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VEÍCULOS USADOS

Com alta de 33%, vendas disparam na Paraíba

publicado: 01/08/2025 09h15, última modificação: 01/08/2025 09h15
Financiamentos inacessíveis e altos valores aumentam interesse por seminovos
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Lojas comercializaram 109 mil unidades, em junho | Foto: Evandro Pereira

por Priscila Perez*

O mercado de usados tem ganhado cada vez mais força no Brasil, sobretudo no setor automotivo. Em 2024, foram mais de 15,7 milhões de veículos usados comercializados no país, 9,2% a mais em relação ao ano anterior. E, na Paraíba, o avanço é ainda mais expressivo: as vendas cresceram 33% no primeiro semestre deste ano, totalizando 109 mil unidades comercializadas até junho, segundo os dados mais recentes da Federação dos Revendedores de Veículos Usados (Fenauto).

Em um país onde um carro considerado popular beira os R$ 70 mil, mesmo após a recente redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que derrubou os preços em quase R$ 10 mil, é natural que os seminovos e usados ganhem os holofotes.

Ao oferecerem conforto superior ao “zero-quilômetro de entrada” por um valor mais competitivo, eles têm mostrado, na prática, como o velho e bom princípio do custo-benefício funciona. E resultado está nas vendas aquecidas.

Tendência

Consciente de que o investimento no usado, muitas vezes, supera o apelo de um carro novo, o paraibano está, sim, optando por modelos mais antigos. Quem confirma essa tendência é Fábio Santana, da revendedora Santana & Filhos Veículos, localizada no Shopping Carro Legal, em João Pessoa, e atual presidente do Sindicato do Comércio dos Revendedores de Veículos do Estado da Paraíba (Sinvep). “Mesmo com três ou quatro anos de uso, você consegue pegar um carro mais confortável e, dependendo da marca, com garantia de fábrica. Algumas dão até cinco anos”, explica. E faz questão de lembrar que, no caso dos novos, basta sair da concessionária para o veículo perder quase 20% do valor, o que tem feito muita gente repensar a compra.

De acordo com Santana, entre os usados, o momento é de leve acomodação nos preços, impulsionada pela redução do IPI para carros populares, que também acaba puxando para baixo o valor dos demais (seminovos e usados), estimulando as vendas. “A gente percebe um leve declínio nos valores. Não é muita coisa, é quase o preço do ano passado, mas está tendo essa acomodação para baixo.” A esse movimento soma-se outro fator decisivo: o crescimento populacional de João Pessoa, que ganhou o status de “queridinha do Brasil”. “Tem muita gente de fora vindo morar aqui, o que aquece o mercado. É gente que vai comprar carro e circular aqui dentro”, complementa Fábio Santana.

Favoritos

Para se ter ideia, dos 18.939 veículos usados vendidos em junho deste ano no estado, quase metade — 9.071 unidades — tinha mais de nove anos de uso. Os chamados “maduros” (de 9 a 12 anos) e “velhinhos” (com 13 anos ou mais) responderam, juntos, por 48% das transações. Já os seminovos, com até três anos de uso, somaram 5.004 unidades vendidas. Para efeito de comparação, no mesmo mês do ano passado, o volume de vendas de usados foi de 15.027 veículos, o que reforça a preferência crescente por carros mais acessíveis ao bolso e duráveis. Ou seja, com manutenção descomplicada, consumo equilibrado e ar-condicionado — item obrigatório por aqui. Não por acaso, os compactos veteranos Gol, Onix e Celta, conhecidos pela resistência, ficaram entre os mais vendidos em junho, segundo a Fenauto.

Mas a mudança no comportamento do consumidor não para por aí. Se, antigamente, os sedãs dominavam o mercado, agora é a vez dos SUVs (em inglês, veículo utilitário esportivo) ganharem a preferência do público, sobretudo entre os usados. Fábio Santana confirma: “O cliente está optando por carros mais altos em relação ao sedã, o que tem aquecido a procura por SUVs.” Modelos como Creta, Kickse Renegade, das marcas Hyundai, Nissan e Jeep, respectivamente, estão entre os mais cobiçados pelos que buscam robustez, conforto e boa dirigibilidade.

Consumidor está mais exigente e busca qualidade além do preço

Do outro lado do balcão está Angélica Macedo, que decidiu comprar um Tiggo 2 seminovo, o utilitário esportivo da Chery, após comparar com calma as condições de financiamento. “Fizemos simulações. Compramos o seminovo pelas condições de juros e pelo valor que cabia no nosso orçamento”, conta. Na ponta do lápis, a diferença também era bem significativa entre eles. Com R$ 40 mil de entrada em um carro novo de R$ 120 mil, ainda seria preciso financiar R$ 80 mil. E, dependendo do número de parcelas, o valor final poderia ultrapassar o preço original do veículo, com prestações acima de R$ 1.000. A escolha foi, então, por uma dívida mais curta. “Decidimos comprar o usado com uma boa entrada e menos parcelas, com programação de quitar rápido. O carro tem baixa quilometragem e está bem conservado”, detalha.

Na visão do consultor automotivo Arthur Múcio, que atua em toda a Paraíba oferecendo vistorias técnicas e suporte na busca por veículos usados, esse tipo de decisão tem se tornado cada vez mais frequente. “Quem não consegue pagar por um zero está optando por um usado que entrega conforto e qualidade”, observa. Arthur lembra que o custo total da compra vai muito além do valor anunciado: também entram na conta os gastos com manutenção, seguro, emplacamento e impostos. “E quando colocamos isso tudo em um carro de R$ 100 mil, é um investimento grande”.  

Arthur Múcio, consultor | Fotos: Arthur Múcio/Arquivo Pessoal

Mesmo com a leve queda nos preços citada por Fábio Santana, o consultor Arthur observa que muitos seminovos continuam sendo vendidos acima da tabela Fipe, que reúne os preços médios de automóveis praticados no Brasil. “Hoje, tem carro até R$ 10 mil acima. Antes, era comum encontrar R$ 3 mil abaixo.” O motivo disso? O perfil do consumidor que, de acordo com ele, está priorizando conforto, mesmo que isso signifique levar um modelo mais antigo. “É aquilo: vou pagar R$ 100 mil em um Polo básico ou em um Honda HR-V, de 2018, completo?”, questiona.

Arthur também aponta o custo do crédito como um dos fatores que pesam no bolso. Com o zero-quilômetro nas alturas e financiamentos pouco convidativos — em alguns casos, a entrada chega a 70% do valor do carro —, não surpreende que os usados estejam conquistando o consumidor. “As taxas estão cada vez mais absurdas. Você, praticamente, compra o carro à vista e ainda chamam isso de condição atrativa”, critica. Diante disso, ele não tem dúvidas de que as vendas devem continuar aquecidas, sobretudo na Paraíba. “O carro popular não existe mais. O mais barato custa R$ 70 mil. Para o consumidor, é uma escolha racional. A tendência é que o mercado de usados siga em alta”, finaliza Arthur. Fábio Santana, que atua nesse meio há mais de 25 anos, não só compartilha da mesma ideia, como acredita que o cenário poderá melhorar, ainda mais, com a esperada redução nas taxas de financiamento. No fim das contas, ter um veículo confortável na garagem tornou-se mais importante do que o famoso “cheirinho de carro novo”.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 1º de agosto de 2025.