O cansaço está grande depois da festa da virada e você, provavelmente, tem tanto medo da ressaca que pode aparecer que ainda nem parou para pensar que hoje começa uma nova década, para muitos, o momento perfeito para mudanças, para um novo ciclo.
Eu sei, depositar expectativas em algo não costuma ser bom. Principalmente nessa entidade onipresente e abstrata que é o tempo. Fico logo aperriada pensando em como vou equilibrar produtividade com merecidos descansos. Mesmo assim, me rendi e criei listas de resoluções pessoais, profissionais e culturais com um pouco mais de ambição do que no ano passado. Ler mais livros, ir mais ao teatro, jogar mais games, assistir mais filmes, ouvir mais música... Ter elaborado esse plano de estudos e de apreciação cultural (e entretenimento, a quem estou enganando?) me fez pensar em como será a produção nacional nesta nova década.
Este é um ano decisivo. É a partir dele que vamos saber o que será feito agora que temos no topo da pirâmide um governo que corta e demoniza brutalmente incentivos voltados para a arte. Um governo de características fascistas e que, justamente por isso, extingue o Ministério da Cultura, modifica a Lei Rouanet, implode a Ancine. Quantos projetos conseguirão sair do papel?
Veja, tenho fé de que é possível ser aditivo em um sistema subtrativo, mas a luta é grande e constante. Caso você não seja artista, não pense que a pauta não te serve. Uma sociedade sem arte está fadada à alienação e ao conservadorismo. Você, como público, faz a roda girar. Você, que produz, é fundamental para que a engrenagem continue funcionando. Você, que tem capital para investir, é o desfibrilador em momentos caóticos. O caldo precisa engrossar e o show deve continuar.
Ouvi no fim de semana Leandro Karnal dando um pílula de otimismo: “tudo passa, inclusive governos”. Este novo ano traz também as eleições para prefeito, vice-prefeito e vereadores e você tem em mãos uma das moedas mais cobiçadas da atualidade: o voto. Inclua na sua lista de resoluções o voto que atenda a pautas que visam o bem coletivo e busque minuciosamente por candidatos que prezam pela cultura.
Eu queria poder fazer um texto premonitório e ser a mensageira de boas novas. Ter a segurança de Mãe Dináh e a autoestima das previsões de seções de horóscopo. Me atenho aos achismos: acredito que a imprevisibilidade de 2019 foi só um aperitivo do que 2020 será. Por isso é importante ter mais empatia, amor e garra. A verdade é que dois mil e vinte precisa ser um ano tão redondo quanto o número nos antecipa -- para uma virginiana, nada mais gostoso do que essa aliteração numérica durante 366 dias.
*texto publicado originalmente na edição impressa de 01 de janeiro de 2020.