Notícias

#208 Oscar 2024: ‘Pobres Criaturas’

publicado: 21/02/2024 15h35, última modificação: 21/02/2024 15h35
Pobres-Criaturas-e-o-conto-de-libertacao-de-Emma-Stone-720x450.jpg

‘Pobres Criaturas’ garantiu a Emma Stone uma indicação ao Oscar pelo papel - Foto: Searchlight Pictures/Divulgação

por Gi Ismael*

Se existe atualmente uma atriz “escala global” que esbanja versatilidade, essa pessoa é Emma Stone. De um musical dramático sobre um amor improvável (La La Land) a um filme de ator decadente (Birdman) ou uma comédia com mortos-vivos (Zumbilândia), o papel que cair em suas mãos será entregue de forma memorável. Tal versatilidade, somada ao seu timing para comédia, fez Stone migrar para o lado de produções menos convencionais, em séries como Maniac e The Curse. Mas é como protagonista de Pobres Criaturas, filme que disputa em 11 categorias do Oscar este ano, que a artista se transforma e se doa da cabeça aos pés pelo papel.

Baseado na obra homônima de Alasdair Gray, Pobres Criaturas apresenta Bella Baxter (Emma Stone) uma mulher que foi trazida de volta à vida como um experimento do excêntrico cientista Dr. Godwin Baxter (Willem Dafoe). Aparentemente, Bella é uma criança presa no corpo de uma mulher, mas seu desenvolvimento a passos largos chama atenção dos homens ao seu redor, que teimam em controlar todos os aspectos de sua vida.

Quando digo que Stone se entrega da cabeça aos pés, não é por menos: no começo do filme, sua personagem é como um bebê. Em movimentos que remetem à dança contemporânea, seu corpo rígido se equilibra com esforço a cada passo dado. A evolução constante de Bella Baxter liberta seu corpo cada vez mais, seja no andar confiante, no vocabulário assertivo ou em suas descobertas sexuais. Contracenando com Stone, que acaba de garantir um prêmio Bafta de Melhor Atriz, está ainda Mark Ruffalo como Duncan, mais um da lista de homens que acham ter controle sobre a jovem. Ruffalo, geralmente (o diretor não deixa isso virar regra) escalado para papéis de personagens adoráveis, convence no papel de um homem perdido e vazio quando se vê incapaz de tomar as rédeas de uma mulher.

O longa é dirigido pelo grego Yorgos Lanthimos, um inventivo cineasta que, assim como Stone, impressiona com sua versatilidade em títulos como Dente Canino (2009), O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017) e A Favorita (2018). O longa de 2023 é o mais ambicioso em termos estéticos, quando todos os elementos técnicos do filme atuam de uma forma única juntos ao roteiro. Do uso da lente grande angular, ao alto contraste dos cenários, tudo conflui para criar uma atmosfera surrealista que utiliza da estética vitoriana num flerte gostoso com o steampunk.

A temática do empoderamento feminino se tornou uma querida das premiações mainstream do cinema nos últimos anos, e como todo motivo que se populariza, a abordagem por vezes batida esvazia o sentido e soa forçada. Mas Pobres Criaturas, apesar de escrito, roteirizado e dirigido por homens, traz sensibilidade, comédia e drama que nem todos os títulos “empoderados” conseguem alcançar. É um filme deslumbrante (quero todos os figurinos de Bella Baxter) e tem grandes chances de garantir a principal estatueta do Oscar este ano. Oppenheimer que se cuide!

 *Coluna publicada originalmente na edição impressa de 21 de fevereiro de 2024.