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A morte e a morte do jornalismo televisivo

publicado: 28/01/2016 12h13, última modificação: 28/01/2016 12h13


Felipe Gesteira

O jornalismo na TV começou a morrer desde a década de 1980, com a imposição do ‘padrão Globo’ sobre a imagem dos repórteres. Jornalistas em formação estudam isso nas disciplinas de telejornalismo. Rostos padronizados, entonações semelhantes, pontos de vista idênticos entre emissoras concorrentes, todas fazendo da mesma receita de bolo como se informação fosse um produto exato.

Equações matemáticas não definem que o repórter precisa ser magro; que a pele deve estar bem cuidada, e se for clara, ótimo; barba? melhor não. Isso criou até os anos 2000 um processo de padronização absurdo. Dizia-se, nas redações, que a imagem do repórter não deveria chamar mais atenção que a notícia, e isso forçava a busca por corpos finos, rostos lisos e homens e mulheres com aspecto um tanto próximo. O cabelo curto para elas e a cara lisa para eles remetia a uma aparência quase andrógina.

Os defensores desse modelo podem até citar exemplos de repórteres negros na tela, mas eram exceção, e mesmo assim o padrão fazia questão de podar a beleza deles com agressões aos cabelos, por exemplo, que deveriam ou ser curtíssimos, ou quimicamente modificados para atingir o ‘padrão’.

Mas se a diversidade está por toda parte, se vemos no nosso cotidiano mais negros que brancos, se tantas são as cores e os tipos de barbas, cabelos e penteados, por que um repórter que assumisse a aparência de pessoa comum iria chamar tanta atenção a ponto de desviar o telespectador da notícia? Conversa fiada.

Fato é que mesmo com suas exceções na imprensa nacional, esse tipo de padrão midiático impôs uma geração inteira de repórteres visualmente polidos espalhados pelas afiliadas das redes de TV do país. Só recentemente o império do padrão começou a ruir, mas o culto à beleza persiste.

E aí começa a segunda morte do telejornalismo. Pode ter barba? Agora pode, contanto que esteja bem aparada. Pode ser gordo? Um pouco. Pode ter cabelão? Se for bonito/exótico/descolado, pode sim! Descobriram que a diversidade brasileira é bela, mas não tratam disso com naturalidade, fazem questão de destacá-la.

Matéria-prima para a informação como produto a ser vendido no meio jornalístico ainda é o texto, que continua sendo deixado de lado. Várias empresas têm dado espaço ao improviso, reflexo de jornalistas relativamente jovens, pouca experiência e muita opinião superficial. Cobram lisura das autoridades e praticam pequenas corrupções. Isso sem mencionar o jornalismo policial na TV, que em sua maioria é lixo puro.

Os jornalistas mais experientes vão para os bastidores, e estes é que são bons para as entradas ao vivo, comentários opinativos, por sua bagagem adquirida com os anos de profissão. Ao mesmo tempo, quando um jovem muito qualificado é contratado, em vez de destacar seu preparo, sua visão política, seu texto diferenciado, preferem ressaltar a beleza do profissional. Só o texto vai trazer de volta o jornalismo à batalha contra o entretenimento, porque com as pautas modinha e o foco em coisas menores no lugar da reportagem, é mesmo mais vantagem sair do telejornal e assistir a uma série no Netflix.