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#52 O mistério que te prende

publicado: 10/06/2020 08h23, última modificação: 03/11/2020 11h25
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Elenco de ‘Entre Facas e Segredos’: duas horas de um filme que mescla mistério e comédia na qual “ninguém entra e ninguém sai, todos são suspeitos” - Foto: Divulgação

tags: whodunit , comédia , mistério , entre facas e segredos , gi ismael

 

Há poucos dias, entrou no catálogo do Amazon Prime Video Entre Facas e Segredos (2019), filme escrito e dirigido por Rian Johnson. Sucesso de público e crítica no ano passado e, veja só, quem, assim como eu, não conseguiu assistir no cinema agora pode ver no conforto de casa. Cada vez menos tenho lido sinopses e visto trailers antes de assistir algum filme porque percebi ao longo dos anos que a experiência é mais completa quando o contexto é trazido de forma inédita. É de acordo com a narrativa do roteiro/direção, sem (quase) nenhum spoiler, que eu consigo avaliar melhor se a história foi realmente bem contada ou não. Quando escrevo sobre algum filme, coloco o aviso de spoilers antes do texto e, quando não coloco é porque dou detalhes que comprometem minimamente a experiência como espectador de primeira viagem. Doidices que aparecem com a idade.

Foi uma surpresa maravilhosa saber que eu estava prestes a encarar duas horas de um filme que mescla mistério e comédia. Sim, muitos seguem esse mote, mas tem mais um detalhe que deixa o gênero mais específico: um assassinato que acontece num local com várias pessoas presentes, ninguém entra e ninguém sai, todos são suspeitos; ou, como chamam em inglês, “whodunit” (quem matou?). 

Entre Facas e Segredos é divertidíssimo e carrega uma originalidade narrativa não de procurar responder a pergunta “quem matou?”, mas sim de acompanhar os desenrolares da história a partir daquele ponto para além do suspeito. Dando uma singela sinopse: o milionário Harlan Thrombey (Christopher Plummer) é encontrado morto em sua mansão pouco tempo após uma festa de aniversário com todos os seus filhos, netos e afins, e, ao que tudo indica, cometeu suicídio. O longa traz o inglês Daniel Craig vestindo uma carcaça bem diferente do marrento e sedutor James Bond, interpretando um cínico personagem de forte sotaque sulista estadunidense, o detetive particular Benoit Blanc, contratado por uma figura misteriosa. Aliás, elenco de peso no filme todo: Chris Evans, Jamie Lee Curtis, Toni Collette e LaKeith Stanfield, só para citar alguns nomes.

Anotei cinco estrelas na minha caderneta e vi o meu amor pelo gênero renovado. Lembrei do clássico Os Sete Suspeitos (1985), citado brevemente no longa de Rian Johnson, comédia brilhante estrelada por atores como Tim Curry, Christopher Lloyd e Eileen Brennan, baseado num dos meus jogos de tabuleiro preferidos: Clue (inclusive, título original do filme). Me veio em mente também a gostosa lembrança de muitas tardes pós-colégio quando eu chegava em casa e colocava o DVD recém-comprado de uma locadora que entrava em extinção. Perdi as contas de quantas vezes assisti ao filme. Uma das melhores comédias de mistério, sem dúvidas.

Uma excelente mas bem mais recente do gênero é a comédia A Noite do Jogo (2018). O filme acerta bem nas doses de comédia, trapalhadas e, claro, mistérios. E ele tem um mote interessante: ele aproveita a febre norte-americana de “festas de assassinato misterioso” (é tipo um RPG live action que montam em casa ou em casas especializadas nisso) e coloca os casais para desvendarem um crime real. A trama se estende para além da casa deles, mas em momento nenhum isso tira pontos do placar. 

Não posso deixar de citar por aqui outros clássicos como Assassinato no Expresso do Oriente (ambas versões de 1974 e 2017), baseado no livro de Agatha Christie. Confesso que ainda tenho alguns clássicos na lista que preciso assistir, principalmente depois do vigor pós-Entre Facas e Segredos. Ainda estou me devendo títulos como O Assassino Invisível (1934) e O Fim de Sheila (1973). 

Sinto que os filmes têm desse segmento têm um caráter viciante, até. A gente se sente mais aguçado a cada mistério que nem quando lemos Um Estudo Em Vermelho (Arthur Conan Doyle, 1887). As tramas previsíveis parecem entediantes e tentar desvendar o crime antes do deadline do fim da trama traz um hype sem igual. Quando se soma à fórmula da imprevisibilidade com doses de comédia aguçada, meu palpite é certeiro: a diversão do dia está garantida. 

*publicado originalmente na edição impressa de 09 de junho de 2020.