Então Juliette Freire é a nova namoradinha do Brasil. E isso diz muito a respeito do Brasil de 2021. O posto já foi ocupado por Regina Duarte quando a atriz se tornou o nome mais relevante na teledramaturgia nacional ao protagonizar papéis importantes na televisão brasileira entre o final dos anos 1970 e 1980, época em que estrelou a série feminista Malu Mulher e deu vida à inesquecível Viúva Porcina, de Roque Santeiro.
Conversando com a querida colega Nara Valusca, aqui da equipe do Jornal A União, procurei refletir sobre o significado de Juliette ter se tornado a nova namoradinha deste país – bola cantada pela própria Nara, inclusive – e o fato mais à superfície dessa avaliação é que a teledramaturgia, pelo menos na Globo, que construiu uma bela história nessa seara, está (quase) morta e enterrada, e a pá de cal fora mesmo a pandemia da covid-19, que interrompeu as gravações, levando a emissora a lançar mão de uma série de reprises de algumas de suas novelas (recentemente, via redes sociais, a Globo sinalizou que retomar o fôlego nas produções inéditas).
Não sou um especialista em teledramaturgia, mas li algumas coisas bastante significativas e que casam direitinho com o sucesso que foi o BBB deste ano: antes mesmo da pandemia, as reprises das novelas estavam dando mais audiência que os títulos inéditos que a Globo colocava no ar. Para fins de comparação, leio que Fina Estampa, exibida originalmente há 10 anos e colocada ao ar em março de 2020 para tapar o buraco deixado pela interrupção das gravações das novelas, teve mais audiência (média de 33.6 pontos medidos pelo Ibope) que a reta final de Amor de Mãe (cuja média ficou em 31 pontos).
Para o leitor ter uma ideia, vejo na Folha de S.Paulo que a final do BBB, que consagrou nossa conterrânea Juliette como vencedora, alcançou uma média de 34,1 pontos, cada ponto equivalente a 268.278 domicílios. Foi a melhor audiência do programa desde 2010.
Especialistas dão conta que o brasileiro tem saudade dos novelões de antigamente, repletos de sofrência, mas também humor e personagens complexos, o que prova o sucesso recorrente das reprises. A nostalgia, pelo que falam, consegue transpor até a concorrência de serviços de streaming, como Netflix e Amazon Prime, com seus catálogos de títulos cada vez mais globalizados.
É fato: os folhetins de antigamente tinham um texto mais apaixonado – contra os aparentemente burocráticos hoje, pelo menos é o que vejo à distância –, redatores mais tarimbados e um elenco mais afiado, que marcaram época ao levar para a casa do brasileiro comum, do drama de uma mãe que abre mão de um filho em lugar do outro (vide Por Amor) até uma vilã do quilate de Carminha (Adriana Esteves) em Avenida Brasil. Esse era o tempero que mais do que fazer o Brasil grudar na tela, fazia o país vibrar, contra ou a favor.
O BBB21, levado ao ar este ano, ocupou esse vácuo de novelas com pouca “sustância”. Levantou debates a respeito de preconceito e empoderamento e, de quebra, promoveu a guerreira Juliette, paraibana arretada que deu a volta por cima depois de tantos “cancelamentos”.
Sábado passado, a maquiadora campinense fez sua primeira live no Instagram, rede social onde é rainha, e atraiu nada menos que um milhão de fãs. Interagiu com eles e disse que irá tocar, por conta própria, sua carreira. Carreira? Como atriz? Cantora? Ou influenciadora digital? Se optar por este último, ela terá uma grande missão frente aos seus mais de 25 milhões de seguidores: ser, efetivamente, uma influenciadora!
Há uma corrente – puxada, entre outras pessoas, pela atriz Samantha Schmütz, que fez fama, ao lado de Paulo Gustavo, no humorístico Sai de Baixo - que exige dos ditos digital influencers que sejam, de fato, influenciadores. Samantha lançou sua crítica logo após a morte do colega, no último dia 4 de maio, cobrando da turma que têm milhares de seguidores uma postura frente à pandemia e os cuidados necessários para evitar a propagação da covid-19, doença que silenciou a alegria de Paulo Gustavo.
Samantha Schmütz chegou a rebater uma fala da influenciadora Gabriela Pugliesi, que ao publicar uma postagem homenageando o humorista, afirmou que a morte de Paulo Gustato foi “a vontade de Deus”. “Tivemos várias oportunidades antes de ser ‘vontade de Deus’”, rebateu a atriz, referindo-se à falta de ação do governo Bolsonaro.
Juliette ganhou fãs, admiradores e, sobretudo, seguidores pelas posturas que demonstrou durante seu confinamento no BBB21. Tem tudo para ser, de fato, a influenciadora que o Brasil precisa. Se fizer ao contrário, irá sumir em meio a fotinhas transadas de modelitos, postagens patrocinadas e tutoriais de make, como milhares de outras. Se corresponder ao “namoro” com o Brasil, seus 15 minutos de fama irão longe.
*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 18 de maio de 2021.