Em junho deste ano, o British Film Institute exibiu, em seu festival Film on Film, a versão original do que hoje é conhecido como Star Wars – Episódio 4: Uma Nova Esperança. Foi um grande acontecimento porque o acesso a essa edição de 1977, primeiro filme da série, é raríssima. Como se sabe, George Lucas — diretor, roteirista e produtor — dedicou-se ao longo dos anos a fazer alterações no filme, com adição de efeitos visuais e cenas que tinham ficado de fora no primeiro lançamento.
Com todas as críticas que essas mudanças receberam de quem, como eu, conheceu a versão original, Lucas tirou de circulação a versão original o máximo que pôde. Já a partir de 1981, com o relançamento nos cinemas, o filme ganhou sua primeira adição: o cabeçalho Episode 4 – A New Hope abrindo o letreiros que passam pela tela no começo do filme.
Isso porque a versão original era chamada apenas de Star Wars (aqui, Guerra nas Estrelas) e não tinha indicação de episódio nenhum. Quando a continuação, O Império Contra-Ataca, estreou em 1980, é que veio com o Episódio 5 acoplado. Assim, quando Guerra nas Estrelas foi relançado, ganhou o cabeçalho correspondente.
Mas, fora isso, não havia nenhuma mudança no filme. O público brasileiro que conheceu o filme pela TV, inclusive, assistia à versão sem cabeçalho na Rede Manchete, de 1983 a 1986 (a partir de 1987, o filme começou a passar na Globo). Éramos íntimos da versão de 1977.
Guerra nas Estrelas começou a ter mudanças mais bruscas a partir do relançamento da trilogia no cinema, em 1997. Foi ali que mais naves e alienígenas foram inseridos digitalmente para encher as imagens. Uma cena de Han Solo com Jabba the Hutt, cortada do original antes do gangster espacial ser desenvolvido através de efeitos especiais, entrou no filme.
E, principalmente, a infame cena em que Han Solo, acuado pelo caçador de recompensar Greedo, na taberna de Mos Eisley, passa a atirar nele depois do inimigo abrir fogo. Na versão de 1977, Solo atira sozinho, friamente, para se livrar do caçador de recompensas.
O que era uma ação que mostrava uma dubiedade moral do personagem foi alterada de modo piegar para justificar sua ação. Nas edições seguintes, os dois passaram a atirar ao mesmo tempo. Mas quem viu sabe: Han não atira primeiro, ele atira sozinho.
A partir daí, a versão de 1977 praticamente desapareceu. Em DVD, blu-ray ou no streaming, só a edição recauchutada está disponível (com mudanças adicionadas em 2004).
As edições originais de Guerra nas Estrelas, O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi, que tinha sido lançadas em VHS, saíram em DVD apenas uma vez, em 2006, como extras das edições mais recentes dos filmes correspondentes. Apesar de deixarem a desejar em termos de resolução de imagem e nem mesmo serem anamórficas, é a melhor versão que já esteve disponível. Quem tem os DVDs, tem.
O fato é que mais de uma geração só conhece a trilogia original de Guerra nas Estrelas pela edições recauchutadas. Para ela, estes são os filmes. Para esse público, assistir a versão original é ver filmes com elementos retirados e não com excessos. Com coisas faltando. Nesse ponto, George Lucas venceu: conseguiu fazer de sua versão de Star Wars, a padrão.
*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 5 de novembro de 2025.