáticos em circulação pedidos por parlamentares. Desses, a maioria vence depois do fim do mandato parlamentar, alguns só em 2020. Nesses casos, os detentores do documento podem utilizá-lo como se ainda fossem autoridades, conforme revelou reportagem do Bom Dia Brasil (TV Globo) desta quinta-feira (21).
Quem possui passaporte diplomático tem privilégios ao entrar em países estrangeiros. Não fica na fila comum dos demais viajantes. Também recebe tratamento menos rigoroso das autoridades. Alguns países que exigem visto o dispensam para quem tem o documento especial. Além disso, ao contrário do passaporte comum, o passaporte diplomático não custa nada para o beneficiado. Para o cidadão comum, o custo da emissão do documento é de R$ 257,25.
Este tipo de passaporte é concedido a diplomatas ou cidadãos brasileiros que desempenham funções de representação do Brasil no exterior. Possuem o documento também o presidente da República, o vice-presidente, ex-presidentes, ministros, governadores, diplomatas, militares, parlamentares e magistrados de tribunais superiores.
Uma portaria do Itamaraty, o Ministério das Relações Exteriores, determina que o parlamentar precisa provar que a pessoa a receber o passaporte está desempenhando ou desempenhará “missão ou atividade continuada de especial interesse do país”. Além disso, a portaria diz que a validade do documento deve estar vinculada ao tempo da missão no exterior. No entanto, as regras não são cumpridas. O Ministério das Relações Exteriores é o responsável pela emissão do documento.
De acordo com o repórter Chico Requeira, na Câmara seis deputados lideram a lista dos parlamentares com maior número de emissão de passaportes diplomáticos. O deputado Genecias Noronha (SD-CE) lidera a lista com emissão de seis passaportes diplomáticos a seu pedido. Questionado pelo repórter, o deputado alegou que tem sete filhos e uma esposa. Ele assumiu ter viajado com a família para fora do país, em férias.
O deputado Silas Freire (Pode-PI), que também emitiu seis passaportes, assumiu à reportagem da TV Globo não ter participado de nenhuma missão especial fora do Brasil, mas disse ter viajado para o exterior com a família, em uma única viajem, com recursos próprios. Com mesmo número de emissões, o deputado Luiz Fernando Faria (PP-MG) alegou que, apesar de ter pedido os passaportes, nunca fez uso dos documentos. Já o deputado Marcelo Delaroli (PR-RJ), com quatro emissões, disse ter viajado em missão diplomática, mas sem a família.
Polêmica do passaporte
No ano passado, ainda na gestão do senador José Serra (PSDB-SP) no Itamaraty, após conceder o passaporte diplomático ao pastor Samuel Cássio Ferreira, investigado na Operação Lava Jato, o então ministro das Relações Exteriores havia afirmado que determinaria à pasta a reavaliação da política de expedição desse tipo de documento no Brasil. A afirmação foi feita após questionamento dos sobre os critérios para a liberação do benefício para o presidente da Assembleia de Deus Ministério Madureira e sua esposa, Keila Ferreira.
Na justificativa, a assessoria de Serra, na época, disse que o passaporte diplomático foi concedido ao casal “com base no princípio de isonomia, uma vez que essa categoria de passaporte tem sido historicamente concedida a cardeais da Igreja Católica”. Como mostrou o Congresso em Foco, o religioso é aliado político do presidente Michel Temer (PMDB).