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Robôs autoconscientes?

publicado: 05/07/2022 12h26, última modificação: 05/07/2022 12h26
'Jinx' - assistente virtual ciumenta e possessiva transforma a vida de seu dono em um inferno.jpg

‘Jexi’: assistente virtual possessiva transforma a vida de seu dono em um inferno - Foto: Foto: Amazon Prime/Divulgação

por André Cananéa*

Faz aproximadamente três semanas que o mundo soube que a empresa Google havia afastado um de seus engenheiros, pois este andou espalhando aos quatro ventos que a inteligência artificial da empresa, a LaMDA, era “autoconsciente”, ou seja, possuía um juízo próprio, uma “alma”. Esse papo, claro, atiçou os fãs de ficção científica, como eu.

Não é de hoje que a literatura, o cinema e os jogos de videogame tratam da relação entre humanos e máquinas com a tal “autoconsciência”. Aliás, faz bastante tempo. Afinal, Metropolis, uma das primeiras obras a abordar o tema, é de 1927. O clássico alemão de Fritz Lang se passa no imaginado ano 2000, em que uma classe operária sofrida trabalha para manter as regalias dos ricos (imaginado?). No meio dos extremos, está Maria, um androide que desperta tanto fúria, quanto paixão.

Aliás, quase 100 anos depois, quase todo tipo de abordagem sobre inteligências artificiais autoconscientes já foi praticamente feita no cinema: há os robôs que querem dizimar a humanidade (vide Exterminador do Futuro e Eu, Robô, este inspirado no texto de Isaac Asimov), até homem apaixonado por uma “voz” proveniente de um dispositivo eletrônico (caso de Ela, de Spike Jonze, numa evolução artística e tecnológica de Metropolis).

E, claro, tem aquela linha de narrativa do “meu robô, meu amigo”, que vai da animação Os Jetsons (quem não lembra da prestativa Rosie?!) até o cativante O Homem Bicentenário e A.I.: Inteligência Artificial, passando por uma série de animações fofinhas (Wall-e, Robôs, Operação Big Hero e o recente Ron Bugado) e outras nem tanto (Love, Death & Robots).

Dois dos meus títulos favoritos sobre o assunto são Blade Runner: O Caçador de Androides, obra-prima de Ridley Scott que acaba de fazer 40 anos, e o seriado Westworld, que já vai em sua quarta temporada (e a bem da verdade, é inspirado em um filme homônimo, de 1973). Ambos disponíveis no HBO Max, mostram autômatos tão desenvolvidos que se confundem facilmente com humanos.

Mas o fato é que hoje, 2022, muito do que se criou no passado sobre o universo dos acessórios tecnológicos, passamos a usar de uma maneira tão rotineira que nem mais percebemos como algo “do outro mundo”, vide uma mera chamada de vídeo, que 2001 - Uma Odisseia no Espaço imaginou há mais de 50 anos, quando a ligação telefônica convencional mal atendia nossas necessidades.

Aliás, quando o assunto do engenheiro do Google veio à tona, 2001 foi um dos títulos mais lembrados, sobretudo pela presença do HAL 9000, uma inteligência artificial, esta sim, autoconsciente, que acaba por sabotar uma missão espacial composta por humanos. Inovador, o clássico de Stanley Kubrick antecipou as relações que temos hoje com os assistentes virtuais, tipo Alexa, Siri e Google Assistente.

Assim como o HAL e sua “neta”, Samantha (do citado Ela), esses dispositivos nada mais são do que uma voz que interage conosco, humanos, mas que nada têm de autônomas, ou possuem consciência própria. Gadgets como Alexa, que além de aparelhos como Echo Dot, está presente em TVs e carros, nada mais são do que versões vocalizadas de aplicativos que nos servem no dia a dia, como mapas, lojas e, sobretudo, os apps de busca, como o próprio Google.

Então por mais que os desenvolvedores digam que esses assistentes “aprendem” conosco, não significa que eles se tornarão PhD em alguma coisa, mas, sim, que possuem uma ferramenta para dinamizar respostas, já que é tudo em função dos algoritmos que estão na nuvem, mesmo sistema, por exemplo, que “aprende” o gosto de um assinante do Netflix, se ele prefere mais filmes de ação, comédia ou drama, baseado nos títulos que ele assiste no catálogo.

E embora a ciência e a tecnologia caminhem para criarem “replicantes” como os de Blade Runner para nos servirem, eles estão bem longe, mas beeem longe mesmo, de serem os robôs de Mãe x Androides (Netflix). Caso contrário, se existissem assistentes virtuais com vontade própria, como a Jexi (do filme Jexi – Um Celular Sem Filtro, comédia escrachada disponível no Amazon Prime), que se torna ciumenta e possessiva, a vida de muita gente seria um completo inferno, um apocalipse tecnológico individual. Portanto, que elas permaneçam apenas máquinas.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 5 de julho de 2022.