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Trilhas, veredas e caminhos

publicado: 03/07/2023 12h59, última modificação: 03/07/2023 12h59

por Gonzaga Rodrigues*

Uma entidade de sorte o DER. Sorte não só em desígnios ou no devotamento e inteireza dos seus recursos humanos, como em poder descortinar e sentir, no mirante de 77 anos, a completude do seu trabalho. Não há hoje uma cidade sem acesso às vias principais de comunicação.

Vejamos se me explico: menino de dez anos que passou pelo estranho desconforto de engolir a poeira da estrada central sem fim do Estado, desde os grotões do meu Brejo, passando por Cajazeiras, e  daí ao Juazeiro do Padre Cícero, e que vêm dar título ao livro-álbum que requalifica a história da instituição: TRILHAS, VEREDAS E CAMINHOS interligando vidas.

Já narrei uma apertada-hora dessas: “Quando deixamos Bodocongó – porta de entrada para o Sertão – o sol de luz empoeirada na estrada a vencer. Daí por diante era só mistério, os faróis vencendo o túnel por onde eu mais via histórias de onça e de cangaceiros deixadas na memória do menino pelos compradores de farinha e rapadura.”

“Não há hoje, pequena que seja, uma única cidade sem acesso fácil e confortável às vias centrais”- pode dizer sem receio o governador João Azevedo.

O livro observou o cuidado de registrar, com a isenção que só o tempo favorece, a parte de cada um, desde 1946, quando o DER foi criado pelo interventor e revolucionário Odon Bezerra, com a assistência do patrono histórico dos funcionários, o engenheiro Serafim Martinez. Uns mais, outros menos, todos souberam tirar partido das circunstâncias financeiras associadas ao governo central. Muita obra com recursos próprios do Estado.

Sem pertencer aos quadros do DER, convivo com os seus cossacos de prancheta e de estrada desde 1951/52, afinado com Dorgival Terceiro Neto, Carlos Pereira de Carvalho, Enaldo Soares e meu colega de classe no Pio XI, o grande Raimundo Adolfo. Entrei na sua história, devo estar por trás em alguma fotografia desde que acompanhei Rafael Arcanjo Mororó, numa manhã de sábado, na abertura dos trabalhos de pavimentação da estrada central, a BR-230 dos nossos dias, iniciada por José Américo. Não havia vaga na boleia, arranjamo-nos na carroceria, chegando a tempo de ouvir o governador e ver o acionamento da caterpillar que não sei se é a que compõe o jardim frontal da belíssima sede do DER. Sede nascida do traço de  Leonardo Stuckert, talento maior da nossa moderna arquitetura, e mantida em forma pela sensibilidade e consciência crítica das sucessivas gerações de diretores e funcionários. O IPASE, outro monumento tão representativo dos Corbusier, dos Lúcio Costa e Niemeyer assimilado pelo paraibano, não teve a mesma sorte.

Para essa história vitoriosa de interligação completa das nossas comunidades urbanas (hoje tudo é urbano) valeu a visão e o sentido histórico com que foi concebido o belo e rico livro confiado por Carlos Pereira de Carvalho e Silva ao editor Fernando Moura e a uma equipe desfalcada hoje, e enquanto vida tiver, de talentos e seres humanos como Martinho Moreira Franco e Juca Pontes. 

*Coluna publicada originalmente na edição impressa de 02 de julho de 2023.