Tomei gosto pela história da Paraíba, eu ainda bem jovem, logo que saí do gibi. Na biblioteca da minha cidade (Alagoa Nova), os autores preferidos, como no país inteiro, eram Alencar de “O Guarani” e “Iracema”, Castro Alves do “Navio Negreiro”, Macedo de “A Moreninha” e, disputadíssima, a Anthologia Nacional, assim com th, que a prefeitura do espírita e intelectual Arlindo Colaço empenhara-se em disponibilizar com o maior número possível de exemplares. A biblioteca era pretensiosa como o seu fundador e sem espaço para o número de “dependentes”. E isso angustiava o prefeito que aparecia com frequência como a conferir a repercussão de sua obra.
Veio dele, de uma dessas visitas frequentes, a recomendação do livrinho que tinha tudo para ser difícil, a partir do título: “Epitome de História da Parahiba”. A nós, particularmente, reforçava a recomendação de ter sido escrito por um alagoa-novense, o dr. Manuel Tavares Cavalcanti, irmão de outro doutor, herdeiro do engenho, que todos os domingos chamava a atenção da nossa grande feira com sua imponente passagem em demanda do papo do cartório, o dr. Pedro Tavares”. Esse doutor me cumprimentava com atenção, certamente em consideração a minha mãe, que pertencera com boa voz ao coro da igreja.
E li sem muita dificuldade a primeira história da Paraíba escrita para a escola por autor da escolha do presidente Castro Pinto. Quando desci aqui, numa chuva de verão de 1951, já curtia noções, portanto, de onde viria pisar, tanto que, na semana seguinte saí à procura do monumento ao ouvidor Martim Leitão, tal o nível de importância readquirida através da narrativa da tal Epitome.
Subi até o Ponto de Cem Reis, e num dos antigos pavilhões que abrigava a conversa bem vestida e falante, comecei a aprender fora do livro, a me situar nas particularidades da terra. Chovia muito e um senhor de rosto largo e cabelos soltos, pontificando num dos pavilhões da praça, saiu-se com esta, a propósito da invernada: “Não há chuva que não escorra rápido nesta cidade. Deve-se isto a Martim Leitão que soube escolher o monte, a colina entre o rio e o mar. A tempestade que cair tem por onde escorrer”. Era o dr. Leon Clerot que, rodeado de admiradores transpirava um clima de história. Vim conhecê-lo mais de perto e muito o ouvir depois, pioneiro nas cogitações de fundação de um museu histórico da Paraíba. Por iniciativa própria, sem a adesão do estado, começou a executar um projeto ou a prosseguir na busca e guarda de um pequeno acervo antropológico, de arcos, flechas, ossos e adornos atribuídos aos índios, mas sem qualquer recurso ou estrutura.
Com Linduarte Noronha, BalduinoLeles, Deusdedit, cedo fiz coro em reclamar do interesse público e oficial por um museu à altura da nossa história. História a que me liguei (repito) a partir do livrinho do doutor Tavares. Precisamos de 70 anos para que a Paraíba se capacitasse a instalar seu Museu, por sorte, muita sorte, entre lajes e paredes erguidas no início da cidade, convento, palácio e museu.
Mesmo de séculos, há demoras que valem a pena.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 7 de dezembro de 2025.