por Felipe Gesteira*
Quanta emoção cabe dentro de cinco minutos? Foi preciso 1/12 de hora para que o Vitória marcasse dois gols e mudasse a história da partida contra o Rio Branco, garantindo vaga para a fase seguinte da Copa do Brasil; Joálisson demorou esse mesmo tempo a mais no banho e perdeu a prova do Enem; em cinco minutos Robert Lewandowski marcou três para o Bayern de Munique; Camila e Henrique se beijaram pela primeira vez por cinco minutos, no meio do caminho, com avidez e carinho, pelo tempo que tinham para aquele dia; Em 5 minutos o Palmeiras atropelou o Ceará com três gols, sacramentando a história do jogo; a soneca de Patrícia no despertador do telefone celular dura ciclos de só mais cinco minutinhos.
Carlinhos era chamado pelos amigos de “jogador de 5 minutos”. Uma alcunha deveras injusta para quem estava fora do time e não sabia da realidade dentro do campo. Ele entrava aos 40 do segundo tempo com a missão de sacudir a partida. E conseguia.
A torcida ia ao delírio sempre que o ponta começava a aquecer na beira do gramado. Aos 35 minutos, se o jogo estivesse empatado e durante o seu aquecimento a equipe conseguisse marcar um gol, prontamente o técnico mandava Carlinhos voltar para o banco.
Essa sistemática reserva de apenas cinco minutos para o suposto craque era motivo de revolta da torcida e questionamentos por parte de diretores do clube e da imprensa especializada. “Por que não experimentar uma formação na qual o jogador se encaixe?”, perguntavam os comentaristas esportivos. Os cartolas não sabiam como lucrar com a venda de um atleta que só jogava uns minutinhos muito bem contados. Na arquibancada, tinha grito de guerra: “Professor, deixa de ser fuleira, Carlinhos é pra partida inteira!”.
No entanto, havia um segredo juramentado dentro do vestiário. Um pacto entre jogadores e comissão técnica. O que ninguém de fora imaginava era que na verdade Carlinhos não sabia jogar bola.
A pobreza afastou o sonho olímpico do menino que queria ser corredor. Carlinhos praticava atletismo, treinava para provas de 200m. Sem incentivo, ficou difícil seguir com a rotina de atleta quando o pai perdeu o emprego. Seu tio, amigo de um primo do sobrinho de um dos diretores do clube pessoense, conseguiu um teste. Com jeito de jogador, marra de jogador e até rede social na linha de jogador de futebol, além da forma física impecável, Carlinhos conseguiu a vaga no time por um salário mínimo. Foi o suficiente para cobrir as despesas de casa, apesar da alta nos preços da feira, da luz e do gás.
Na partida contra o Santa Cruz de Santa Rita, o Auto Esporte perdia por 2 a 0. Era inimaginável até para o mais ferrenho torcedor alvirrubro que o jogador pudesse mudar a história do confronto.
O treinador adversário já tinha feito suas três substituições, nem podia mais colocar em campo um defensor descansado. O que fez foi recuar o meia e puxar seu volante para que virasse um zagueiro a mais.
Como de costume, Carlinhos entrou aos 40 do segundo tempo. O time sabia muito bem o que fazer nas jogadas ensaiadas. Cada explosão do ponta deixava os adversários em condição de desespero, não conseguiam sequer puxar o ar pra respirar direito. Eram dois para marcar Carlinhos e ambos nem mesmo o alcançavam na corrida.
Duas jogadas, dois gols. O meia de criação segurava a bola enquanto Carlinhos disparava num falso corta-luz, atraindo a atenção da zaga e deixando o centroavante sozinho para marcar. Na terceira tentativa, o time de Santa Rita percebeu a armação e evitou a virada.
O empate com gosto de vitória serviu para comprovar que há felicidade até dentro de um segredo bem guardado.