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Julgamento do golpe

Moraes reafirma isenção do STF

publicado: 03/09/2025 08h47, última modificação: 03/09/2025 08h47
Advogados de quatro dos oito réus fizeram sustentações orais e defenderam a inocência de seus clientes
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Sessão teve início às 9h e foi encerrada às 17h55, com um intervalo para o almoço às 12h | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

por Redação (Com Agência Brasil)*

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, por volta das 17h55, o julgamento do ex--presidente Jair Bolsonaro e de mais sete réus do Núcleo 1 da trama golpista. Pela manhã, o relator, o ministro Alexandre de Moraes, leu o relatório da ação penal, e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu a condenação de Bolsonaro e dos demais acusados.

O julgamento será retomado hoje, a partir das 9h, quando serão ouvidas as sustentações dos advogados de Bolsonaro; do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; do ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e do general Braga Netto, ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice na chapa de 2022.

A peça lida por Moraes contém o resumo de todas as etapas percorridas no processo, desde as investigações até a apresentação das alegações finais, última fase antes do julgamento. Segundo ele, todos os réus “serão julgados de forma imparcial, como qualquer cidadão, sem que o Supremo Tribunal Federal (STF) ceda a qualquer tipo de pressão interna ou externa”.  

Em discurso antes de iniciar a leitura do relatório sobre o caso, o ministro afirmou que os réus estão submetidos ao devido processo legal, com ampla defesa e oportunidade de contraditório. Para ele, havendo provas de que são culpados, eles serão condenados, mas, se houver “qualquer dúvida razoável” sobre a autoria dos crimes, serão absolvidos.

“A pacificação do país depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições, não havendo possibilidade de se confundir a saudável e necessária pacificação com a covardia do apaziguamento, que significa impunidade e desrespeito à Constituição Federal. E mais: significa incentivo a novas tentativas de golpe de Estado”, destacou Moraes.

“Esse é o papel do Supremo Tribunal Federal (STF), julgar com imparcialidade e aplicar a Justiça a cada um dos casos concretos, independentemente de ameaças ou coação, ignorando pressões internas ou externas”, assegurou o ministro.

Foram destinadas oito sessões para análise do caso, marcadas para os dias 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro. A votação que vai condenar ou absolver os réus deve começar somente nas próximas sessões. As penas podem passar de 30 anos de prisão.

Sustentações

Após intervalo para almoço, os ministros começaram a ouvir as sustentações dos advogados dos oito réus. A primeira a falar foi a defesa de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. O advogado defendeu a manutenção do acordo de delação premiada e negou que o militar tenha sido coagido pelo ministro Alexandre de Moraes e integrantes da Polícia Federal a delatar.

O advogado de Cid, Jair Pereira, reiterou que seu cliente não tinha conhecimento do arquivo de Word chamado “Plano Punhal Verde-Amerelo”, elaborado, segundo a acusação da PGR, para matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes.

Alexandre Ramagem

Em seguida, o advogado do ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, negou que tenha sido determinado o monitoramento ilegal de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de desafetos políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo o advogado Paulo Renato Cintra, Ramagem apenas “compilava pensamentos do presidente da República”.

Almir Garnier

A defesa do almirante Almir Garnier, um dos réus da trama golpista, negou que o militar tenha colocado as tropas à disposição da tentativa de golpe de Estado para reverter o resultado das eleições de 2022. O advogado Demóstenes Torres aproveitou para pedir a absolvição do militar.

De acordo com a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), Almir Garnier participou de uma reunião entre o ex--presidente Jair Bolsonaro na qual foram apresentadas minutas com estudos para decretação das medidas de exceção. A ideia teria sido rechaçada pelos comandantes da Aeronáutica e do Exército, mas o almirante teria dito ao ex-presidente que suas tropas estariam “à disposição”.

“Não existiu essa reunião. Foi afirmado que foi no dia 7 [de dezembro de 2022] e isso não existiu. Essa é a acusação principal”, afirmou. Torres também defendeu a anulação do acordo de delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Anderson Torres

Último a se manifestar neste primeiro dia de julgamento, a defesa do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal da Justiça Anderson Torres classificou a chamada “minuta do golpe” encontrada pela Polícia Federal (PF) como “minuta do Google”.

O advogado Eumar Novacki disse que o documento está disponível na internet, de forma apócrifa, e não tem qualquer valor jurídico. Em ação de busca e apreensão durante as investigações, a chamada “minuta do golpe” foi encontrada impressa na casa do ex-ministro. “Era uma minuta apócrifa, que nunca circulou e nunca foi discutida”, afirmou.

Novacki também rebateu as acusações relacionadas aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Torres foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de se ausentar do Distrito Federal em meio aos atos. No dia dos ataques, ele ocupava o cargo de secretário de Segurança do DF, mas estava de férias nos Estados Unidos.

Crimes

Os réus respondem no Supremo pelos crimes de organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça; e deterioração de patrimônio tombado.

A exceção é o caso do ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, que, atualmente, é deputado federal. Ele foi beneficiado com a suspensão de parte das acusações e responde somente a três dos cinco crimes. A possibilidade de suspensão está prevista na Constituição.

Lula diz que STF não deve temer EUA

 Bruno Bocchini (Agência Brasil)*

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva comentou, ontem, o julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus, iniciado pela manhã no Supremo Tribunal Federal (STF). Lula falou com a imprensa após comparecer ao velório do jornalista Mino Carta, em São Paulo.

“O que está acontecendo é que os fatos estão vindo à tona e as pessoas estão começando a perceber que período nefasto da história brasileira nós vivemos”, ressaltou o presidente.

“E obviamente que o Mino Carta, se tivesse, hoje, sentado na frente da sua máquina, não do computador, da sua máquina, ou na caneta, estaria escrevendo quem sabe a mais bela história do que aconteceu nos últimos anos no Brasil”.

Perguntado sobre as expectativas em relação ao julgamento do STF, Lula disse esperar que “seja feita a justiça”, com base nos autos e no respeito à presunção de inocência.

“Ninguém está julgando ninguém pessoalmente, ou seja, tem um processo, tem os autos, tem delações, tem provas e que a pessoa que está sendo acusada tem o direito a presunção da inocência, ele pode se defender como eu não pude me defender. E eu não reclamei. Eu não fiquei chorando, eu fui à luta. Se é inocente, prove que é inocente”.

O presidente também comentou as tentativas de interferência do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

“Olha, eu acho que não tem motivo para ficar temendo a acusação americana. O que está acontecendo com os Estados Unidos é que ele exacerbou, sabe, qualquer coisa que a gente tinha conhecimento na história da humanidade de um governo se meter a julgar o comportamento da Justiça de outro país. É um negócio inacreditável. Eu acho que as pessoas precisam aprender a respeitar. Cada um toma conta do seu terreiro, cada um toma conta do seu ninho”.

O presidente voltou a afirmar que Trump não foi eleito para ser imperador do mundo, mas destacou que, se houver disposição para negociar, “o Lulinha paz e amor está de volta”.

“Eu não tenho nenhum interesse de brigar com os Estados Unidos da América do Norte, nenhum interesse. Eu tenho interesse de fazer com que essa amizade de 201 anos possa conviver democraticamente mais 201 anos e eu, sinceramente, estou no aguardo de que, em algum momento, sabe, vai acontecer alguma coisa na cabeça do presidente Trump, ele vai perceber, puxa vida, que tem de negociar”.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 3 de setembro de 2025.