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Resenha

“O Senhor das Moscas” no espaço

publicado: 21/08/2024 09h30, última modificação: 21/08/2024 09h30
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Com uma arte bastante detalhada, “Leviathan” explora a natureza humana frente aos extremos | Imagens: Divulgação/JBC

por Audaci Junior*

Um grupo de garotos obrigatoriamente tem que se unir para formar uma pequena sociedade após eles se encontrarem perdidos em uma ilha desabitada. Ou fazem funcionar essa coletividade no tubo de ensaio de suas vidas sem tanta experiência e traquejo social assim ou cedem aos seus instintos mais primitivos — enfrentando, durante o processo, os mais variados dilemas existenciais e morais.

Esse é o mote de O Senhor das Moscas, o romance mais famoso do escritor inglês William Golding (1911-1993), Prêmio Nobel em 1983.

Todo esse preâmbulo foi para traçar um paralelo com uma história em quadrinhos chamada de Leviathan (JBC, 200 páginas), de Shiro Kuroi, que foi lançada recentemente no Brasil.

Troque uma região remota do Oceano Pacífico pela imensidão remotamente ainda maior: o espaço. Agora mude o grupo de sobreviventes pré-adolescente que escapava da Segunda Guerra Mundial para um grupo de sobreviventes pré-adolescente após uma improvável “chuva de meteoros” na viagem espacial de excursão escolar para a já colonizada estrela Proxima Centauri. Nenhum adulto sobrevive ao impacto.

Na história em quadrinhos, não é quem segura uma concha que detém a vez de se expressar, mas é quem tem a informação de outro tipo de “concha” é que poderá sobreviver.

Na situação, há um tempo determinado da gigantesca nave, denominada de Leviathan, acabar a sua viagem e chegar, enfim, à civilização. Porém, com as avarias estruturais, o oxigênio vai acabar antes desse tempo.

A única esperança reside em uma antiga câmara criogênica, que colocaria o corpo em suspensão, pouparia o oxigênio e garantiria a vida de quem a usasse. Novamente, mais um “porém”: só há um desses “casulos” na nave.

Tais adversidades em meio a uma “luta cega” pela sobrevivência pode afastar Leviathan do clássico de sir Golding, mas não ficará a anos-luz de distância, principalmente com o final de seu primeiro volume (ainda haverá a publicação de mais duas partes para concluir a saga).

A obra de Shiro Kuroi também fez um percurso bastante incomum, assim como a trajetória da nave de mesmo nome. Leviathan é um mangá (como é denominado os quadrinhos japoneses) que não foi lançada originalmente em terras nipônicas. Em 2022, ela foi publicada pela primeira vez na França, país que comporta uma grande invasão do gênero asiático na Europa, rivalizando com as todo-poderosas bandes dessinées franco-belgas, que também vendem na casa de milhões de exemplares.

Só depois que a HQ ganhou as páginas da plataforma Shonen Jump+, da editora japonesa Shueisha.

Com destaque para a arte extremamente detalhada e cheia de hachuras de Kuroi, o gibi carrega no suspense por começar com a nave destruída já à deriva no espaço, na qual um grupo de saqueadores encontra o diário de um dos estudantes.

Leviathan é uma ficção científica que explora as profundezas da natureza humana. Assim como em uma certa ilha isolada com “garotos perdidos”.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa no dia 21 de agosto de 2024.