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#1 Elas na Grande Guerra de GOT

publicado: 30/05/2019 10h09, última modificação: 03/11/2020 11h26
por_ilustraclementine

- Foto: Reprodução

tags: game of thrones , gi ismael , gi com tônica

(coluna originalmente publicada na edição impressa de 30 de maio de 2019)

Primeiro de tudo: aqui tem um monte de spoilers do terceiro episódio da oitava temporada do fenômeno televisivo Game of Thrones, transmitido pelos canais HBO no último domingo e em basicamente todos os sites de torrent que você imaginar. Caso você não tenha assistido ainda, é bom se aventurar por outras linhas do jornal.

Com 82 minutos de duração, ‘A Longa Noite’ foi o maior episódio da série até hoje (além de um dos mais empolgantes). Foi aqui em que, finalmente, os exércitos de Daenerys e Jon Snow se juntaram para derrotar os Caminhantes Brancos e o Rei da Noite. E, quem diria?, foi literalmente isso que aconteceu neste episódio obscuro (trocadilho intencional).

Mas não quero fazer aqui uma recapitulação da coisa toda. Quero falar sobre a atuação das personagens femininas (mulheres e garotas) de destaque nesse episódio, porque acredito que esse foi o momento em que cada uma pôde demonstrar de uma só vez as maiores fraquezas e qualidades em frente à Grande Guerra. Foi neste capítulo que elas foram naturalizadas, foram permitidos acertos e erros.

A agora cavaleira dos Sete Reinos Brienne de Tarth foi para a linha de frente, comandou guerreiros e batalhou ininterruptamente, sobrevivendo até o fim surpreendente dos mortos-vivos.

Sansa soube reconhecer que, apesar de ter se mostrado uma forte líder no Norte durante a ausência de Jon Snow, aquela batalha não a pertencia. Foi com lágrimas nos olhos para as criptas e temeu pela vida dos mais frágeis que estavam junto a ela. Quando o bicho pegou lá dentro, Sansa respirou fundo e enfrentou com um punhal uma horda de não-mortos.

A pequena Lyanna Mormont, a última mulher de sua casa, sempre teve personalidade que enchia os cômodos de poder e sabia que tinha que lutar contra o Rei da Noite e seu exército. Tinha conhecimento de que não havia muitas chances de sobrevivência quando foi enfrentar o gigante e juntou cada pedaço de força que tinha para perfurar o olho do vilão enquanto era esmagada até a morte.

O Senhor da Luz fez sua presença na linha de frente graças à Melisandre e seus esforços em manter a calma e tocar fogo na coisa toda. Não foi de serventia acender as espadas dos Dothraki, mas incendiar as trincheiras fez com que o exército ganhasse tempo e ela deu umas dicas marotas para Arya trazer um dos melhores finais de episódio de todos os tempos.

Por falar em Arya Stark, depois de tanto lutar na Guerra, ela usou sua esquiva e habilidades sorrateiras para continuar vivendo, como há muito fazia na série em sua trama paralela. E o fato de ter sido ela, a ‘Ninguém’, o recurso ex-machina entre tantos personagens másculos e viris foi de fazer um estádio inteiro se levantar e bradar que sempre amou a menina da espada Agulha.  

Montada em Drogon, Daenerys, que não é uma guerreira, lutou como pôde na guerra. Seus esforços não valeram muito. E está tudo bem, também.

Foi marcante ver mulheres lutando na linha de frente, comandando exércitos e derrotando inimigos dos mais temerosos, tudo isso sem precisar falar para nós que elas são ‘mulheres, mas são fortes’. A série conseguiu construir bem cada uma das personagens episódio por episódio para que a gente entendesse a individualidade delas. Minha felicidade inclui ver algumas outras mulheres não servirem efetivamente durante a batalha -- ora, isso aconteceu também com personagens como o Sandor “Cão” Clegane e Samwell Tarly. Por isso digo que elas foram naturalizadas, não foi preciso se encaixar num papel esperado para uma mulher numa série de ficção.

Aumentando a reflexão, que bom que Jordan Peele pôde fazer um filme de terror com protagonistas negros. Que um filme blockbuster de superheróis tenha uma equipe predominante negra, com um roteiro, inclusive, que mostra a civilização de uma ilha paradisíaca matriarcal. Ainda bem que Kleber Mendonça Filho faz filmes gravados no Nordeste sem o apelo ‘Vidas Secas’. Ou ainda que as Irmãs Wachowski assinem uma série de ficção científica de peso como Sense8 com personagens cis e trans.

Ter a representatividade estampada na cultura pop pode parecer besteira para algumas pessoas, é verdade. Falta uma visão periférica na vida delas. Algumas portas foram abertas e outras tantas foram escancaradas para que pudéssemos fazer parte desse momento em que personagens fora do âmbito do homem-branco-hétero vivam histórias mirabolantes da fantasia e ficção científica, do terror e da comédia. E que mais muros sejam derrubados, mais janelas e portões também. Está mais do que na hora de arejar esse ambiente, não acham?