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Videolocadoras de João Pessoa (parte 1)

publicado: 30/05/2023 10h54, última modificação: 30/05/2023 10h57
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A década de 1990 foi a “Era de Ouro” das locadoras na capital paraibana - Foto: Arquivo União

tags: videolocadoras , André Cananéa

por André Cananéa*

Passei boa parte da minha vida em videolocadoras. Me sinto privilegiado, ante as novas gerações, por ter frequentado aqueles espaços nobres, repletos de filmes, atendentes dispostos a conversar sobre cinema e onde conheci pessoas comuns, do dia a dia, que faziam da ida à locadora, e do aluguel de um pacote de filmes, um lazer rico em arte, cultura e entretenimento. Nesse ambiente, fiz amizades que guardo até hoje.

Netflix, Prime Video, HBO Max etc. nunca me deram um amigo. Aliás, sequer me apresentaram alguém. Pior: não me ensinaram nada sobre cinema italiano, ou expressionismo alemão, ou ainda que Hitchcock é o maior mestre do cinema. O assinante que luta com aquelas sinopses insossas para chegar a um filme que tenha a relevância de formar um amante do cinema “raiz”, não um pseudo cinéfilo fanfarrão que acha que ver filme é dobrar a velocidade da exibição.

Portanto, devo todo meu conhecimento de cinema a essa universidade chamada viodeolocadora.

E estive lá desde o início. Como tenho na lembrança a marca que Caça-Fantasmas (1984) – a irresistível comédia “terrir” de Ivan Reitman – foi o primeiro filme que vi no chamado home video, e que ele não demorava a estar disponível na velha fita VHS, então tinha por volta de nove ou 10 anos quando pisei na Cine Vídeo pela primeira vez na vida, onde meus tios alugaram a fita.

A Cine Vídeo era um cineclube que dividia com a loja de equipamentos eletrônicos Center Som o imóvel de nº 41 da av. Maximiano Figueiredo, ali próximo à Praça da Independência. Estudando no Marista Pio X, tive a chance de frequentar o lugar até o início dos anos 1990, quando fechou as portas.

Quando surgiu, a Center Vídeo não tinha a metodologia de mercado praticaria no futuro, da locação do filme avulso. Como clube, pagava-se uma “joia” para se associar e uma mensalidade para ter direito a retirar um determinado número de filmes por semana, com o compromisso de devolvê-lo em alguns dias e renovar o direito de retirar outros.

Para este artigo, procurei o antigo proprietário, o sempre gentil e solicito Aurélio Gusmão. Aurélio não lembrava o valor da joia, mas contou uma história hilária: disse que uma figura da alta sociedade pessoense naqueles anos 1980 queria tanto entrar para a Cine Vídeo que ofereceu um novilho em troca da joia. “Ele conseguiu sua inscrição no clube, mas eu nunca fui buscar o novilho”, recordou o antigo proprietário da Center Vídeo, entre risos.

Aurélio desfez uma lembrança distorcida que eu tinha a respeito das videolocadoras: para mim, a Cine Vídeo havia sido a primeira do ramo na capital, mas a primeira foi a Videoclube da Cidade, franquia que teve início por São Paulo e Rio de Janeiro, chegou ao Recife e, em seguida, a João Pessoa, instalada aqui pelo próprio Aurélio Gusmão.

“Foi o representante da Gradiente (marca de eletrônicos muito popular na época), o meu amigo/irmão Francisco Claudio Moraes Moreira, quem me apresentou a Videoclube da Cidade para João Pessoa. Isso foi em 1981… fiquei na franquia até 1983, ou 1984, quando resolvi criar a Cine Vídeo”, contou.

Uns dois ou três anos depois de ter descoberto o maravilhoso mundo das videolocadoras, meu pai comprou um videocassete e começou a nossa jornada pelas locadoras da cidade. Vivíamos a febre no VHS e, além da Center Vídeo, lembro-me de, já no início da adolescência, frequentar a Comvídeo na av. Princesa Isabel (acredito que a locadora tenha sido anterior à famosa produtora de vídeos) e a Raiff Vídeo e a Cinevídeo, ambas vizinhas numa galeria que circula o casarão de número 242 da Visconde de Pelotas (nas imediações do antigo Plaza).

Havia uma outra, na Lagoa, que não me recordo o nome (onde meu pai alugou Contatos Imediatos do Terceiro Grau para me apresentar esta obra-prima sci-fi de Spielberg), e Audaci Junior, o editor do nosso caderno Cultura, me disse que frequentava a Videoclipe, que ficava ali, nas imediações das avenidas Santo Elias e Dom Pedro I.

É curioso notar como, ainda nos anos 1980, antes do primeiro grande shopping ser construído, as atividades comerciais estavam fortemente instaladas no Centro de João Pessoa. Conversei com vários amigos, de bairros tão distantes quanto Tambaú e o então recém-erguido Valentina Figueiredo, que me contaram que iam até o centro só para alugar filmes.

Claro que naquele início dos anos 1990, já havia uma movimentação em direção à praia. Se não me falha a memória, acredito que no antigo Ricky Center (em frente a onde hoje é a agência da Caixa Econômica, na av. Epitácio Pessoa), havia uma locadora também pioneira no ramo. Só depois, então, viria uma outra locadora muito marcante na Epitácio, a Rex Vídeo, do comunicador Sales Dantas. Acredito, até, que a Rex seja contemporânea das primeiras locadoras da praia.

Por essa época, outras três videolocadoras entraram no nosso roteiro de fim de semana: a Love Vídeo, no Centro (muitos a conhecem como a “Casa Rosa”, na Lagoa, mas esse foi o segundo endereço dela); a Zoom Vídeo, em Tambaú, e a Red Fox Vídeo, que surgiu na rua João Bernardo de Albuquerque (braço que une a Epitácio Pessoa à Praça da Independência). Mas dessas três, eu vou falar na coluna da próxima semana, assim como sobre um capítulo importantíssimo da história das videolocadoras de João Pessoa: a Rede Filmes.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 30 de maio de 2023.