Notícias

semana de quatro dias

Jornada menor testa produtividade

publicado: 18/09/2023 12h17, última modificação: 18/09/2023 12h19
Empresas que aderiram ao “4 Day Week Global” esperam melhorar a vida de colaboradores sem ter prejuízos
mulher falando falando ao telefone.jpg

Conceito de um ambiente de trabalho mais saudável e menos focado nas pressões do dia a dia vem ganhando força entre instituições de vários países - Foto: Freepik

por Redação* (Com Agências)

Trabalhar de forma leve, feliz e produtiva é o desejo de milhares de profissionais, ainda mais conciliando a vida pessoal com a vida profissional. O conceito de um ambiente de trabalho mais saudável vem ganhando força junto com a discussão da “semana de quatro dias”, na qual a jornada de trabalho é reduzida sem afetar os salários recebidos pelos trabalhadores.

Apesar de parecer uma ideia nova, ela surgiu no início do século 20. Em 1926, quando o industrial britânico Sidney Webb propôs uma semana de trabalho de 30 horas para reduzir o desemprego. Tempos depois, o governo da Islândia implementou uma semana de trabalho de quatro dias de 35 horas como uma forma de economizar energia. A iniciativa vem sendo estimulada pelo estilo de vida contemporâneo, em que há uma intensidade digital que impede a separação da vida ‘profissional’ e ‘pessoal’ dos colaboradores.

No Reino Unido, por exemplo, cerca de 60 empresas testaram uma semana de trabalho de quatro dias em 2022 e os resultados foram positivos, os funcionários relatam aumento na produtividade, satisfação no trabalho e bem-estar mental. Um estudo da Universidade de Oxford descobriu que uma semana de trabalho reduzida poderia reduzir as emissões de carbono em até 22%.

Para Fernanda Mourão, especialista em novos modelos de trabalho e CEO Spacein, empresa de tecnologia para gestão de espaços, é importante enfatizar o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. “Com a constante conectividade, tornou-se comum levar tarefas do trabalho para casa, e isso ocupa o tempo de descanso. A introdução da semana de trabalho de quatro dias tem sido uma maneira das empresas combaterem o estresse e o burnout, permitindo que os colaboradores tenham um dia adicional para se dedicar a questões pessoais e assim, aproveitarem verdadeiramente o fim de semana para descanso”, detalha a executiva.

Tendência mundial

A empresária acrescenta que a semana de quatro dias passou a ser vista como uma tendência relevante para o mundo empresarial e, fora do Brasil, já começa a ganhar escala, uma vez que as empresas têm percebido que essa é uma forma de melhorar a produtividade, a satisfação dos funcionários e também a sustentabilidade do planeta. “Sem dúvidas é um modelo que irá agregar aos formatos de trabalho que já existem: presencial, remoto, híbrido e flexível, o desafio das empresas será de organizar o modelo operacional e o trabalho de cultura corporativa”, salienta Fernanda.

Experiência piloto atrai 21 organizações no Brasil

No Brasil, desde o início deste mês, 21 organizações aderiram ao experimento da “4 Day Week Global”, uma comunidade sem fins lucrativos que realiza projetos-piloto como esse em diversos países do mundo, e pela parceira do projeto no Brasil, a Reconnect Happiness at Work. Entre elas, há empresas de consultoria, um hospital, produtoras de vídeo e conteúdo, editoras, um escritório de advocacia e um de arquitetura. Ao todo, 400 funcionários serão impactados pelo teste, de cidades como Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Campinas e Porto Alegre.

A universidade americana Boston College elaborou a metodologia da iniciativa e cuidou das pesquisas antes do início do experimento, assim como de análises após três meses da implementação e ao fim do piloto. Segundo pesquisa da WeWork feita em parceria com a Page Outsourcing, cerca de 73% dos brasileiros acreditam que ao trabalhar um dia a menos na semana é possível melhorar a produtividade e sua lealdade à companhia, especialmente pela redução do estresse.

