A plataforma “Não Me Perturbe” recebeu 47.444 solicitações de consumidores da Paraíba para bloquear o recebimento de ligações com ofertas indesejadas sobre crédito consignado em seus telefones. O dado diz respeito aos pedidos feitos entre 2 de janeiro de 2020 e 22 de janeiro deste ano. Ligações insistentes e abordagens inconvenientes caracterizam o marketing abusivo e são passíveis de punição que incluem multa e suspensão dos serviços oferecidos pela empresa.
Para a gerente administrativo Larissa Ramos as insistentes ligações não são úteis e, pelo contrário, apenas aborrece quem as recebe. “Recebo diariamente chamadas e mensagens insistentes e nos mais variados horários e dias da semana, inclusive à noite, final de semana e feriados. Costumo bloquear os números sempre que recebo as ligações, mas parece uma praga que se prolifera, os números não acabam. Pensei em fazer o cadastro no ‘Não Me Perturbe’, mas para falar a verdade nunca fiz, pois não tenho muita esperança que resolva”, afirma Larissa.
Doutor em Comunicação Social, José Maria Mendes explica que todo o marketing tem um componente de intrusão. Isso motivado pela necessidade de captar a atenção e desejos dos consumidores, o que acaba levando as empresas a usarem recursos persuasivos que podem descambar para o exagero. Ele pontua que a linha de delimitação deste exagero varia de acordo com a situação.
“Por exemplo, quanto ao telemarketing, a partir de diversas ações já julgadas se estabeleceu uma mínima jurisprudência sobre o assunto, constituindo ‘a prática abusiva do fornecedor a realização de múltiplas ligações diárias de oferta de produtos e serviços, sobretudo quando há pedido do consumidor em sentido contrário’”, afirma.
José Maria acrescenta que, como toda empresa que ultrapassa os limites do marketing e se torna abusiva, o perigo principal é a imagem negativa que a prática acarreta. “Nos arquivos mentais do consumidor, aquela intenção à atenção e ao desejo do consumidor é substituída pelo sentimento negativo associado à importunação e, a curto ou longo prazo, a última coisa que este fará é comprar ou se relacionar com a empresa”, alerta.
O secretário-executivo do Procon João Pessoa, Júnior Pires, ressalta que toda a propaganda e marketing são permitidos para que as empresas façam a divulgação de seus produtos e serviços para o consumidor. “Porém, existe um limite até chegar na importunação. O marketing tem o seu limite definido até onde não importunar o consumidor. Isso vale para aquelas ligações indesejadas, para aquelas mensagens fora do horário comercial”, afirma.
A plataforma “Não Me Perturbe” está disponível na internet, no endereço www.naomeperturbe.com.br, e possibilita que os consumidores que não desejam receber ligações de telemarketing ativo se cadastrem gratuitamente. Em até 30 dias depois da solicitação de cadastramento, o consumidor não receberá mais ligações para a oferta de vários serviços e produtos.
Normas garantem proteção ao consumidor
Juridicamente, as empresas que cometem o marketing abusivo respondem por dano moral, mas multas coletivas também podem ser aplicadas. José Maria Mendes afirma que o consumidor precisa adquirir as provas que objetifiquem a importunação, como prints das ligações em excesso recebidas ao longo do dia ou das várias mensagens enviadas.
Recorrer aos órgãos de proteção e defesa do consumidor pode ser também uma solução. O secretário-executivo do Procon João Pessoa, Júnior Pires, explica que os órgãos podem agir junto aos fornecedores e às empresas para cessar a importunação mais rápido possível. As sanções que essas empresas podem sofrer em decorrência do não cumprimento do Código de Defesa do Consumidor, vai de aplicação de multas à suspensão dos seus serviços.
“A empresa que continuar a importunar o consumidor, que não cumprir com o que a legislação determina, poderá sofrer uma multa, por exemplo, de até R$ 1 milhão ou até ter as suas atividades comerciais suspensas por um determinado tempo em razão desse descumprimento”, afirma.
Nos casos relativos à publicidade abusiva ou enganosa, também é possível recorrer ao Conselho Nacional Autorregulamentação Publicitária (Conar). Em ambos os casos, em postura pré-jurídica. Mas é também possível, ingressar com a ação civil na Justiça Comum.
Combate ao assédio e às ofertas irregulares
Novembro registrou as primeiras suspensões a agentes de crédito por irregularidades na oferta do crédito consignado. Dois profissionais atingiram a pontuação máxima e estão impedidos de atuar em nome dos bancos da Autorregulação do Consignado por 12 meses. De acordo com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) 48 estão impedidas de atuar em nome dos bancos.
Participam da Autorregulação 61 instituições financeiras que representam cerca de 99% do volume total da carteira de crédito consignado no país. As regras se aplicam ao empréstimo e ao cartão consignado e visam a proteção dos direitos dos consumidores. O acompanhamento e a aferição das ações irregulares são feitos por várias fontes de informação. As infrações às regras podem acarretar às instituições multas que variam de R$ 45 mil a R$ 1 milhão.
“O monitoramento dos agentes de crédito, somado à supervisão dos correspondentes bancários, amplia a efetividade da fiscalização e o cumprimento das regras da autorregulação. O setor segue atuante no combate ao assédio comercial e às irregularidades que desrespeitam o consumidor na oferta do crédito consignado”, destaca Isaac Sidney, presidente da Febraban.
Para coibir as ligações telefônicas indesejadas e o assédio comercial, por exemplo, os bancos participantes não remuneram os correspondentes em caso de novas operações em nome de consumidores que estão registrados ou desbloquearam seu número de telefone no “Não me Perturbe” há menos de 180 dias.
“Estamos adotando diversas medidas para proteger os consumidores de práticas irregulares no empréstimo consignado, inclusive suspendendo os agentes de crédito. Queremos garantir o estrito cumprimento das regras da autorregulação, proporcionando um serviço mais seguro e eficaz para todos”, afirma Sílvia Scorsato, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC).
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 18 de fevereiro de 2024.