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Produtores e gestores culturais da PB desaprovam modificações da Lei Federal de Incentivo à Cultura feitas nesta semana

publicado: 10/02/2022 08h54, última modificação: 10/02/2022 08h54
presidente Jair Bolsonaro e o secretário de Cultura Mario Frias - Reprodução - Twitter.jpg

Foto: Secom-PR

por Guilherme Cabral*

Uma série de modificações da Lei Federal de Incentivo à Cultura (8.313/91), mais conhecida como Lei Rouanet, contida em uma Instrução Normativa (IN) publicada na última terça-feira (dia 8) pelo Governo Federal, por meio da Secretaria Especial da Cultura, do Ministério do Turismo, não agradou ao segmento artístico, inclusive na Paraíba.

“É mais um golpe na cultura por parte do governo Bolsonaro”, disse a produtora cultural Nina Rosa, que prevê algumas consequências, a exemplo da precarização da mão de obra e a redução na realização de eventos.

“Essas mudanças são o caminho que o governo Bolsonaro tem tomado para o desmonte da cultura”, afirmou o multiartista André Morais.

“É mais uma tentativa de fazer a diminuição dos recursos para a cultura, que já são parcos”, declarou o secretário de Estado da Cultura (Secult-PB), Damião Ramos Cavalcanti.

No entender de Nina Rosa, as modificações deverão impactar, sobretudo, as propostas que venham a ser inscritas por essa nova Instrução Normativa, por acreditar que os outros projetos já existentes e em andamento seguem outra IR. “Acredito que ninguém da classe artística será favorável a essas mudanças”, afirmou a produtora cultural, para quem a redução de 50% no limite para captação de recursos pela lei, por exemplo, poderá contribuir para diminuir a realização de grandes eventos. “Outra medida, que é a diminuição de cachês artísticos em 93%, causará a precarização da mão de obra, com a menor contratação de trabalhadores, atingindo diretamente a cadeia produtiva cultural”, disse ela.

O secretário de Cultura da Paraíba, Damião Ramos Cavalcanti, também não concordou com a medida que reduz em 50% o limite para captação de recursos pela Lei Rouanet. “Se essa redução fosse pensada com o objetivo de promover a multiplicação do atendimento, para contemplar mais proponentes, seria correto, mas essa medida é simplesmente para a diminuição dos recursos”, apontou ele, para quem “o projeto tem que ser exato, enxuto, para ser cumprido com a seriedade com que foi elaborado”. Referindo-se à redução dos cachês, o gestor considerou como sendo “uma medida drástica, que poderá atingir praticamente a totalidade dos artistas”.

á André Morais analisou que as medidas foram escritas de “uma forma dúbia, para reduzir o espaço da cultura no Brasil, em que acontecem os questionamentos políticos e culturais”. Ele exemplificou com a inclusão da arte sacra: “Isso pode contemplar vários produtos culturais religiosos que não podem ser abraçados como arte sacra. Não vejo com bons olhos. Há o interesse em reduzir, enxugar o espaço da cultura no país e aí existe o não entendimento de como a lei funciona em cada Estado. Não se pode comparar São Paulo, que tem um mercado mais forte, com a Paraíba, que tem outra dimensão, mas que está se fortalecendo. A cultura é uma roda que, quando se movimenta, gera empregos diretos e indiretos”.

O regulamento da Lei Rouanet, que é considerado o principal mecanismo de fomento à Cultura no Brasil e impulsionador da produção das atividades, já havia sofrido alterações, por meio de portaria, em julho de 2021. As novas medidas vinham sendo anunciadas desde 1º de janeiro passado pelo secretário Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura, André Porciúncula, em publicações no Twitter e o secretário de Cultura, Mario Frias, afirmou que a nova Instrução Normativa objetiva tornar a lei “mais justa e popular”.

Entre as novas medidas contidas na IN estão as seguintes: estabelecimento de redução de 50% no limite para captação de recursos. Para projetos de “tipicidade normal”, o teto cai de R$ 1 milhão para R$ 500 mil. Para projetos de “tipicidade singular”, a exemplo de desfiles festivos, eventos literários, exposições de artes e festivais, o valor fica limitado a R$ 4 milhões. Para aqueles de “tipicidade específica” — concertos sinfônicos, datas comemorativas nacionais, educativos e ações de capacitação cultural, inclusão da pessoa com deficiência, museus e memória, óperas, projetos de bienais, projetos de internacionalização da cultura brasileira e teatro musical — o valor máximo fica em R$ 6 milhões.

Há, ainda, limite de R$ 10 mil para o valor destinado ao alugueis de teatros, espaços e salas de apresentação, exceção teatros públicos e espaços públicos. Outra medida: nos aportes acima de R$ 1 milhão, o patrocinador ficará obrigado a investir 10% em projetos de proponentes que não obtiveram patrocínio anteriormente, condicionados a projetos de capacitação cultural, acervo museológico público, patrimônios imateriais registrados e patrimônios materiais tombados, e de museus e bibliotecas públicas em regiões com menor potencial de captação.

A IN ainda proíbe empresas patrocinadoras de aportarem recursos por mais de dois anos consecutivos em projetos de um mesmo proponente, de seus integrantes de conselhos e atos constitutivos, salvo planos anuais de atividades ligados a setores de museus públicos, patrimônio material e imaterial e ações formativas de cultura, sob pena de inabilitação do proponente.

O prazo máximo de captação, com eventuais prorrogações, passa a ser até 24 meses, o que, anteriormente, poderia ser realizada em até 36 meses. A nova Instrução Normativa também decreta a não possibilidade de execução do orçamento com alterações nos valores aprovados. Ou seja, se antes era possível aprovar desde valores não alterados, o remanejamento entre itens de despesa, agora, é preciso permanecer com o mesmo orçamento por um ano.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 10 de fevereiro de 2022