Menos estresse

Com base nos textos já realizados ao redor do mundo, a “4 Day Week Global” mostra que as empresas participantes tiveram 68% de redução no esgotamento (físico e mental) dos colaboradores, um aumento de 36% em suas receitas, 42% de redução nas demissões, 54% no aumento na capacidade para o trabalho e 63% de facilidade para atrair talentos. Deives Rezende Filho, especialista em ética, diversidade, equidade e inclusão, e CEO da Condurú Consultoria, destaca que esse é o momento ideal para reimaginar o trabalho.

“É necessário que as empresas mudem o olhar e adotem alternativas que atendam aos dois lados, tanto da organização quanto do colaborador. É importante que essa adaptação aconteça, pois somente desta forma é possível lidar com as novas expectativas dos trabalhadores. As empresas precisam parar de definir tudo por conta própria, sem ouvir seus colaboradores, pois regimes autoritários e inflexíveis não fazem parte do século 21 pós-pandemia”, diz.

Rendimento de funcionários é principal expectativa

Jayanne Rodrigues* (Agência Estadão)

Para as empresas que aderiam à inicitiva a expectativa é que não haja redução da produtividade. O período de testes deve durar nove meses com divisão em três meses de planejamento e outros seis dedicados à execução. Durante esse período, as empresas vão ter acesso a cursos, treinamentos, palestras sobre produtividade, diagnóstico organizacional das equipes e também acompanhamento individualizado.

ilustração-produtividade---web.jpg
Para 54% dos participantes de iniciativas similares em outros países, ficou mais fácil conciliar vida pessoal e profissional - Imagem: Freepik

Apesar de inédita no Brasil, a mudança já foi testada em países como África do Sul, Nova Zelândia, Portugal e Reino Unido. Neste último, com mesma carga horária de trabalho do Brasil, de até 44 horas por semana, os resultados do projeto-piloto se mostraram promissores.

Segundo os organizadores, 39% dos participantes se sentiram menos estressados, e 54% consideraram mais fácil conciliar vida pessoal e profissional. Cerca de 15% dos empregados disseram ainda que não voltariam a uma semana de cinco dias, mesmo se houvesse aumento salarial. “Esse é um projeto de negócios. A grande questão aqui é trabalhar melhor e de forma mais inteligente. Temos um desafio no Brasil porque estamos falando de um país em desenvolvimento”, afirma Gabriela Brasil, head de comunidade da “4 Day Week Global”.

Participantes

Das 21 organizações que aderiram ao projeto - a maioria de pequeno e médio portes -, apenas sete autorizaram divulgar seus nomes. Entre essas empresas, está a Haze Shift. A consultoria de inovação, que adota o modelo 100% remoto, vai testar a redução de 20% da jornada para todos os funcionários, um total de 20. “Não temos medo de mudar. Em termos de propósito, queremos nos conectar com quem está chegando ao mercado ou com quem está há muito tempo e está buscando essa carreira mais direcionada para a felicidade”, argumenta Maria Raicoski, head de operações da empresa.

Já o Hospital Indianópolis, em São Paulo, vai começar a testar a semana de quatro dias pelo departamento administrativo, com 20 funcionários, para depois avaliar se expande a experiência a outras áreas do hospital. Desde 2022, o hospital tem passado por um processo de modernização, incluindo a inserção de novas formas de trabalho.

A proposta inicial é eliminar a sexta-feira. Porém, é possível que aconteçam mudanças ao longo do experimento, segundo Eduardo Hagiwara, diretor-geral do Indianópolis. “Temos desafios para conseguir migrar para o departamento assistencial, que tem contato com o paciente e que trabalha com o corpo clínico. Então, vai demandar bastante estudo, discutindo para propor algo depois ao hospital inteiro”, diz Hagiwara.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 17 de setembro de 2023.