No início deste mês, um artigo do jornal Chicago Tribune viralizou nos grupos de colecionadores de filmes em mídia física. O texto da colunista Nina Metz, datado de 31 de julho passado, faz referência a um estudo da Universidade de Warwick, na Inglaterra, para tentar responder a anotação proposta pela colunista: “A experiência tátil de segurar um DVD nas mãos muda a forma como nos sentimos ao assistir filmes, em vez de rolar incessantemente pelos títulos e nunca clicar em reproduzir?”
A pesquisa dos professores Özgün Atasoy e Carey Morewedge afirma que sim. Citando o estudo, Nina Metz expõe que as pessoas que participaram do estudo atribuem menos valor às versões digitais do que às versões físicas do mesmo filme. “Para muitos de nós, a ‘diferença de valor se resume a sentimentos de propriedade’. DVDs e outros bens físicos não são conceitos abstratos que existem em uma nuvem, mas objetos tangíveis, ‘o que aumenta a sensação de controle e propriedade. Esta propriedade psicológica é um sentimento positivo pelo qual as pessoas estão dispostas a pagar mais’”, registrou a crítica de cinema do Tribune, utilizando aspas da pesquisa.
O leitor bem sabe que as plataformas de streaming, como Netflix, Prime Vídeo, Max, Disney+, Mubi etc. substituíram as boas e velhas locadoras de filmes, e também aniquilaram as sessões de CDs e DVDs de grandes varejistas (quem não lembra do “leve 3, pague 2” da Americanas?). Mas a venda de mídia física ainda sobrevive, inclusive no Brasil: saíram de cena os braços de home vídeo dos grandes estúdios e entraram em cartaz distribuidoras de pequeno e médio porte, que atendem ao mercado de nicho com edições super caprichadas de grandes sucessos do cinema, repletas de análises e informações distribuídas entre comentários em áudio, making of e outros featurettes.
Em seu texto, a colunista do Chicago Tribune se mostra cética quando questiona se, de fato, o comércio de DVDs já foi realmente uma importante fonte de receita para os estúdios, e aponta que, no exterior, redes como a HMV têm registrado o retorno dos clientes às compras de DVD.
“Entre os fatores citados (para a compra da mídia física): uma frustração geral com a entrada e saída de títulos das plataformas de streaming e o aumento regular nos preços das assinaturas. Talvez você também tenha dúvidas sobre a sustentabilidade das plataformas de streaming como negócio no longo prazo. É perfeitamente possível que um ou mais desses serviços acabe simplesmente... entre em colapso”, argumenta.
Mas o melhor registro do texto diz respeito a uma ideia que surgiu a partir da lembrança da Blockbuster, a maior rede de videolocadoras dos Estados Unidos (até a chegada do streaming). Batizada como “Free Blockbuster”, a iniciativa estimula que os americanos, ao invés de jogarem fora seus acervos de DVDs e fitas VHS, depositem-nos nas caixas de jornais recicladas para essa finalidade.
Essas caixas de jornais são aquelas que a gente vê nos filmes de antigamente, em que o cidadão comum colocava uma moeda, abria uma gaveta e retirava um exemplar do jornal do dia. Com o encolhimento das tiragens do jornal impresso, essas caixas ficaram sem serventia, até que um produtor de cinema e TV e ex-funcionário da Blockbuster pintou algumas delas com as cores azul e amarelo da locadora, encheu-as de DVDs e VHS e coloco-as nas ruas, para quem quisesse pegar gratuitamente um ou mais títulos em mídia física e assisti-los em casa.
“É um conceito emprestado da organização Little Free Library, mas para fitas VHS e DVDs”, ponderou Nina Metz, citando aquele tipo de ação que estimula as pessoas a deixar num banco de praça, por exemplo, um livro com a esperança de alguém passar, pegar, ler o livro e deixar outro para que alguém faça o mesmo, gerando uma cadeia de leitores.
Embora seja louvável, acredito que a iniciativa não vingaria no Brasil. O americano comum costuma ver filmes no videogame, cujo console não é tão caro quanto no Brasil. Arrisco a dizer, ainda, que com aparelhos de blu-ray (que tocam também DVD, lembre-se sempre disso) que custam mais de R$ 1 mil hoje (usados dá para encontrar por uns R$ 200, se estiver em ótimo estado), só usufruem de mídia física no Brasil os colecionadores, aqueles que gastam até R$ 300 para ter um exemplar de um filme querido para chamar de seu e que, como todo bom colecionador, não dá, não empresta e nem vende.