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Dignidade acima dos resultados

publicado: 19/05/2023 14h38, última modificação: 19/05/2023 14h38

por Felipe Gesteira*

Não existe editoria em um veículo de mídia que seja mais importante que outra. O que existe é consumo e interesse social. Do lado de quem trabalha com as informações, deve sempre existir o compromisso com a verdade, pautado pela ética. Se a história a ser contada é de política, economia, esportes, e há pessoas interessadas em consumir aquele tipo de notícia, ela é de alguma forma relevante.

É grande a responsabilidade da imprensa esportiva. O repórter que vai a uma entrevista coletiva ao final de uma partida busca levar informação ao torcedor. No caso da pauta em esportes, informação se mistura a entretenimento. Não custa lembrar que há vidas em jogo no esporte, e quando se ataca um profissional em decorrência do seu trabalho, as vidas em torno dele são atingidas.

Costumo comparar o jornalismo esportivo com o cultural. Não do ponto de vista de quem consome, mas do lado de quem faz a notícia, principalmente a crítica. Tanto na cultura como nos esportes há críticos que para mostrar a relevância do seu trabalho na imprensa, buscam aparecer sempre diminuindo o feito do artista ou atleta. É como se consumissem o produto em primeira mão, mas sempre com um mau gosto encravado na boca que faz com que repassem seu ponto de vista aos leitores e espectadores com algum defeito, tornando sua visão de donos da razão como a absoluta, acima dos outros.

Quando um jornalista vai como uma hiena para abordar uma figura pública na intenção de deixá-lo constrangido, ou depreciar seu trabalho, todos saem perdendo. Recentemente, dois episódios ocorridos em coletivas de imprensa chamaram atenção do mundo para a importância do respeito ao trabalho dos atletas.

Giannis Antetokounmpo, jogador do Milwaukee Bucks, rebateu um jornalista com veemência ao ser questionado sobre fracasso na coletiva após a derrota para o Miami Heat, pela NBA, principal liga do basquete norte-americano. “Você recebe uma promoção todo ano no seu trabalho? Não, certo? Então todo o ano do seu trabalho é um fracasso? Sim ou não? Não. Todo ano você trabalha para algo, algum objetivo, que pode ser ganhar uma promoção, cuidar da sua família, não sei, prover o que eles precisam ou cuidar dos seus pais. Você trabalha por um objetivo. Não é fracasso. São passos para o sucesso”.

Em outro trecho, ele citou o maior jogador de todos os tempos.  “Michael Jordan jogou 15 anos na NBA e ganhou 6 títulos. Os outros 9 anos foram um fracasso? É isso que está me dizendo? Não existe fracasso nos esportes. Existem dias bons e dias ruins. Alguns dias você alcança o sucesso e em outros não. Às vezes é a sua vez e às vezes não. O esporte é assim, você não ganha sempre. Outras pessoas também vão ganhar”, disse.

No Brasil, uma entrevista do técnico do Botafogo, Luís Castro, também ficou famosa pelo viés social. “A minha vida não é só resultados. Para mim a vida é trabalho com dignidade, e isso deve se sobrepor aos resultados, por mais que se queira colar os resultados às vidas das pessoas. Só quem tem dinheiro que tem direito a viver? Eu que nasci sem capacidade financeira não tenho direito a viver, tenho que ficar encostado no canto? Não, amigos. Para mim é o trabalho com dignidade e honestidade intelectual que conta”, afirmou o treinador.

Uso os dois exemplos acima para lembrar adiante de um conhecido dos paraibanos. Antes, um adendo: tenho como referência dois profissionais na imprensa esportiva paraibana pela serenidade quando é preciso apontar alguma questão sobre um atleta. O primeiro é Expedito Madruga, que tive como professor, e o segundo é exatamente o editor deste caderno, Geraldo Varela, com quem trabalhei e muito também aprendi.

O atleta em questão é Tiquinho Soares. Quando atuou no futebol paraibano, muitos radialistas e jovens jornalistas o criticaram duramente. Hoje, homem-gol do Botafogo, obriga os críticos malsucedidos a reconhecerem seu sucesso. Uma coisa é o que se diz fora dos holofotes, em mesa de bar, como torcedor. Outra é o que se diz na imprensa e pode afetar a vida de uma pessoa. Aos críticos mais fervorosos, que não se controlam e só sabem emitir opinião se puderem apontar um defeito, recomendo ponderação e serenidade, pois o trabalho sempre deve ser respeitado.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 19 de maio de 2023.