No dia 26 de outubro, a música perdeu Jack DeJohnette. Aos 83 anos de idade, o músico faleceu em decorrência de uma insuficiência cardíaca congestiva, e a morte do lendário baterista foi sentida em todo o mundo, sobretudo por fãs de jazz. Afinal, ele foi não apenas uma autoridade absoluta no gênero, mas um pilar importante da vertente moderna do jazz.
O currículo do músico mostra o quanto a carreira dele foi prestigiada: DeJohnettegravou com Miles Davis discos que ajudaram a escrever a cartilha do jazz-rock (como o seminal Bitches Brew, de 1970); era o baterista de Keith Jarrett no celebrado LP Standards Trio e ainda dividiu o palco com gente do naipe de Herbie Hancock, Sonny Rollins, Joe Henderson e John Scofield, entre tantos outros.
O que pouca gente deve saber é que o baterista, nascido em Chicago (EUA) em 9 de agosto de 1942, passou pela Paraíba na década de 1990.
Corria 1996 quando Jack DeJohnette chegou a João Pessoa depois de fazer shows no Rio de Janeiro e em São Paulo. Veio acompanhado pelo pianista Michael Cain e pelo percussionista africano JoakimLartey. Com essa formação, o Jack DeJohnette Trio subiu ao palco do Teatro Paulo Pontes na noite de 16 de abril daquele ano, uma terça-feira.
Um total de 87 pessoas pagou para ver aquele show — acredita-se, entretanto, que o público tenha passado de 120 espectadores. Na quinta-feira seguinte (18), o jornalista Rodrigo Rocha assinou o texto com cobertura da apresentação e uma pequena entrevista com o baterista norte-americano no jornal O Norte: “Jack DeJohnette Trio (...) fez um set curto, tendo parado na metade da apresentação para prestar esclarecimentos à plateia sobre detalhes peculiares de sua música, de sua bateria e curiosidades a respeito de seus colegas de banda”.
A única passagem do lendário músico de jazz pela Paraíba foi promovida pelo Som da Terra, projeto desenvolvido na UFPB pelo professor e jornalista Carmélio Reynaldo, em parceria com a Editora Universitária, durante a gestão do também professor David Fernandes.
O show do Jack DeJohnette Trio acabou sendo o único realizado pelo Som da Terra, que desembolsou R$ 2.500 pelo cachê do trio (com a cotação do dólar na época, de “um para um”, o grupo recebeu US$ 2.500). Mas o projeto rendeu outros frutos que são importantes para a memória musical do estado, como o CD Elas (1996), que reúne faixas interpretadas pelas cantoras Fabíola Lyra, Soraia Bandeira, Mônica Melo e Regina Brown, e o CD de estreia do Quarteto de Trombone, 4 + Uns (1999), além de um livro de partituras do maestro Tom K.
O Som da Terra não faria outro show, mas Carmélio Reynaldo não parou por ali. Naquele mesmo ano, ele se associou ao músico Washington Espínola e ao colega jornalista Ricardo Anísio e, juntos, criaram a Poslúdio Produções — o nome foi extraído da faixa de abertura do CD Washington Espínola, lançado justamente em 1996.
Sob a rubrica da Poslúdio, outro gigante do jazz desembarcou em João Pessoa em 1996 para um show no mesmo Teatro Paulo Pontes, em 11 de junho: o grupo norte-americano Oregon. Formado em 1970, o Oregon fez fama extrapolando as fronteiras do jazz, adicionando música de câmara e folclórica ao som sofisticado do quarteto.
A apresentação do grupo acabou sendo o único show da Poslúdio, mas a produtora estava animada na época. Carmélio me confidenciou que chegaram a negociar um show do lendário Pat Metheny e seu grupo, que não chegou a vingar. “O cachê era razoável, mas o transporte do equipamento demandava o aluguel de um avião de carga de Salvador até João Pessoa, o que encarecia bastante a produção”, justificou.
Quem também entrou no radar da produtora foi a inigualável Betty Carter. “Chegamos a fechar uma apresentação de Betty Carter, mas ela sofreu um acidente quando desembarcou no Rio, fraturou a clavícula e teve de voltar”, comentou Carmélio sobre a diva do jazz norte-americano, que morreu dois anos depois, vítima de câncer no pâncreas.
Lembrei desses shows porque, esta semana, de quinta-feira a sábado, a Paraíba irá receber pela primeira vez o Fest Bossa & Jazz, que já trouxe nomes fantásticos de ambos os gêneros musicais ao Rio Grande do Norte, onde o festival nasceu.
Aqui, o evento acontece na aprazível Bananeiras e, em sua programação, também há um nome lendário, Tony Tornado, e uma atração norte-americana, a cantora Iretta Sanders. Natural de Tunica, no Mississippi, ela promete injetar blues raiz (e autêntico) na programação ao lado do duo brasileiro The Simi Brothers. Não dá para perder!
*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 18 de novembro de 2025.