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#62 Advogada de 'Lúcifer'

publicado: 26/08/2020 00h01, última modificação: 03/11/2020 11h25
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- Foto: Divulgação

 

Para muitos, a estreia de novos episódios de uma série preferida é um verdadeiro evento. Para mim, com certeza. Quando eu digo “evento”, é literalmente isso: certa vez fui num fast food, peguei algumas coroas de papelão, preparei toda uma noite temática e recebi amigos para assistirmos juntos uma nova temporada de Game of Thrones, sabe, quando a série ainda era realmente boa. Também fui a pessoa que foi a uma boate assistir ao último episódio de RuPaul’s Drag Race (mais divertido que final de Copa do Mundo). Simplesmente adoro uma desculpa para me reunir com a minha galera. Como confraternizações não são possíveis agora (pelo menos não deveriam ser), dessa vez, o grande evento foi em casa. Eu, minha enteada e um balde de pipoca, prontas para assistir aos recém-lançados episódios de Lucifer, disponíveis na Netflix desde 21 de agosto. 

Chegando à sua quinta temporada, Lucifer é uma série de fantasia e mistério baseada no personagem homônimo de Neil Gaiman que apareceu pela primeira vez no quadrinho The Sandman, em 1989. Assim como diversas tramas de Gaiman, a trama de Lúcifer, a série, cruza caminhos de seres fictícios (ou não, dependendo da sua crença) com os seres humanos aqui na Terra. Lúcifer (Tom Ellis) é literalmente o diabo, que veio tirar alguns anos sabáticos no Planeta Azul e acabou abrindo uma casa noturna em Los Angeles. Um novo hobbie dele é ajudar a polícia de LA a investigar crimes e, graças aos seu poder sedutor de arrancar a verdade de qualquer um, ele é um excelente parceiro para a detetivo Chloe Decker (Laura German).

Originalmente produzida pela Fox, após três estrondosas temporadas a série foi cancelada. No sentido literal da palavra. Ficou órfã e pegou a todos — elenco e público — de surpresa. Não demorou muito até que a Netflix percebeu que a série conquistara um público massivo e decidiu adotar o filho conjunto com a Warner Bros. Com direitios autorais comprados, quando Lucifer chegou à Netflix algumas mudanças sutis foram percebidas. Primeiro, a qualidade dos efeitos gráficos ficaram mais convincentes. A trama principal passou a ter mais desenvolvimento e temos agora mais pele à mostra, apesar de ainda ser um programa sem cenas explícitas de nudez e sexo. 

A Netflix, então, ficou com a quarta temporada em mãos e de prontidão anunciou que a série já está com a sexta temporada confirmada. No último dia 21, lançou a primeira parte da quinta temporada sem revelar ainda a data de lançamento da parte final. Talvez uma estratégia para medir a repercussão com o público, já que as coisas tomaram um rumo... interessante. Meus olhos foram bater na nuca com a revirada que deram quando vi o vídeo promocional desses novos capítulos: um irmão gêmeo na jogada. O pobre recurso narrativo já me deixou com um pé atrás. A expectativa baixa me fez gostar dos episódios mais do que imaginava? Provavelmente. Ok, a história do irmão gêmeo malvado é clichê, mas até que faz sentido no universo Lucifer, que vez ou outra revela um novo parente celestial. Até num macro contexto faz sentido: citado no livro bíblico Apocalipse, o Arcanjo Miguel é um poderoso guerreiro na batalha do Céu quando Lúcifer e outros anjos rebeldes foram decaídos. São grandes inimigos e, de fato, irmãos perante Deus. 

Estes novos capítulos não vão trazer muitas reviravoltas, mas resolve conflitos e apresenta ganchos legais para uma continuação. A série, sem fazer esforço, continua sendo um ótimo entretenimento. Lucifer não tem nada de inovador ou até cinematográfico. Mas é um programa gostoso de assistir porque é entusiasmante e divertido. Tem comédia, romance, mistério e aventura, tudo isso sem ser piegas e, principalmente, apresentando personagens maravilhosos (como não amar Amenadiel e o próprio Lúcifer?). Não há nenhuma genialidade aqui — e está tudo bem. A série abre debates para códigos morais e éticos nos quais nossa sociedade ocidental se baseia, apoiada no medo da penalidade divina dentre diferentes interpretações do mundo celestial. Lucifer cria um universo paralelo onde temos a certeza sobre céu e inferno e o livre arbítrio. Lucifer nos faz entender a lógica espiritual que o roteiro cria e nos faz, com a licença poética dos Rolling Stones, ter uma verdadeira simpatia pelo Diabo. 

*coluna originalmente publicada na edição impressa de 25 de agosto de 2020.