Morreu atuando, fazendo o que sempre fez como senhor dos seus dons e do cultivo a eles dedicado, o artista plástico, professor, museólogo e comunicador Francisco Pereira da Silva, nosso Chico Pereira. Nosso, dos que nasceram e com ele definiram as linhas da vida a partir de Campina Grande, e nosso, da acomodação fraterna à “vila” hoje sem fronteiras econômicas, culturais e afetivas, a nossa querida João Pessoa.
Chico Pereira fez-se ilustre sem perder a simplicidade. Foi mestre, de parelha ou na mesma carteira do aprendiz. Num convívio de quase a vida inteira, algumas vezes trabalhando juntos, juntos participando de momentos difíceis e às vezes tormentosos, a expressão do seu rosto foi sempre a de quem não se surpreendia, a de quem vivera muitas vidas.
Lutava havia anos com a doença sem que uma ruga no humor viesse ao rosto. Sem queixa, participando das reuniões da Academia, da gestão no trabalho, da vida possível, sem falar em doença a não ser que lhe perguntássemos, coisa que evitávamos.
E morreu num fim de tarde, véspera de festa, quando todo o Ocidente se recolhe para a alegria do nascimento da cristandade. Como se preferisse deixar a vida tão simples, tão certo e naturalmente como nasceu. Era bem formado espiritualmente, para a vida e o trabalho, o homem e o artista cujo acervo de obras bem o representa.
Quando o conheci, ambos vivíamos um momento de afirmação para a vida inteira: eu chefiando uma equipe formada para salvar um jornal já histórico, em João Pessoa; Chico Pereira, seguindo a Raul Córdula Filho, assumindo a direção do Museu Assis Chateubriand, conquista de prestígio nacional concebida e estimulada pelo patrono que, fundando museus de arte em São Paulo, patrocinando a Campanha Nacional de Museus Regionais, sentiu-se em dívida com a terra de sua infância, motivando lideranças empresariais como Edvaldo de Souza do Ó, reitor da Furne de então, fazendo acrescer ao prestígio regional de Campina Grande um museu de projeção e referência nacionais.
Cinco ou seis anos depois, professor da Universidade Federal da Paraíba, instala seu atelier em João Pessoa, em rua de minha passagem diária, travessa entre o 13 de maio e a Epitácio Pessoa. E o gosto figurativista de predomínio histórico, absoluto, passou a ter em mim seu acesso às telas de Chico, senhor e divulgador das técnicas artísticas, abrindo vaga para o ideológico Leonardo Leal, Elpídio, Svendsen que vieram juntar-se aos do amor à primeira vista, Hermano José, Archidy, Flávio, Alexandre e o relicário do antigo Núcleo Contemporâneo das Artes.
Mas o melhor de Chico era trabalhar com ele, conciliar as experiências como muito fizemos na edição de publicações promocionais da nossa história e da nossa cultura, sobretudo quando esteve à frente da Secretaria de Estado da Cultura ou na assessoria editorial da Grafset editora.
Encerrou sua devotada carreira como bem começou, participando da adaptação do Palácio da Redenção, esvaziado da função histórica de sede do governo para se tronar Museu da História da Paraíba.
Fiel nas amizades, foi juntar-se a José Neiva, nosso parceiro na vida e, certamente na escolha de Chico, também na morte.
*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 28 de dezembro de 2025.