por Gi Ismael*
Em junho de 2019, estreava na HBO Max ‘Euphoria’, uma série que desde o começo exibia potencial para ser uma queridinha dos "millennials” aos “zoomers”. Estética polida meio retrô, meio contemporânea; figurino e trilha sonora que permeiam pelas duas gerações; e problemas adolescentes com um quê de dramatização. Se parte dos nascidos nos anos 1980 e 1990 liam ‘Crescer é Perigoso’ ou assistiam ‘Skins’ para ver história de descobertas sexuais e farra pesada, ‘Euphoria’ apareceu para deixar o papo um tanto mais glamouroso, porém um tanto mais sério.
‘Euphoria’, remake levemente baseado numa produção homônima israelense transmitida entre 2012 e 2013, acabou sendo considerada melhor que a original (de vez em quando eles acertam, ‘The Office’ e ‘Shameless’ estão aí para provar). E não é por menos. Dirigida e escrita por Sam Levinson, a série apresenta um elenco de novatos e veteranos que consegue ser um dos mais potentes castings da atualidade. Zendaya (Rue), Hunter Schafer (Jules), Sydney Sweeney (Cassie), Jacob Elordi (Nate), Nika King (Leslie), Eric Dane (Cal)... acredito que poucos da lista você consegue associar a um rosto logo de primeira, mas te digo: eles apresentam performances de deixar boquiaberto.
Na primeira temporada, todo o arco principal teve seu momento de brilhar e pudemos conhecer mais sobre seus contextos sociais e afetivos. Ou seja: era o momento de criar empatia ou ranço. Mas, até então, a série não tinha muito aprofundamento em suas problematizações relacionadas ao uso de drogas, redes sociais ou famílias abusivas até que, em 2020, a HBO lançou dois episódios especiais sobre o casal protagonista Jules e Rue.
Os capítulos extras acontecem logo após a separação momentânea das duas durante as férias de verão. Na parte 1, Rue encontra Ali, seu padrinho dos Narcóticos Anônimo, e os dois celebram um melancólico natal de reflexões e partilhas. Já na parte dois, escrita por Hunter Schafer, Jules abre seu coração para sua psicóloga, abordando seus relacionamentos, transsexualidade, decepções, felicidades e traumas.
Estes especiais natalinos foram uma virada de chave para a série. Em fóruns e redes sociais, muita gente tem dito que pouco está acontecendo na segunda temporada, que a produção deu prioridade à estética que ao conteúdo. De fato, os episódios mais lindos são esses recém-lançados. Mas não tem nada de vazio no magnífico prólogo que conta o primeiro e precocemente terminado amor de Cal, nem em Rue, no seu ponto mais baixo, avistando seu pai numa igreja. Penso que, na verdade, ‘Euphoria’ está dando uma respirada, assim como deu nos episódios especiais, para desenvolver cada trama de forma mais completa e duradoura.
Se ‘Euphoria’ glamourizou o uso de drogas recreativas na primeira temporada, esta segunda deixa de lado as drogas ilícitas na vida dos adolescentes e traz o vício de Rue para o primeiro plano. No mais novo episódio, é devastador como a protagonista machuca todos que lhe cercam. É sufocante assistir à montanha russa de sentimentos (reais ou chantagistas) e, por mais frustrante e irritado que fiquemos, vem o lembrete de que ela está meramente perdida no escuro.
Mostrando o ying-yang de seus personagens, Sam Levinson tem acertado no tom desta temporada de ‘Euphoria’. Com ou sem a tal euforia em questão, eu quero mesmo esse pano para manga e, afinal, mais uma renovação da série! Não me apetece mais a experiência de uma série entregar tudo no começo para, logo depois, ser cancelada.
*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 9 de fevereiro de 2022.