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A Casa de José Américo

publicado: 25/03/2024 09h34, última modificação: 25/03/2024 09h38

por Gonzaga Rodrigues*

Será reaberto amanhã o museu que a Fundação Casa de José Américo consagra a seu patrono. Já era museu ou a inspirar esse ambiente antes de legitimado como fundação cultural concebida e oficializada pelo governo Burity e aberta ao público com representação do Brasil, liderada pelo presidente de então, o mineiro Aureliano Chaves, Clóvis Bezerra na gestão do estado.

Bem antes disto já inspirava história, tanto pelo ideário político (“Há uma miséria maior do que morrer de fome no deserto”), que o entrincheirara na revolução de 1930 ou quando a praça pública explodiu ateada pela chama do candidato à Presidência da República. Bem assim também pelo marco inapagável de sua presença ou do Nordeste na história da literatura brasileira.

“É o mais representativo homem do Nordeste”.Sabem disto os doutores da literatura, como Alceu Amoroso Lima, chocado profundamente ao saber de sua morte, e aquele leitor tentando avisar-se do abismo social cada vez mais profundo numa nação que mantém infenso à guerra o mapa do tempo de D. João VI.

Desde o povo à elite, José Américo, na literatura ou na política, ajudou o Brasil a se conhecer melhor. Numa militância ajudada pela linguagem cada vez mais depurada em favor da leitura e dos ouvidos do povo.

Voltando as costas ao cume da política, atingido finalmente ao sofrer a derrota de 1958, traído em sua terra por quem crescera de suas mãos, soube resignar-se retornando ao seu natural, ao “bicho do mato” da casa rústica onde nascera, “a réstia de sol (como) uma vara de ouro a cutucar-me, o dia nascendo, a manhã clara, o nambu e outros pássaros a dar o sinal de chegarem às goiabas antes dele”. Corria ao engenho, lambuzava-se de garapa e corria a banhar-se no orvalho, balançando as árvores. “Qualquer copa era o meu teto”.

Desde o povo à elite, José Américo, na literatura ou na política, ajudou o Brasil a se conhecer melhor   --   Gonzaga Rodrigues

Daí a casa e o ambiente que se reconstituem na busca de autenticidade, cada reabertura ditada pela procura ou oferta de componentes que os velhos e novos tempos nunca deixarão de surpreender.

Do estilo: “Soquei-me neste recanto por ser terra paraibana que, além de sua beleza, tem caráter. Nada há que se assemelhe à sua configuração de um pitoresco que não cansa.” Ao longo dos seus 93 anos, apenas o cenário brejeiro de “bicho do mato” transportou-se para outra natureza, para um “retalho de mata e o grande mar. O pano de fundo e a perspectiva atlântica formando o quadro”.

Mas já era museu, a casa aberta aos brasileiros dos mais distinto níveis e regiões numa arrumação que só atraía para o homem.

Como o sol e o vento que a ele se chegavam todos os dias, não foi menos variada e permanente a frequência a seu terraço. Tornou-se, numa manchete do jornalista Severino Ramos, a solidão mais povoada.

O futuro não fará por menos!

*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 24 de março de 2024.