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Aos 80 anos, Ford revive Indiana Jones com paixão

publicado: 04/07/2023 11h09, última modificação: 04/07/2023 11h09
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Ford (E) e Phoebe Waller-Bridge (D) em ‘Indiana Jones e a Relíquia do Destino’ - Foto: Lucas Film/Divulgação

tags: Indiana Jones , Harrison Ford , André Cananéa

por André Cananéa*

Sessão das 21h de uma sexta-feira, em um cinema de shopping na orla de João Pessoa. Uma sala com tecnologia de ponta para exibir um filme de aventura eletrizante, integrante de uma das franquias mais queridas e populares do cinema, com muitas informações históricas (umas reais, outras nem tanto) e personagens para lá de carismáticos, e que acabou de estrear. Não havia mais que 20 pessoas na sala para assistir ao fabuloso Indiana Jones e a Relíquia do Destino, quinto filme da saga do arqueólogo estrelado por Harrison Ford e iniciada em 1980.

Qual é o problema, penso logo de cara. Afinal, testemunhei outros dois “indianas” no cinema, Indiana Jones e a Última Cruzada, em salas lotadas tanto na Filadélfia (EUA), onde vi em junho de 1989, quanto no Cine Municipal, onde revi, um mês depois; e o esquecível Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, que assisti numa tarde de sábado em uma sala cheia, mas não lotada, no Cinépolis, em 2008.

Então se Indiana Jones é sinônimo de bilheteria, de onde vem essa baixa adesão? O público segue sem interesse pelo cinema após se acostumar com a oferta diária de lançamentos e catálogos abundantes de filmes dos serviços domésticos de streaming, ou as aventuras pulp, com muita perseguição e o humor irascível de Indy, deixaram de encantar as plateias, hoje ávidas pelo frenesi inverossímil de filmes como John Wick e O Resgate (cujo segundo longa está bombando na Netflix)?

“Era uma sessão legendada”, arriscou justificar um amigo, meio sem convicção, mas nem de todo errado. Já não é de hoje que as salas dedicam mais de 90% dos seus horários à exibição de filmes dublados, independente do gênero. E as empresas de cinema, o leitor sabe, não arriscam: vai para onde a demanda está.

Qualquer que seja a justificativa, quem não for hoje aos cinemas perderá a chance de assistir a um dos melhores entretenimentos da temporada, um Indiana Jones em grande forma, com elenco disposto, enredo empolgante e, claro, muitos easter eggs para os fãs mais apaixonados pelo arqueólogo, cuja silhueta estampa um chapéu (que dizem ter sido fabricado no Brasil) e seu inseparável chicote.

Relíquia do Destino já começa em plena ação: Indiana Jones (Harrison Ford, rejuvenescido por efeitos de ponta), luta contra nazistas em um trem em movimento. A Segunda Guerra Mundial chegou ao fim (1945) e os alemães, derrotados, pilham obras de arte que encontram pelo caminho.

Entre os objetos está a tal “relíquia do destino”, um artefato construído por Arquimedes na Grécia antiga. Ou pelo menos metade dela. Obsessão do compadre Basil Shaw (Toby Jones), Indy sai em busca da outra metade quando, já em 1969, reencontra a filha de Shaw e afilhada do arqueólogo, Helena (Phoebe Waller-Bridge) – personagem candidata a dar sequência a franquia. É aqui, em meio à volta à Terra da primeira expedição do homem à Lua, que se desenrola a maior parte do filme.

Nessa nova jornada, Indy terá de enfrentar dois inimigos: o cientista Dr. Voller (Mads Mikkelsen) e seus capangas caricatos (como reza a boa cartilha desse tipo de aventura) e a idade. O trunfo deste Indiana Jones e a Relíquia do Destino é justamente encontrar lugar para Harrison Ford interpretar um personagem com idade compatível a do ator – que no próximo dia 13 de julho fará 81 anos – e que, por conta da idade, parece estar deslocado desse mundo moderno de 1969 (uma metáfora para a franquia).

Portanto, entender que o Indiana Jones de 2023 não é o mesmo de 1981, quando o personagem estreou em Os Caçadores da Arca Perdida, ajuda não só a legitimar o novo filme, como dá pano para o enredo questionar o lugar que esse tipo de aventura retrô, ambientada em um passado analógico, sem qualquer tecnologia, sem armamentos mirabolantes (é praticamente um filme “capa-e-espada”) e envolvendo empoeirados fatos históricos. “Ainda somos úteis nos dias de hoje”, questiona o vilão de Relíquia do Destino ao Doutor Jones.

Felizmente, ainda há bastante espaço para esse tipo de aventura. James Mangold assumiu a direção deste quinto filme, depois de Steven Spielberg ter conduzido os outros quatro, e o diretor de Logan, Ford vs. Ferrari e Cop Land: A Cidade dos Tiras consegue manter o belo legado deixado por Spielberg, dirigindo as cenas de ação com a mesma pegada oitentista dos três primeiros filmes, e tendo um Ford idoso, mas completamente disposto a se reaproximar dos melhores momentos do aventureiro, sem fugir da luta e com o velho e ácido humor que fez fama do personagem.

De quebra, a apregoada despedida de Harrison Ford do papel termina com uma belíssima surpresa para os fãs da saga. E vou parar por aqui que acabou de cair um cisco de olho…

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 4 de julho de 2023.