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Sobre Hildeberto e poesia

publicado: 15/01/2024 10h40, última modificação: 15/01/2024 10h40

por Gonzaga Rodrigues*

Sou um dependente sem cura do dicionário. Já devo ter passado e demorado por bastantes anos de leitura e consulta, o suficiente para dispor da palavra simultânea à ideia. Mas palavra - atente-se - que dispense o leitor comum dessa minha servidão.

Sou um dependente sem cura do dicionário. Já devo ter passado e demorado por bastantes anos de leitura e consulta
Gonzaga Rodrigues

Para eu ter dicionário de tudo, falta pouco. Desde o de sinônimos, de música, de cinema, de geografia, de filosofia, de literatura, de comunicação, de folclore, de história do Brasil, de belas-artes, de cachaça,além de três preciosidades, uma delas bastante superada, que é o Dicionário Econômico e Financeiro  do velho Luiz Souza Gomes, tomado de empréstimo e nunca devolvido a um amigo querido, José Iremar Bronzeado. As outras duas: o Pequeno Dicionário Latino-Português, edição escolar dos anos 1950, que mantém na página de abertura a perenidade de um momento bem vivo na noite, datado de 1-12-63, alumiando num ângulo superior da página com estes dizeres: “Dulce e eu estamos estudando à uma damadrugada.”

Será que essa madrugada se foi, caríssimo Hildeberto Barbosa Filho, poeta, professor, crítico e livre-pensador? Terá escapado dessa inscrição em letras tão caprichosamente femininas? Vossa Mercê que entende disso, que, quando não pensa em nada “é o verso que se acerca, tateando a poesia das coisas e do mundo. O mundo e as coisas estão cheios de poesia. O que é mesmo a poesia?”- vosmecê pergunta.

Na página naturalmente amarelecida, mas aviventada pela chama dessa lembrança inscrita de Lucinha, não fará de meu livro, ainda bem que de capa dura, uma variante dos objetos poéticos?

Lucinha e Dulce, nos seus quinze ou dezessete anos em 1963, não estarão na mesma idade?

Alio-me à ideia sugerida à entrada de seu novo livro, Hildeberto, de se pensar numa pré-seleção das candidaturas à Academia: “O ideal é que, acadêmicos, em reunião extraordinária fizéssemos uma discussão e uma lista de alguns nomes que, sobretudo pelo mérito científico, intelectual e artístico, sobremaneira por isto, pudessem dignificar e representar melhor a velha e austera Casa de Coriolano de Medeiros”. E sugere nomes indiscutíveis, a começar por Genival Veloso França, W. J. Solha, Chico Viana, João Batista de Brito, Marília Arnaud, Evandro Nóbrega, Aldo Lopes, Clemente Rosas, Fernando Teixeira, Sandra Luna, Renato Cesar Carneiro, Francisco Gil Messias, Gilvan de Brito, Neroaldo Pontes, José Antônio Assunção, Carlos Azevedo, Raul Córdula, Marcilio Franca, José Edilson Amorim”.

O que devo lembrar é que, até a chegada de Joacil de Brito Pereira e Celso Novais, havia essa pré-escolha. Clovis Lima escolheu uma penca na qual, até o locutor que vos fala foi incluído ao lado de Virginius da Gama e Melo. Não entrei dessa vez porque passei do prazo de posse. Virginius agradeceu.

Pois bem. A democracia exercida pelas eleições gerais, de presidente da República a vereador, passa por essa pré-seleção, através dos partidos. Não é o exemplo ideal, no caso brasileiro, porque o vício já começa aí. Mas a Academia nunca escolheu ou votou por dinheiro. Às vezes se equivocadiante do prestígio seja lá de que do candidato. Mas nem a Brasileira está isenta disso.

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 14 de janeiro de 2024.