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Crise é desculpa para os passaralhos

publicado: 04/02/2016 03h00, última modificação: 03/02/2016 20h47


Felipe Gesteira

Tem alguns anos que a recessão econômica vem batendo na porta dos brasileiros, e a cada ano a situação se complica mais. Somada à crise dos jornais, que enfrentam um período complicado de transição em seu modelo de negócio, temos um panorama gravíssimo para os jornalistas. Passaralhos e mais passaralhos, ou demissões em massa nas redações. Um cenário que só piora.

Profissionais que dedicaram anos de suas vidas às empresas são descartados como móveis que não servem mais, enquanto os empresários ampliam seus negócios, investimentos, e colocam a culpa dos cortes na crise. A crise existe, não negamos, mas e os cortes, são necessários? Em muitos casos as vagas não são preenchidas, simplesmente deixam de existir, o que termina por sobrecarregar quem fica na empresa.

A cena se repete na redações de todo o Brasil. Os sindicatos não se movem, os colegas se revoltam silenciosamente, muitos com medo de compor a próxima lista de corte. É preciso salvar seu emprego, pensam. Entendo o lado de cada um, mas digo que se não questionarmos alguns pontos, em breve não teremos quem nos defenda.

Sabe aquela cantilena do aumento das passagens de ônibus? Pois bem, é a mesma em todas as capitais do país. As empresas de ônibus alegam que as despesas aumentaram, elas querem que a passagem suba a um valor X. Em seguida divulgam que o valor ideal é X+2, e que abaixo disso é impossível operar. O prefeito, com seu poder de aprovar ou não, libera o aumento posando de herói, dizendo que não deu o valor que as empresas pediram, X+2, e que a passagem será reajustada até X, que era mesmo o valor que as empresas queriam inicialmente. E nessa dança ensaiada do poder público com empresários que dispõem de concessões públicas, ninguém questiona quanto eles estão lucrando.

Na comunicação funciona da mesma forma, com a diferença que o rombo da falta de jornalistas não afeta diretamente o bolso das pessoas. A crise na imprensa ataca a qualidade da informação, o que só prejudica a sociedade civil como um todo. Vale lembrar que não são apenas os jornais impressos que estão demitindo, os passaralhos assombram rádios e TVs. E mesmo que fossem apenas os diários, estes em sua maioria são integrados a grupos maiores de comunicação (pools), com rádios, TVs e portais.

O que isso tem a ver com as passagens de ônibus? É que as grandes empresas de comunicação detêm concessões públicas. E qual o faturamento anual delas? Não sabemos, mas deveríamos. Alegam que os anunciantes estão sumindo, que as vacas estão magras, será? Se há transparência nos gastos do governo, e estas mesmas empresas cobram tanto a necessária lisura na gestão pública, por que então os lucros nas concessões são de caráter privado, já que tratam de produto de interesse público?

É preciso confrontar, saber quanto eles faturam. Não adianta falar em crise, crise, crise, enquanto os lucros são obscuros. Os sindicatos devem pressionar, e os profissionais, somente unidos podem superar a verdadeira crise, implacável com empregados e misteriosa com os patrões.