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Um Oscar 2021 já tem dono

publicado: 05/01/2021 14h55, última modificação: 05/02/2021 10h48
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Pelo menos um Oscar 2021 já tem dono: o de Melhor Ator para Chadwick Boseman. Sua performance em A Voz Suprema do Blues (disponível na Netflix desde dezembro) há de ser lembrada pela academia no dia 25 de abril, quando sair o resultado da premiação mais famosa do cinema (em função da pandemia, a data foi adiada de fevereiro para abril) – lembrando que os indicados ainda serão anunciados em março.

A Voz Suprema do Blues (Ma Rainey’s Black Bottom, no original) é baseado em uma peça de teatro de 1982 que retrata um dia na vida de Ma Rainey, cantora que, de fato, existiu e entrou para a história como uma das primeiras cantoras negras de blues a ter uma carreira profissional e a gravar discos na América.

O filme de George C. Wolfe (diretor de Um Momento Pode Mudar Tudo, com Hilary Swank) refaz o espetáculo com um elenco enxuto e praticamente uma única locação, além de preservar diálogos que parecem ter sido extraídos diretamente da peça escrita pelo dramaturgo August Wilson (1945-2005), vencedor de dois prêmios Pulitzer de Teatro pela série de dez peças que escreveu sobre a experiência dos afro-americanos ao longo do século 20.

Aliás, A Voz Suprema do Blues é a segunda adaptação para o cinema dessa série de peças (conhecida como The Pittsburgh Cycle). A primeira foi Um Limite Entre Nós (2016) e ambas foram produzidas por Denzel Washington, que em 2015 externou sua vontade de levar às telas todos os dez espetáculos escritos por Wilson.

Ambientado na Chicago dos anos 1920, 95% da história se passa dentro de um estúdio de gravação, onde Ma Rainey (a sempre extraordinária Viola Davis, que ganhara um Oscar de Atriz Coadjuvante justamente com Um Limite Entre Nós) e seus músicos irão gravar algumas canções.

Chadwick Boseman interpreta Levee, solista do quarteto que acompanha a estrela. Vaidoso, libidinoso e autoconfiante, Levee é uma montanha-russa de emoções, prato cheio para Boseman mostrar intensidade em um papel que se tornaria o canto do cisne do ator que morreu precocemente em agosto do ano passado, aos 42 anos, em decorrência de um câncer colorretal, doença que escondeu muito bem dos holofotes da mídia.

A Voz Suprema do Blues parece aqueles filmes feitos para prêmio, e que valorizam o trabalho de ator. O tempo inteiro, o enredo levanta a bola para Boseman cortar. Sem sombra de dúvidas, foi um filme feito para ele brilhar em um roteiro no qual a música é apenas a desculpa: no centro da discussão está o racismo e as dificuldades de ser negro na América do início do século 20.

Integrante da prestigiada lista de melhores filmes vistos pelo ex-presidente Barack Obama ao longo de 2020 (da qual faz parte o brasileiro Bacurau), a voz que fala alto no longa-metragem não é da Ma Rainey, mas de um basta no racismo, uma luta que, infelizmente, 100 anos depois segue oprimindo, massacrando e, como visto em 2020, até matando.

 

*coluna publicada originalmente na edição impressa de 05 de janeiro de 2021.