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“O Agente Secreto” rumo ao Oscar

publicado: 12/08/2025 08h07, última modificação: 12/08/2025 08h07
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Cineminha no Alvorada: secretária do Audiovisual, Joelma Gonzaga; Wagner Moura; Kleber Mendonça Filho; ministra da Cultura, Margareth Menezes; presidente Lula; primeira-dama Janja; e o secretário-executivo, Márcio Tavares | Foto: Divulgação /Ricardo Stuckert

por André Cananéa*

A cena, publicada no perfil do jornal Folha de SP no Instagram, chamou minha atenção. Um cortejo. O abre-alas, passistas de frevo. Logo em seguida, uma fanfarra com metais em brasa tocando ‘Voltei, Recife’. E ao fim, uma ala composta pelo diretor Kleber Mendonça Filho, a esposa e produtora Emilie Lesclaux e o ator Wagner Moura, entre outros atores e atrizes. Na legenda da postagem, leio: “Lula recebe equipe do filme 'O Agente Secreto' no Alvorada”.

Sim, o cortejo era para o presidente Lula, a primeira-dama Janja e a ministra da Cultura Margareth Menezes, que assistiram, em primeira-mão, ao novo filme do pernambucano em uma sessão para lá de especial do Cine Alvorada, com direito a tapete vermelho, luzes e trajes de gala. Parecia o Oscar! Em um depoimento veiculado no perfil do presidente Lula, Kleber Mendonça revela que aquela sessão, na noite da última quinta-feira (7), marcaria a primeira exibição no Brasil do filme estrelado por Wagner Moura.

Aliás, no perfil do próprio diretor - que conta com 207 mil seguidores - há um vasto material sobre aquela noite, com direito a fotos e vídeos de todos os tipos, incluindo uma “collab” com o perfil do próprio Presidente da República.

Não me sai da cabeça que numa semana tão agitada no país, em que o tarifaço de Trump entrou em vigor, Bolsonaro entrou em prisão domiciliar rígida e oposicionistas tomaram a Câmara de assalto, Lula tenha encontrado tempo na agenda para relaxar e assistir a um filme. O próprio Kleber se apressou em dizer uma frase matadora, registrada em vídeo na postagem feita em colaboração com Lula: “A gente ser recebido aqui, no Alvorada, para apresentar o Agente Secreto, eu acho que é uma prova muito grande de cidadania”.

O release enviado pela assessoria do filme registrou que o evento foi organizado pela equipe do Ministério da Cultura, mas é claro que integra a estratégia - bastante forte, por sinal - para fazer O Agente Secreto chegar ao Oscar. Depois do efeito Ainda Estou Aqui, seria até burrice, com o perdão da palavra, Kleber Mendonça, com o status que alcançou e com um filme tão politicamente brasileiro e estrelado por um compatriota de prestígio no exterior, não surfar na superexposição do cinema brasileiro.

Então o que acompanhamos em tempo real, através da produção robusta de conteúdos para as redes sociais, é uma espécie de “frevo pra gringo ouvir”, ou seja, mostrar que um presidente abrir espaço em sua agenda, mesmo em uma semana conturbada para o país, para prestigiar Kleber, Moura e O Agente Secreto é, sim, mandar recado para o resto do mundo: Gente, aqui está o título mais importante do Brasil depois de Ainda Estou Aqui.

Claro que eu não vi o filme ainda, mas gosto de ver KMF jogar. Não acho que seja mera “agenda” colocar a estreia comercial do filme para o fim do ano (6 de novembro). Antes do julgamento do público, que hoje tem voz atrativa em plataformas como Rotten Tomatoes e Letterbox e é capaz de engajar uma obra, ou destruí-la com essas ferramentas, há quase todo um ano para gerar aquela expectativa que deixa o público com aquele gostinho de “não vi ainda, mas já gostei”, inflando as qualidades do filme e seus realizadores até o momento que o título chega aos cinemas (a Warner deu aula disso recentemente com Superman).

Até o dia 6 de novembro, esse bolo vai assar a contento: começou com goleada em Cannes, no início de junho, onde O Agente Secreto ganhou o mesmo carnaval do Alvorada e saiu do festival francês com nada menos que quatro prêmios, entre eles uma rara dobradinha Melhor Diretor/Melhor Ator e uma distribuição poderosa da Neon (responsável por Anora, filme vencedor do Oscar deste ano) nos Estados Unidos.

Em julho, o filme foi exibido nos jardins do prestigiado Museu do Louvre (com direito a presença da atriz francesa Juliette Binoche, presidente do júri do Festival de Cannes 2025) e comemorou a distribuição do filme pernambucano em outros 94 países pela prestigiada MK2.

Em setembro, mês que o Brasil costuma revelar o longa-metragem nacional que vai representar o país para disputar uma vaga entre os cinco indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional - que deu a estatueta deste ano à Ainda Estou Aqui saiu -, O Agente Secreto tem pré-estreias concorridas em Recife (PE), onde foi rodado, e terá a honra de abrir o 58º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.

Então é isso: outrora uma ação de bastidores, hoje a corrida pelo Oscar se tornou uma aula de como promover e engajar um filme para que ele ganhe respaldo - e até torcida - do público. E que em março do ano que vem, tenhamos outro clima de Copa do Mundo com o novo filme de Kleber Mendonça Filho.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 12 de agosto de 2025.