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O verão, segundo Veríssimo

publicado: 20/04/2016 17h35, última modificação: 21/04/2016 09h43
Publicado na edição de 14.02.2016


Martinho Moreira Franco

Quem melhor (ou com mais verve) do que Luís Fernando Varíssimo poderia descrever um dia de verão na praia? Leiam a crônica dele (de 2012, mas atualíssima) e respondam se capazes:

Verão é sinônimo de pouca roupa e muito chifre, pouca cintura e muita gordura, pouco trabalho e muita micose. Verão é picolé de morango no palito reciclado, é milho cozido na água da torneira, é coco verde aberto pra comer a gosminha branca. Verão é prisão de ventre de uma semana e pé inchado que não entra no tênis.

Mas o principal ponto do verão é... a praia! Ah, como é bela a praia!

Os cachorros fazem cocô e as crianças pegam pra fazer coleção. Os casais jogam frescobol e acertam a bolinha na cabeça das veias. Os jovens de jet ski atropelam os surfistas, que, por sua vez, miram a prancha pra abrir a cabeça dos banhistas.

O melhor programa pra quem vai à praia é chegar bem cedo, antes do sorveteiro, quando o sol ainda está fraco e as famílias estão chegando. Muito bonito ver aquelas pessoas carregando vinte cadeiras, três geladeiras de isopor, cinco guarda-sóis, raquete, frango, farofa, toalha, bola, balde, chapéu e prancha, acreditando que estão de férias. Em menos de cinquenta minutos, todos já estão instalados, besuntados e prontos pra enterrar a avó na areia.

E as crianças? Ah, que gracinhas! Os bebês chorando de desidratação, as crianças pequenas se socando por uma conchinha do mar, os adolescentes ouvindo walkman enquanto dormem.

As mulheres também têm muita diversão na praia, como caminhar vinte quilômetros para encontrar o filho desaparecido ou o outro pé do chinelo. Já os homens ficam com as tarefas mais chatas, como furar a areia pra fincar o cabo do guarda-sol. É mais fácil achar petróleo do que conseguir fazer o guarda-sol ficar em pé.

Mas tudo isso não conta, diante da alegria, da felicidade, da maravilha que é entrar no mar. Aquela água tão cristalina, que dá pra ver os cardumes de latinha de cerveja no fundo! Aquela sensação de boiar na salmoura como um pepino em conserva!

Depois de um belo banho de mar, com o rego cheio de sal e a periquita cheia de areia, vem aquela vontade de fritar na chapa. A gente abre a esteira velha, com o cheiro de velório de bode, bota o chapéu, os óculos escuros e puxa um ronco bacaninha. Isso é paz, isso é amor, isso é o absurdo do calor!

Mas, claro, tudo tem seu lado bom.

E à noite o sol vai embora. Todo mundo volta pra casa tostado e vermelho como mortadela, toma banho e deixa o sabonete cheio de areia pro próximo. O shampoo acaba e a gente acaba lavando a cabeça com qualquer coisa, desde creme de barbear até desinfetante de privada. As toalhas, com aquele cheirinho de mofo que só a casa da praia oferece.

Aí, uma bela macarronada pra entupir o bucho e uma dormidinha na rede pra adquirir um bom torcicolo e ralar as costas queimadas.

O dia termina com uma boa rodada de tranca e uma briga em família. Todo mundo vai dormir bêbado e emburrado, babando na fronha e torcendo, pra que na manhã seguinte, faça aquele sol e todo mundo possa se encontrar no mesmo inferno tropical...