Notícias

#158 Toda garota quer ser um pouco de Wandinha

publicado: 14/12/2022 00h00, última modificação: 14/12/2022 08h57
wandinha netflix.png

Jenna Ortega apresenta uma Wandinha completa: niilista, gótica e sarcástica - Foto: Foto: Netflix/Divulgação

tags: wandinha , netflix , wednesday , jenna ortega

por Gi Ismael*

Tropeço, Mãozinha, Gomez, Mortícia, Feioso, Wandinha e Tio Chico: a volta dos que não foram! Se depois de A Família Addams (1998) o macabro núcleo familiar mais querido do mundo teve um momento em que sua popularidade foi às alturas, essa hora chegou no finalzinho de 2022. Indicada ao Globo de Ouro de Melhor Série de TV, Musical ou Comédia, a recordista de audiência Wandinha atravessou gerações com uma trama teen, uma protagonista perfeita e um mistério divertido.

A série, como você provavelmente sabe, é focada na filha mais velha dos Addams, a sombria Wandinha. A personagem foi escrita em 1930, quando Charles Addams lançou as tirinhas A Família Addams no jornal The New Yorker. O quadrinho surgiu como uma sátira à aristocracia, trazendo de forma divertida e inusitada a ostentação numa família do submundo, onde mãos decepadas, “frankensteins” e outras criaturas viviam inocentemente entre pessoas “normais”.

Quando surgiu o burburinho de que Tim Burton dirigiria a personagem já vivida com excelência por Christina Ricci, a expectativa cresceu significativamente. O premiado diretor, um dos meus preferidos, não é de uma filmografia impecável (vide Sombras da Noite, 2012, Alice no País das Maravilhas, 2010, Dumbo, 2019), sabemos, mas por ser como um membro da Família Addams e enxergar o belo no macabro, esse projeto o pertencia desde que nasceu. Ao mesmo tempo, por se tratar de uma série da Netflix (que tem uma infinidade de produções ruins) voltada para o público infantojuvenil, era melhor manter os pés no chão.

Incluindo uma trama de mistério interessante, a série acerta nos pontos chave da Família Addams – a comédia e a sátira. Os oito episódios mantêm um ritmo ótimo, que faz com que a maratona passe sem que você nem note. Ainda com trilha sonora de Danny Elfman (e extras como uma versão excepcional de ‘Nothing Else Matters’) e direção de Tim Burton, Wandinha seria por si só uma série divertida, mas é a escalação de Jenna Ortega como a protagonista que torna a produção um destaque de 2022.

Jenna Ortega parece que nasceu para a personagem e apresenta uma Wandinha completa, com sua personalidade niilista, gótica e sarcástica, olhar vidrante e postura um tico capenga. Ortega é quem sustenta a produção, que, sem muito esforço, poderia cair na mediocridade. É notável como a atriz se entrega, desde o momento do estudo de personagem à execução na tela.

Eu me achava meio Wandinha das ideias. Uma “excluída”, como chamam na série quem faz parte da Escola Nunca Mais. Hoje vejo que era mais a alegre Enid, só que vestindo menos cores. Mas assim como a Wandinha de Christina Ricci, a da Geração Z representa algo que, talvez, muitas garotas almejam ser de vez em quando. Wandinha é uma resposta aos clichês e imposições que as meninas escutam desde pequenas: “você deveria sorrir mais!”, “sempre seja simpática”, “não responda”, “senta direito”, “meninas gostam de rosa”, “isso é brincadeira de menino” e por aí vai.

Mas talvez o mais legal da repercussão da série é que, mesmo protagonizada por uma garota, ela tenha conseguido furar as mais diversas bolhas de idade e gênero do público. O sucesso de Wandinha é tanto que ela vem sendo pauta de virais na Internet para além de sua trama. Aqui no Brasil, o debate é sobre o nome da garota, que se traduz literalmente para “Quarta-feira”. No mundo todo, a cena de dança, que já se tornou uma das mais marcantes da televisão, virou trend entre os dançarinos de TikTok ou bailarinos profissionais. Até um desafio do violoncelo foi criado, entrando na bolha dos jovens músicos eruditos.

Wandinha prometeu um pouco e entregou tudo. E quem diria que uma jovem garota branca de trancinhas que não fosse a Greta Thunberg seria responsável por unir o mundo?

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 14 de dezembro de 2022.