A memória é muito vinculada ao afeto. Como também é um ato político de grande relevância. Sempre quando penso, falo ou escrevo sobre memória me chega à mente a imagem do tear, as linhas, os fios, os bordados, os retalhos, as tramas da minha própria pele.
Recentemente participei de uma homenagem aos amigos Paulo Afonso de Brito e Lúcia Lira, ambos partiram precocemente. Lúcia no período da pandemia. E Paulo Afonso, quando a gente ainda estava lutando para sobreviver politicamente após os duros tempos pandêmicos e de autoritarismo por aqui.
Nesta homenagem foram lançadas duas importantes publicações. “Educação Popular em Movimento: 30 anos dos cursos de formação de educadores e educadoras populares do Nordeste (Eduespi, 2024)” e “Dicionário de Mulheres Paraibanas (Pimenta Cultural, 2025).
Olhando para as pessoas presentes ao evento realizado no Armazém do Campo – que tem sido um espaço precioso de cultivo de uma vida sustentável -, revisitei muitos momentos da vida, de minha formação na Educação Popular e Ecofeminismo, como no trabalho com juventudes no Nordeste brasileiro.
As publicações trazem muito do trabalho de cultivo dos espaços democráticos nos últimos 30 anos. E com isto não deixa de ser um alerta para a necessidade que o país tem de retomar a sua formação política e cidadã de base.
Quando a gente se depara com perdas de mestres, mestras, amigos e amigas que foram sal e luz na construção de aprendizados profundos da vida, temos a certeza da preciosidade do agir coletivo na construção da integridade humana.
Vivemos um momento de saudade, de homenagem, de cantar e partilhar histórias, e um tempo de imaginar estratégias do presente já que a vida é agora e a conjuntura social nos aponta desafios.
Lidando com as emoções de estar ali, e passeando por caminhos de memória afetiva, recordei as linhas do tempo feitas nos espaços formativos, que nos ajudavam muito a analisar a conjuntura.
Num tempo em que falta concentração e sobra esquecimento, as palavras precisam nos ancorar por um lado na realidade da vida enquanto um acontecimento verossímil. Como também nos fazer crer nas utopias possíveis que podemos semear e cultivar.
Testemunhando a apresentação das publicações pude revisitar caminhos lindos da formação humana, e me abrir para acolher as reflexões contidas nestes dois grandes livros que são bússolas construídas com criatividade, amor, pertencimento e sabedoria.
Muitas mãos foram tecendo estes dois livros que precisam ser lidos e estudados não apenas por quem é parte desta história, tanto da Rede de Educadores, e das mulheres paraibanas que atuaram e atuam na consolidação da cidadania feminina no Estado, mas por um conjunto maior do tecido social.
Mesmo considerando a ausência de pessoas queridas, que com dedicação trabalharam para que os livros fossem publicados, vivi, ao lado de tantas pessoas presentes no lançamento, a mística da colheita do florescimento humano, do transbordar de vida e esperança.
*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 8 de agosto de 2025.