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#90 "O Brasil me obriga a BBB"

publicado: 05/05/2021 08h00, última modificação: 07/05/2021 12h24
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tags: BBB , JULIETTE , GI COM TÔNICA


O título dessa coluna foi tirado de uma postagem no Facebook do querido Chico Limeira. Escrevendo esse texto algumas horas antes da final, fico repetindo mentalmente a frase. Entrando em quase um ano e meio de pandemia e caos, as distrações precisam existir (não as confunda com alienações, essas ficam para os que se manifestaram de verde e amarelo no último sábado). Pela primeira vez na vida, acompanhei uma edição do Big Brother Brasil do começo ao fim. Acompanhei mesmo, atenta a tudo que acontecia na casa miniprojeto de Orwell, inclusive através de grupos de Telegram. 

No último domingo, nos despedimos de Gil do Vigor, uma figura icônica, o personagem perfeito para um reality como esses. Comoção nacional. Mais uma vez, o Brasil dividido. O Brasil tá lascado. Mas se você procura um local onde todo mundo tem certeza que detém a verdade e poderes pontífices, recomendo que visite o Twitter. 

Lá, mora a certeza de tudo. A resposta para a vida, o universo e tudo o mais (e ai de você argumentar que a resposta é "42"). A terra de ninguém, berço das polarizações e da total cegueira frente à subjetividade, mas que adora relativizar sem nem perceber. No Twitter, não existe meio termo. Idolatre ou odeie -- e deixe isso bem público, afinal, quem não gostaria de saber sua opinião?

 A cada briga no reality, brigas de desconhecidos na rede social do passarinho. Rinha de torcida, mesmo, mas também de um monte de gaiato. Faz parte do jogo, correto? Mais ou menos. A galera começou a jogar umas fake news no meio, começou a criar perfis falsos a fim de queimar os rivais, criaram mirabolantes e teorias da conspiração e as tomaram como verdadeiras. Que circo! 

Algumas pessoas lá têm comparado torcidas, particularmente a de Juliette, com bolsonaristas e até mesmo a paraibana a Bolsonaro. Pessoas e até veículos de comunicação, como a Folha de São Paulo numa coluna de opinião publicada na última terça. Pois é. Estão comparando pessoas que torcem para uma mulher ganhar num jogo à pessoas que apoiam um presidente genocida, pessoas que se ajoelham perante falsas curas milagrosas para a covid, que negam a ciência e acham que bandido bom é bandido morto (menos se for o bandido de estimação delas). Sim, comparam uma maquiadora a um homem responsável por centenas de milhares de mortes por conta de sua (propositalmente) péssima gestão do país. Um homofóbico declarado. Indiscutivelmente machista, racista. Corrupto. Um miliciano. Colocar #elenão e Juliette numa mesma linha? Parabéns, Bolsonaro nunca esteve num lugar tão confortável em sua vida. 

"Milícia Digital". Foi assim que um jornalista classificou a torcida de Juliette no Twitter. Fico me perguntado se ele realmente acha multirão de voto e tweets em defesa (muitas vezes cegas, sim) de um punhado de gente comparáveis a uma organização criminosa responsável pela extorsão e execução de incontáveis corpos negros há anos ou se só está diminuindo o que uma milícia faz. Até relativizam a xenofobia no Twitter! Parece brincadeira de mal gosto, mas acham justificável segregar e julgar alguém por conta do lugar onde nasceu só porque a consideram chata. Que loucura.

Dizem, irados, que o BBB reflete como o brasileiro age nas urnas. Como vota mal. Mas minha irmã disse algo que faz muito sentido: a política que é um espelho do reality show. "O Twitter cria um ambiente extremamente tóxico onde ninguém se responsabiliza. Quando falam que a culpa é dos torcedores de Juliette, não fazem a mea-culpa em relação aos próprios comportamentos nessa plataforma, que permitem que consensos sejam atingidos rapidamente. Colocaram 22 milhões de seguidores numa caixinha e isso só reforçou a torcida dela", Paula disse. 

Graças ao Twitter, o tiro saiu pela culatra. Os haters popularizaram Juliette, que por si só já é uma figura extremamente carismática, e, no final, quando preferiram dar o prêmio a outra pessoa, escolheram direcionar os votos a um riquinho "homem branco hétero privilegiado" (como ele mesmo disse), o suprassumo do "esquerdomacho", do que a uma outra mulher, de personalidade justa e maravilhosa, que representa uma parcela gigante da população brasileira enquanto negra e de contexto de vida humilde. Parte do que Gil também representa tava. Vai entender. 

Agora ando estressada com o que deveria me entreter. O Twitter, agora, me obriga a beber. E se for pra beber, que seja em homenagem a nossa paraibana campeã do BBB.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 05 de maio de 2021.